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Linguagem documentária
Marilda Lopes Ginez de Lara
Disciplina: Linguística Documentária
2011
Aula 2
Texto base: TÁLAMO, M.F.G.M. Linguagem
documentária. São Paulo: APB, 1997.
Linguagem
LINGUAGEM permite “traduzir em significados
os elementos da vida” (Tálamo).
Tradução lgg, instância de mediação entre o
homem e o mundo; prática social que se
expressa por signos (vários tipos de lgg)
Sistema de signos permite ao homem
desenvolver sua capacidade de se comunicar
com os seus semelhantes
Linguagem
“A linguagem reproduz a realidade (...) a
realidade é produzida novamente por
intermédio da linguagem. Aquele que fala faz
renascer pelo seu discurso o acontecimento e a
sua experiência do acontecimento reproduzido.
(...) a situação inerente ao exercício da lgg, que
é a da troca e do diálogo, confere ao discurso
dupla função: para o locutor, representa a
realidade; para o ouvinte, recria a realidade. Isso
faz da linguagem o próprio instrumento da
comunicação intersubjetiva” (Benveniste, 1966).
Linguagem
As diferentes linguagens expressam as distintas
culturas da sociedade.
Linguagem = capacidade abstrata: lgg da arte,
lgg humana, lgg animal; lgg verbal, lgg visual
etc.
Tese de Whorf: cada língua “recorta a
realidade” de um modo particular.
As diferentes lggs têm funções modelizantes,
modelizam o mundo.
Exemplos
português
Inglês
roxo
Anilado
purple
azul
blue
verde
green
amarelo
yellow
Alaranjado
orange
vermelho
red
Bassa (língua
indígena da
Libéria, África
hui
ziza
Exemplos
inglês
português
Sheep vivo]
Animal vivo
(classe de
animais vivos)
carneiro
Mutton
Carne desse
carneiro ou
animal (classe de carne de
alimentos)
carneiro
Linguagem
As diferentes línguas não variações de
expressões que remeteriam a significados
universalmente válidos e estáveis (Peterfalvi,
1970, citado por LOPES, 1984)
Porém:
“a linguagem não é o mundo; ela é, apenas, um
saber sobre o mundo, capaz de fazer-se
intersubjetivo e de relacionar consciências”
(LOPES, 1984, p.248).
Escrita
Potencialização da capacidade da linguagem
Com ela, acrescenta-se a disponibilidade e a
permanência
Surgimento da escrita não é fato natural, mas
resposta à complexidade da vida social:
- necessidade de acesso à informação passada,
informação de outros lugares etc.
Escrita
Advento da escrita tem como consequências:
Uma distribuição da sociedade entre membros que
têm ou não acesso à informação de forma indireta
A necessidade de organizar o conhecimento
registrado para transferí-lo ou não, decidindo-se,
assim, sobre a função do conhecimento.
Ler e escrever conferem poder.
Conceito de cidadão, séc.XVIII (França, Alemanha)
conferido àqueles que podiam informar-se “lendo”. O
social era compreendido a partir das regras
comunicativas da escrita (Canclini,1999)
PODER associado à característica de
PERMANÊNCIA (própria da escrita)
introdução da idéia de PRESERVAÇÃO
PRESERVAÇÃO neutralizou, de certo modo, a
DISPONIBILIDADE (também característica da
escrita)
Prioridade da PRESERVAÇÃO MONOPÓLIO DO
conhecimento negação da ideia de
circulação da mensagem (que vem a reboque
da disponibilidade)
Mas se mantém em germe a ideia de circulação
da informação.
Biblioteca de Alexandria, de Serápio
preservação e, embrionariamente, circulação
Institucionalização do tratamento e
disseminação da informação
Bibliotecários – funções de gramáticos
(catalogação, correção e comentários aos
textos) facilitavam o acesso ao conteúdo
(operações de intermediação)
Meios para o tratamento da informação
Tratar, preservar, transmitir são operações no
universo da linguagem
A linguagem é ferramenta de trabalho
Linguagem documentária
TESAURO INFORMAÇÃO ATRELADA AOS
SISTEMAS DE SIGNIFICAÇÃO
NECESSÁRIO OPERAR NO UNIVERSO DA
LINGUAGEM PARA
IDENTIFICAR
ANALISAR
TRATAR
DISSEMINAR
Tratamento da informação antes
dos Tesauros
Sistemas de classificação
classes de assunto
padronização
não se coloca o problema da
comunicação, ou de interação sistemas
informacionais / públicos
Problemas de comunicação
- Introduzidos quando se vê a importância da
noção de linguagem, que é diferente do uso
de denominações de classes prédeterminadas
- Ex.: lista = sucessão de palavras sem arranjo,
sem organização
- Termos vocabulário, linguagem documentária,
tesauro = sistema que é simultaneamente
modo de organização e forma de
comunicação
- Processos documentários: tensão entre
padronização e comunicação
Aspecto estrutural da linguagem
Aspecto estrutural da lgg = dificuldades de
operacionalização na Documentação.
Documentação – objetivos empíricos, pouca
reflexão teórica sobre seus procedimentos,
objeto e finalidades. Apropriação superficial das
contribuições de outras áreas
dificuldades para criação de um quadro
teórico consistente é responsável pela ideia de
que a linguagem documentária é uma lista de
palavras usadas numa determinada área do
conhecimento
Linguística
- Contribuição da Linguística estruturalista
- Questionamento da tese da degradação das
línguas pelo uso
- Língua é fundamentalmente um instrumento de
comunicação
- caráter relacional da linguagem, sua natureza
arbitrária e sua autonomia.
- Arbitrário linguístico - opõe-se à ideia de
motivação, ou seja, de que as palavras
correspondem diretamente às coisas. A
linguagem não se fundamenta na realidade
extralinguística, mas em sua organização
interna (sistema ou estrutura)
Conceitos metodológicos
- Linguagem documentária tem de trabalhar
com a noção de arranjo, rede de relações
entre suas unidades
-
Conceitos metodológicos:
Signo
Sintagma/paradigma
Forma de expressão/forma de conteúdo
Sincronia/diacronia
Signo
Presença (parte significante) e ausência
(significado)
Significante/significado = significação
Signo = sempre institucional (convenção; existe
para um grupo definido de utilizadores);
arbitrário, imotivado.
Signo é diferente de sinal: fumaça/signo de
fogo; fumaça/consequência do fogo
Signo
Significante – expressão, sequência gráfica:
parte perceptível
Significado – conteúdo, parte
Sgte/sgdo unidades solidárias; uma não existe
sem a outra
Dada a solidariedade entre sgte/sgd, a
significação deve ser observada a partir do
sistema no qual é gerada. Não existe de forma
independente, sendo sempre capturada por
alguma forma.
Signo
Função referencial (denotação) – entre signo e
o referente – menos frequente no exercício da
linguagem. Difícil estabelecer o referente da
maioria dos signos. Significação não é o
referente.
Significação não se confunde com a
representação (imagem mental). Por força da
significação instituída por um sistema de signos,
uma espécie de ANALOGIA é estabelecida
entre o signo e aquilo a que se refere
Afirmar que a linguagem representa algo é
afirmar que, por força da significação
(POSTULADOS DO SIGNIFICADO, Eco) – se
propõe no lugar de, o substitui.
Signo
A linguagem documentária representa a
informação como uma consequência das
relações instituídas entre suas unidades.
Não como decorrência da mera presença das
unidades
Lista de palavras – nada significa
Para interpretá-la – necessário o arranjo, que
corresponde a um sistema de significação
determinado entre outros possíveis.
Sintagma e paradigma
O signo pertence a um sistema e não pode ser
observado isoladamente.
mantém relações paradigmáticas com outros
signos (relações de diferença, semelhança,
inclusão, exclusão, pressuposição etc.)
na frase (cadeia), pode combinar com alguns
signos e não com outros (relação sintagmática)
discurso
Paradigma
Paradigma = conjunto de signos que mantêm
entre si relações virtuais de substitualidade (a
presença de um signo exclui a realização
concomitante de outros que mantêm com ele
relações paradigmática).
relações associativas que se dão em razão de
classes de signos de diversas naturezas
Educação /educar (sob o ponto de vista do
radical)
Educação/formação (sufixo)
Educação/instrução/ensino/aprendizagem
(semântico)
Paradigma
Num enunciado, cada signo tem parte da
significação determinada pela classe da qual
participa (parte se dá através da
sintagmatização)
PARADIGMA de um signo – estabelece relações
in absentia entre unidades (classe delimita a
significação dos seus elementos, mas não está
presente)
No plano lógico – PARADIGMA próximo da
noção de CATEGORIA (que não se reduz a um
conjunto de elementos, mas supõe uma
organização interna que decorre das relações
estruturais entre os elementos em função de
propriedades selecionadas).
Paradigma
Um mesmo conjunto de signos pode participar de
diferentes categorias:
Propriedade animal – gato e galo mantêm relação
+ penas – a relação desaparece
Veleiro, canoa, jangada, iate ... Formam o
mesmo paradigma semântico, pois pertencem à
mesma classe: a classe de embarcação
Paradigma
Classe quanto ao sexo: menino, João, garoto,
moleque
Classe de objetos esportivos: bola, peteca, dardo
Classe de verbos: atirou, jogou, arremessou
Classe de artigos: o, a, um, uma
O menino jogou a bola
Eixo das escolhas (eixo vertical)
Paradigma
Sintagma
combinação na cadeia linear. Combinação dos
signos EFETIVAMENTE dados.
Descrição de um sintagma = determinação de
suas unidades, ordem em que aparecem.
Relação de COEXISTÊNCIA, in praesentia.
O menino jogou a bola
Eixo das combinações (eixo horizontal)
Forma de expressão/forma de
conteúdo
Conceitos de signo, sintagma, paradigma
língua é FORMA (no plano significante ou do
significado).
Hjelmslev: a língua não é substância, mas forma;
toda língua é ao mesmo tempo expressão e
conteúdo.
Forma de expressão/forma de
conteúdo
Ex.: diferença entre duas línguas na tradução.
Diferença (semântica) não reside na
significação que propõem: pode-se traduzir.
Diferença = forma em que a significação se
apresenta em cada uma das línguas.
Ex.: fleuve (fr) = rio que deságua no mar (várias
palavras no português)
cada língua introduz uma decupagem
própria na substância fônica (perceptível
imediatamente) e na substância semântica
(forma da língua).
Forma de expressão/forma de
conteúdo
Todas as línguas têm estruturas próprias. Fator
comum (sentido) é analisado diferentemente
por cada língua. O sentido é ordenado,
articulado, formado de forma diferente segundo
as diferentes línguas.
Cada língua estabelece fronteiras na massa
amorfa do pensamento ao enfatizar valores
diferentes numa ordem diferente, colocando o
centro de gravidade diferentemente ...
Ex.: saudade (pt); missing (inglês)
Forma de expressão/forma de
conteúdo
A Relação que a forma do conteúdo mantém
com o sentido (substância do conteúdo) é
arbitrária, do mesmo modo que o é aquela que
a forma de expressão mantém com a
substância fônica.
Analisar a língua não é assinalar o que ela
significa, mas verificar COMO ela significa.
Sincronia/diacronia
Sincronia - sistema da língua, analisado num
determinado momento do tempo
Diacronia: sistema da língua analisado em sua
evolução no tempo
A dicotomia permite separar os fatos internos de
um sistema dos fatos históricos.
Ponto de vista sincrônico permite reafirmar que
NENHUM ELEMENTO DA LÍNGUA PODE SER
ANALISADO COMO FATO ISOLADO.
Sincronia – relação entre elementos
coexistentes.
Sincronia/diacronia
Exemplo
JOGO DE XADREZ
Fatores internos = Interno é tudo quanto diz
respeito ao sistema, suas regras, por exemplo. A
troca do material das peças não altera o
sistema. Já a diminuição das peças afeta a
gramática do jogo
Fatores externos = o fato de que o jogo de
xadrez tenha sido difundido da Pérsia para a
Europa
Sincronia/diacronia
Ponto de vista sincrônico + reconhecimento do
princípio de estrutura permite ver a
importância da oposição (DIFERENÇA) e da
identidade (semelhança).
Sincronicamente (no ato da percepção) a
apreensão das significações é feita através da
afirmação das DESCONTINUIDADES.
Através da língua, a realidade se apresenta não
sob forma contínua. Se o mundo fosse um
continuum homogêneo, os objetos não teriam
sentido: a significação manifesta-se através da
percepção das descontinuidades, ou desvios
diferenciais (Lévi-Strauss).
Conjunção/disjunção
Método comparativo permite identificar as
diferenças, sob a ótica da identidade e da
oposição.
Analisar a língua é analisar formas (de expressão,
de conteúdo). É apreender as diferenças:
apreender pelo menos dois objetos (termos,
palavras, etc.)como simultaneamente dados
(um elemento isolado não responde pela
estrutura) sob o aspecto de seus parciais iguais
(conjunção) e seus parciais diferentes
(disjunção).
Conjunção/disjunção
Embarcação (elemento conjuntivo)
Veleiro
disjunção
Canoa
disjunção
Jangada
disjunção
Iate
disjunção
...
Analisar a língua = analisar formas (de expressão
ou conteúdo);
Determinar através do método comparativo as
diferenças, sob a ótica da identidade e da
oposição.
Analisar a língua é analisar formas (de expressão,
de conteúdo). É apreender as diferenças:
apreender pelo menos dois objetos (termos,
palavras, etc.)como simultaneamente dados
(um elemento isolado não responde pela
estrutura) sob o aspecto de seus parciais iguais
(conjunção) e seus parciais diferentes
(disjunção).
Relação = vínculo entre dois termos que se
requerem mutuamente
ESTRUTURA = presença de dois termos vinculados
por uma relação.
Referências
CANCLINI, N.G. Consumidores e cidadãos:
conflitos multiculturais da globalização. 4. ed. Rio
de Janeiro: UFRJ, 1999.
LOPES, E. Fundamentos da linguística
contemporânea. São Paulo: Cultrix, 1987.
TÁLAMO, M.F.G.M. Linguagem documentária.
São Paulo : APB, 1997 (Ensaios APB, 45)