3.1648-1789: A Paz de Vestfália e o conceito de soberania

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3.1648-1789: A Paz de Vestfália
e o conceito de soberania
Gilberto Maringoni
UFABC 2014
O sistema mundial
José Luís Fiori
• O atual "sistema político mundial", que
nasceu na Europa no século XVI e se
universalizou nos últimos 500 anos, não
foi uma obra espontânea nem diplomática.
Foi uma criação do poder, do poder
conquistador de alguns Estados territoriais
europeus que definiram suas fronteiras
nacionais no mesmo momento em que se
expandiram para fora da Europa e se
transformaram em impérios globais.
• Da mesma forma, o "sistema econômico
mundial", que também se constituiu nesse
mesmo período a partir da Europa, não foi
uma obra exclusiva dos "mercados" ou do
"capital em geral". Foi um subproduto da
expansão competitiva e conquistadora de
algumas economias nacionais europeias
que se internacionalizaram junto com seus
respectivos "Estados-economias", que se
transformaram, imediatamente, em
impérios coloniais.
• Duas características distinguem a originalidade
e explicam a força vitoriosa desses poderes
europeus:
• Primeiro, a maneira como os Estados
territoriais criaram e se articularam com suas
economias nacionais, produzindo uma "máquina
de acumulação" de poder e riqueza
absolutamente nova e explosiva - os "Estadoseconomias nacionais";
• Segundo, a maneira como esses "Estadoseconomias nacionais" nasceram, em conjunto e
numa situação de permanente competição e
guerra entre si e com os poderes imperiais de
fora da Europa.
• De acordo com o sociólogo alemão
Norbert Elias, desde o início desse
sistema, nessa competição
permanente, "quem não sobe, cai".
Por isso, as guerras se
transformaram na atividade principal
dos primeiros poderes territoriais
europeus e depois seguiram sendo a
atividade básica dos Estados
nacionais.
• E, com isso, as guerras acabaram cumprindo na
Europa, um papel contraditório, atuando
simultaneamente como uma força destrutiva e
integradora, promovendo uma espécie de
"integração destrutiva" de territórios e regiões
que tinham se mantido distantes e separados
até os séculos XVI e XVII, e que só passaram a
fazer parte de uma mesma unidade, ou de um
mesmo sistema político, depois da Guerra dos
30 anos, da Paz de Vestfália (em 1648) e das
Guerras do Norte, no início do século XVIII.
• Dentro desse novo sistema
político, todos os Estados
estavam obrigados a se expandir
para poder sobreviver.
• Por isso se pode falar de uma
"compulsão expansiva" de todo o
sistema e de cada um de seus
Estados territoriais e da sua
necessidade de conquista
permanente de novas posições
monopólicas de poder e de
acumulação de riqueza.
• É nesse sentido que se pode dizer que,
desde a formação mais incipiente do novo
sistema, suas unidades competidoras
tinham que se propor, em última instância,
à conquista de um poder cada vez mais
global sobre territórios e populações cada
vez mais amplos e unificados até o limite
teórico da monopolização absoluta e da
constituição de um império político e
econômico que teria uma abrangência
mundial.
O breve século XX
Giovanni Arrighi
• O moderno sistema de governo emergiu da
desintegração do sistema da Europa medieval,
que consistia numa relação senhor-vassalo,
uma mistura de público e privado, mobilidade
geográfica do poder e legitimação dada por um
corpo comum de leis, religião e costumes.
• O sistema moderno torna as esferas públicas e
privadas distintas; a jurisdição é claramente
demarcada por fronteiras nacionais e está
estreitamente associado ao desenvolvimento do
capitalismo como sistema de acumulação
mundial.
• Este vínculo é tanto contraditório
como único: o capitalismo e os
Estados nacionais surgiram juntos e
são interdependentes, mas há
condições que fazem os capitalistas
se oporem à ampliação do poder do
Estado; enquanto o foco estatal é a
aquisição de territórios e o controle
de populações, o foco do capitalista é
o acúmulo de capitais.
• O Estado usa o controle
do capital como meio de
adquirir territórios; o
capitalista usa o controle
do território como meio
de acumular capitais.
• O apoio capitalista ao Estado está
condicionado ao seu funcionamento
como facilitador do acúmulo de
capitais.
• Arrighi cita como exemplo China e Europa nos
séculos XIV-XV: enquanto o capitalismo é o
grande motivador do esforço europeu de
adquirir territórios, a China (superior
tecnologicamente e muito rica) não tem
motivação econômica para ir à Europa.
A invenção do Estado moderno ocorre
primeiro nas cidades renascentistas da
Itália setentrional. Veneza tem uma
oligarquia mercantil que controla o poder
estatal, com quatro características
básicas:
• Sistema capitalista de gestão do estado e
da guerra.
• Equilíbrio de poder como garantia de
independência.
• Guerras concebidas como indústria de
produção de proteção, autocusteadas.
• Desenvolvimento de redes de diplomacia
para manutenção do equilíbrio.
• Às cidades italianas sucederam a
Espanha. A nova tecnologia militar e
o fluxo de riquezas vindas da
América produziram um enorme
aumento nos gastos militares; a
escalada militar e a afirmação dos
Estados nacionais criaram enormes
conflitos e tensão social; o uso da
religião nos conflitos de poder
aumentou a violência.
O domínio dos Habsburgos
Paul Kennedy
• Durante um século e meio, depois de
1500, uma combinação de reinos,
ducados e províncias espalhados por
todo o continente, governados por
membros espanhóis e austríacos da
família Habsburgo, ameaçou tornarse a influência política e religiosa
predominante na Europa.
• Uma característica européia
no século XVI é sua
fragmentação política, ao
contrário do que ocorria em
impérios de larga extensão,
como o otomano e o chinês.
Durante séculos, a unidade
de poder foi pequena e
descentralizada.
• Muito provavelmente, a geografia
continental tenha favorecido esta
pluralidade. As conseqüências políticas e
sociais de um crescimento não
centralizado foram da maior significação.
• A evolução econômica não podia ser
sufocada.
• Não havia uma autoridade única a regular
todas as instancias de comercio. Houve
sempre senhores locas a tolerar práticas e
usos comerciais que outros não
aceitariam.
Histórico das guerras
• As lutas que perturbaram a paz na Europa nos
cem anos anteriores a 1500 foram localizadas,
os choques entre os vários Estados italianos e a
rivalidade entre as coroas francesa e inglesa e
as guerras dos cavaleiros teutônicos contra
lituanos e poloneses foram exemplos disso. A
partir do final do século XVI, as disputas se dão
entre cinco ou seis Estados maiores e outros
menores.
• O histórico das guerras podem ser marcados
por três características:
A. Reforma
• O advento da Reforma Protestante,
liderada por Martinho Lutero (1483-1546).
A alegação de que a liberdade da punição
de Deus sobre o pecado poderia ser
comprada, confrontou um vendedor de
indulgências.
• Lutero viu este tráfico de indulgências
como um abuso que poderia confundir as
pessoas, deixando de lado a confissão e o
arrependimento verdadeiros.
• Sua recusa em retirar seus escritos a pedido do
do Papa Leão X em 1520 e do Imperador Carlos
V na Dieta de Worms em 1521 resultou em sua
excomunhão pelo Papa e a condenação como
um fora-da-lei pelo imperador do Sacro Império
Romano.
• Lutero ensinava que a salvação não se
consegue com boas ações, mas é um livre
presente de Deus, recebida apenas pela graça,
através da fé em Jesus como único redentor do
pecador. Sua teologia desafiou a autoridade
papal na Igreja Católica Romana.
B. Habsburgos
• A criação de uma combinação dinástica, a
dos Habsburgos, que formou uma rede
de territórios que se estendiam de
Gibraltar à Hungria e da Sicília a
Amsterdam, superando tudo o que já se
vira na Europa, em tamanho.
• A Casa de Habsburgo se constituiu pelas
ramificações de uma família nobre da
Europa foi uma das mais importantes e
influentes entre os séculos XIII e XX.
• Foi a dinastia soberana de vários Estados
e territórios. Entre os seus principais
domínios estavam o Sacro Império
Romano Germânico (962-1806), onde
imperou de1273 até seu
desmembramento em 1806, como
consequência das Guerras Napoleônicas
(1799-1815); e o Império Austro-Húngaro,
que governou desde a sua fundação em
1867 até sua dissolução em 1918, pelo
Tratado de Saint-Germain-en-Laye, como
consequência da Primeira Guerra Mundial
(1914-1918).
Império Habsburgo, c.1580
• Por ter sido elevada a realeza em
1273, é denominada a "família
imperial" do Sacro Império
Romano Germânico (962-1806);
e por ter sido a soberana da
Áustria desde1278 até 1918,
tendo inclusive sido a única
governante do Império ÁustroHúngaro (1867-1918), é
denominada como a "família
imperial austríaca".
• Reunia nele as heranças das casas de
Áustria, Borgonha, Aragão, Castela e as
imensas terras espanholas no Novo
Mundo.
• A Reforma Protestante e a invasão turca
da Europa Oriental obrigaram os dois
ramos dos Habsburgos a juntar forças
para preservar o catolicismo europeu
durante toda a Contra-Reforma e a guerra
dos Trinta Anos (1618-1648).
• O combate aos turcos marcaria por mais de dois
séculos o destino da dinastia Habsburgo, entre
1453 (queda de Constantinopla, atual Istambul)
e 1718 (Tratado de Passarowitz, fim da guerra
austro-turca).
• As possessões dos Habsburgos não
formaram porém um conjunto unido, apesar
da criação de um governo central comum a
todos os territórios, com um conselho áulico, um
conselho secreto e um conselho de guerra.
Disputas de família trouxeram muitas
instabilidades aos domínios.
C. Império Otomano
• O Império Otomano foi um estado que existiu
entre 1281 e 1923 e que no seu auge
compreendia a Anatólia (Turquia), o Médio
Oriente, parte do norte da África e do sudeste
europeu. Nos séculos XVI e XVII, o império
otomano constava entre as principais potências
políticas européias e em vários países europeus
foi sentido o receio dos avanços nos Balcãs. No
seu clímax, compreendia uma área de
11.955.000 km².
• Em 1453, após a captura da cidade de
Constantinopla (atual Istambul) esta tornou-se
sua capital.
• Não é inexato afirmar, sob as
perspectivas histórica e geográfica,
que os impérios muçulmanos se
constituíam as forças de mais rápida
expansão no mundo do século XVI.
• Os turcos otomanos avançavam para
o ocidente e os persas conheciam um
renascimento de poder, prosperidade
e cultura. Em várias partes os
muçulmanos avançavam em poder
e influência no oriente.
• Militar e culturalmente, o Império
Otomano obteve uma área geográfica
maior que a do Império Romano em
seus melhores dias, abarcando 14
milhões de súditos e envolvendo uma
política de dominação flexível e
tolerante em relação a outras raças.
Constantinopla era maior que
qualquer cidade européia em 1600,
com 500 mil habitantes.
• Como o teórico do nacionalismo Ernest
Renan (1823-92) afirma, o Império
Otomano era, em contraste com outros
estados-nações (como a França,
Alemanha ou Reino Unido) uma
unidade política multiétnica.
• Em "Qu 'est-ce qu' une nation ?", de 1882,
ele afirma que "o turco, o eslavo, o grego, o
arménio, o árabe, o sírio, o curdo, são tão
distintos hoje como sempre foram desde o
primeiro dia da conquista".
• No entanto, ao contrário de outros
imperalismos, o Otomano não foi
economicamente eficiente e acabou por
fechar-se em si mesmo.
• Em fins do século XVI, o império mostrava
os primeiros sinais de excessiva extensão
estratégica, com exército e marinha com
elevados custos, impossíveis de serem
supridos a contento. A excessiva
centralização despótica e uma burocracia
ineficiente e uma excessiva ortodoxia para
com o comércio em seus domínios.
• .
• Tarifas excessivas levaram
estabelecimentos à falência e
despovoaram cidades.
• Com a crise econômica, o saque
por parte do exército, que já
existia, atingiu níveis alarmantes.
Nessa atividade, foram seguidos
dos funcionários civis
Religião e poder
• Era quase impossível separar o poder político
das ordens religiosas nesses anos. Disputas
religiosas – não havia separação entre Igreja e
Estado – fatalmente se traduziam em disputas
territoriais e contendas pelo poder político.
• O principal objetivo das dinastias francesas, em
especial os Bourbons (1555-1889), na Europa
era romper o poder dos Habsburgos em
inúmeros conflitos de maior ou menor
intensidade. No século XVI, apenas a Inglaterra,
França, Escandinávia, Polônia, Moscóvia e as
terras sob controle otomano não faziam parte
dos domínios dos Habsburgos.
• A verdadeira “revolução militar” dos
princípios da Europa moderna, com
aumento maciço da escala, custo e
organização da guerra. Aumentou a
proporção da infantaria em relação às
forças de cavalaria.
• Sendo mais barato recrutar e
equipar soldados a pé, os exércitos
aumentaram expressivamente de
tamanho, com conseqüente aumento
das burocracias e comandos.
• Guerra implicava condições materiais
crescentes para mantê-las. Se
pensarmos que os Habsburgos
envolveram-se em cerca de 140 anos
de guerras entre os séculos XVI e
XVII, fica claro um dos motivos de
sua decadência. O objetivo principal
dos Habsburgos era a tentativa de
impor um sistema hegemônico da
cristandade, o que traria estabilidade
e previsibilidade ao sistema europeu.
• Em 1618, a revolta dos
Estados protestantes da
Boêmia (atuais repúblicas
Tcheca e Eslováquia) contra o
governante católico Fernando
II (Habsburgo) foi o episódio
deflagrador de uma guerra
que se estenderia por três
décadas.
A Guerra dos Trinta Anos
• A Guerra dos Trinta Anos consistiu-se num
grande conflito multidimensional – entre
variadas guerras localizadas ou de maior ou
menor dimensão - travado pelos Habsburgos da
Áustria e da Espanha contra sucessivas
coalizões de Estados inimigos de 1618 até a
Paz de Vestfália, em 1648. A escala, o número
de homens envolvidos e os custos de um
conflito armado no século XVI eram muito
maiores do que no século anterior.
• Os embates ocorreram especialmente na
Alemanha, nos quais rivalidades entre católicos
e protestantes e assuntos constitucionais
germânicos foram gradualmente transformados
em uma luta européia.
• Apesar de as disputas religiosas serem a causa
direta do conflito, ele envolveu um grande
esforço político da Suécia e da França para
procurar diminuir a força da dinastia dos
Habsburgos, que governavam a Áustria. A
guerra causou sérios problemas econômicos e
demográficos na Europa Central.
• A Guerra dos Trinta Anos
envolveu os principais países da
Europa – além de expedições
holandesas que atacaram, em
além mar, Brasil, Angola e Ceilão
(Sri-Lanka) – transformando-se
naquilo que alguns historiadores
chama de primeira guerra global.
• Segundo Paul Kennedy, “o final da
Guerra dos Trinta Anos constitui uma
questão confusa. A Espanha celebrou
subitamente a paz com os holandeses em
1648, reconhecendo finalmente sua
independência total; isso foi feito, porém,
para privar a França de um aliado e a luta
franco-Habsburgo continuou.
• Tornou-se puramente franco-espanhola,
quando a Paz de Vestfália trouxe
finalmente tranquilidade à Alemanha e
permitiu que os Habsburgos da Áustria se
afastassem do conflito.
A Paz de Vestfália
• A Paz de Vestfália (região alemã) designa
uma série de tratados que encerrou a
Guerra dos Trinta Anos e também
reconheceu oficialmente as Províncias
Unidas e a Confederação Suíça.
• O Tratado Hispano-Holandês, que pôs fim
à Guerra dos Oitenta Anos, foi assinado
no dia 30 de janeiro de 1648 (em
Münster), após quatro anos de
negociações.
• Em 24 de outubro do mesmo ano foi
assinado o tratado de paz entre o Sacro
Império Romano-Germânico, os outros
príncipes alemães, a França e a Suécia.
Os tratados concluídos nessas duas
cidades da Westfália foram depois
reunidos no Ato Geral de Vestfália em
Münster em 24 de Outubro de 1648
• O Tratado dos Pirineus, de 1659, o qual
deu fim à guerra entre França e Espanha,
também costuma ser considerado parte
da Paz de Vestfália.
• A essência da solução de Vestfália foi o
reconhecimento do equilíbrio religioso dentro do
Sacro Império Romano (império Habsburgo),
apesar dos sinais evidentes de sua decadência.
Cerca de um quarto da população europeia vivia
sob seus domínios.
• A idéia da constituição de um sistema político
mundial, ou europeu, era fundado da noção de
equilíbrio de poder, direito exercido pelos
Estados e não acima deles. Constituiu-se assim
uma nova ordem anárquica, com uma
reorganização dos espaços politicos destinados
a permitir a liberdade de comércio.
• A Paz de Vestfália inaugurou o moderno
sistema internacional, ao acatar noções e
princípios tais como o de soberania estatal e
o de Estado nação.
• Os resultados do tratado foram muito
abrangentes. Dentre outras conseqüências,
os Países Baixos ficaram independentes da
Espanha, terminando-se com a Guerra dos
Oitenta Anos; a Suécia ficou com a
Pomerânia, Wismar, Bremen e Werden.
• O poder dos Sacro-Imperadores foi
irreparavelmente abalado e os
governantes dos estados germânicos
voltaram a gozar da prerrogativa de
determinar a religião oficial dos seus
territórios.
• O tratado deu reconhecimento legal aos
calvinistas. Três grandes potências
emergiram: a Suécia, as Províncias
Unidas e a França. O poderio da Suécia
foi, contudo, de pouca duração.
Decorrências
• As guerras posteriores a 1540 estavam
intimamente ligadas ao nascimento do Estadonação. Entre fins do século XV e fins do século
XVII, a maioria dos países europeus presenciou
a centralização da autoridade política e militar,
em geral no monarca, acompanhada de maiores
poderes e métodos de tributação pelo Estado e
realizada por uuma máquina burocrática muito
mais complicada do que existia quando os reis
deviam “viver de seus próprios recursos” e os
exércitos nacionais eram mantidos com um
recrutamento feudal.
• A guerra e suas consequências
criavam uma pressão premente e
contínua no sentido da “construção
da nação” do que a lenta evolução
das tendências sociais.
• O poder militar permitiu a muitas
dinastias europeias manter-se acima
dos grandes magnatas e assegurar a
uniformidade a a autoridade política.
• A guerra tornou concreto o
destino da arrecadação fiscal.
Nos últimos anos do reinado de
Isabel, da Inglaterra (1533-1603)
e de Felipe II, da Espanha (15271598), três quartos das despesas
dos governos eram destinados à
guerra ou ao pagamento de
dívidas.
• A monopolização e burocratização do poder
militar do Estado são claramente parte central
da “criação da nação”. O exército deixava de ser
um corpo transitório, composto por mercenários,
e tornava-se permanente e estável. O poder
passava a ser nacional.
• O sistema de estados europeus era na verdade
um sistema de cinco grandes potências: França,
o Império Habsburgo, Prússia, Inglaterra e
Rússia, bem como países menores, como
Savoia e Espanha.
O poder agora era “nacional”.
• O aspecto mais significativo no cenário europeu
após 1660 foi o amadurecimento de um sistema
realmente multipolar de Estados, cada qual com
a tendência cada vez mais acentuada de tomar
decisões sobre a guerra e a paz a partir dos
‘interesses nacionais’ e não por motivos
transnacionais ou religiosos.
• Países que tinham sido inimigos numa guerra
muitas vezes se aliavam na guerra seguinte, o
que dava ênfase a uma Realpolitik calculada, e
não a convicções religiosas profundas na
determinação de seus interesses.
• A paz representava o coroamento de um
processo marcado pelo início da hegemonia e
francesa na Europa e pelo declínio do poder dos
Habsburgos.
• A Alemanha foi a única que saiu derrotada
desses trinta anos de guerra. Os principais
campos de batalhas dos intermitentes conflitos
foram as cidades e principados da Alemanha,
que sofreram danos muito graves.
• Conseqüências de longo prazo da
guerra foram, além da emergência da
França como o poder terrestre
dominante na Europa, a formação
das Repúblicas da Holanda e Suíça e
a contínua fragmentação da
Alemanha, pois torna 39 Estados
alemães quase que independentes
do Imperador, atrasando a sua
unificação em um único Estado.
Arrighi
• As Províncias Unidas sobressaíram-se neste cenário,
por serem os primeiros a liquidar o sistema de governo
medieval. A Holanda surge como potência hegemônica
após a Guerra dos Trinta Anos.
•
Os acordos para proteger o comércio em tempo de
guerra celebrados na Paz da Vestfália criaram as
condições para a expansão do capitalismo; Haia
permanece até hoje como o centro da diplomacia
européia.
• Províncias Unidas ou República dos Sete Países
Baixos Unidos foi um Estado formado pelas províncias
do norte dos países baixos – entre eles a Holanda –
agrupados desde o Tratado de Utrecht, em 1579, até a
ocupação francesa, em 1795.
• De 1652 a 1815 há a luta entre França e
Inglaterra pela supremacia. Na primeira
fase ambas tentaram anexar a Holanda
para controlar suas redes comerciais; na
segunda fase dos conflitos o alvo são as
próprias redes comerciais holandesas; a
geografia política do comércio mundial é
reestruturada radicalmente: saem de cena
portugueses, espanhóis e holandeses;
ascendem franceses e ingleses no século
XVIII.
Consequências da Paz
• Reconheceu-se a completa independência da Suíça
(curiosamente, a própria Suíça não é signatária da Paz
de Vestfália).
• Reconheceu-se a independência da República das Sete
Províncias Unidas dos Países Baixos (previamente a
sua revolta, um século antes, havia sido possessão da
Casa de Habsburgo e, portanto, da Espanha).
• Os diversos estados alemães independentes receberam
o direito de conduzir a sua própria política externa, mas
lhes era vedado cometer atos de guerra contra o Sacro
Imperador. O Império, como um todo, se reservava o
direito de fazer a guerra e de celebrar tratados.
• A França saiu da guerra em uma posição muito melhor
do que as outras potências, sendo capaz de ditar boa
parte do tratado.
O conceito de soberania
• Foi a Paz de Vestfália,assinada em 1648,que
consagrou o princípio da “soberania nacional” e
gerou o “sistema político-estatal europeu”. Mas
ao consagrar o princípio da soberania criou um
sistema de poder anárquico, no qual o exercício
do “equilíbrio de poder” e a guerra se tornaram
as duas formas conhecidas e possíveis de
resolução dos conflitos entre os Estados
soberanos. Configurou-se, assim, uma forma
primitiva de governança supranacional.
• Em síntese, as primeiras “economias nacionais”
nasceram como uma estratégia de guerra
defensiva dos primeiros Estados territoriais
europeus e depois se transformaram numa
imposição do sistema político interestatal,cuja
regra número um era a continuidade e a
intensificação permanente da competição
político-militar entre seus Estados-membros.
• Como resultado,desde o início o sistema político
europeu esteve sob o controle compartido ou
competitivo de uns poucos Estados que
impuseram aos demais sua liderança políticomilitar e econômica. Foram as grandes
potências, que nunca passaram de seis ou sete,
que desde o início se transformaram no núcleo
dominante de todo o sistema.
Alessandra Rodrigues,
David Carvalho e Luciano Diniz
• A Paz de Vestfália é frequentemente apontada
como o marco da diplomacia moderna, pois deu
início ao sistema moderno do Estado nação - a
primeira vez em que se reconheceu a soberania
de cada um dos Estados envolvidos.
• As guerras posteriores ao acordo não mais
tiveram como causa principal a religião, mas
giravam em torno de questões de Estado.
Também fortaleceu as divisões internas da
Alemanha, impedindo-a de formar um Estadonação unido, o que perdurou até o final do
século XIX.
• Nessa conjuntura é que surge o Estado nacional
com uma característica antes desconhecida: a
soberania. Este Estado tem sua forma unitária
com poder unificado de onde originava toda sua
vontade. Seu fortalecimento era importante para
assegurar a supremacia e toda uma idéia de
soberania sistematicamente construída com
base num Estado moderno centralizado e
burocrático.
• A soberania era, portanto, una, indivisível,
imprescritível, inalienável. E sua supremacia
assegurava oposição aos poderes da Igreja,
subordinando-os, e ao poder feudal, eliminando
mediadores políticos entre os indivíduos e o
Estado. Daí, respectivamente, os primórdios da
dupla face da soberania, a externa e a interna.
• Na Idade Média, o poder era
fragmentado e não havia a idéia de um
Estado nacional com um exército,
moeda, poder unitário e sequer
soberano.
• O que se poderia chamar à época de
soberania aparece com uma diferente
conotação: expressava-se na noção de
propriedade de território.
• Poder-se-ia dizer que a construção do
conceito no Ocidente se deu devido a
fatos históricos como os conflitos
existentes entre os poderes da Igreja, do
sistema feudal, e dos reis representantes
do Estado, nas lutas que se travavam
para conquistar territórios visando
imposição de uma autoridade sob os
barões feudais (assegurando certa noção
de soberania interna) e ao Santo Império
Romano (assegurando certa noção de
soberania externa).
• Neste período surgiram vários
centros de poderes independentes,
cada um exercia o que se poderia
designar ‘soberania medieval’.
• Significava tão-somente determinada
qualidade investida num Senhor que
exercia no seu território um poder, ou
seja, manifestava superioridade no
poder de governo e na produção de
leis naquele local.
• Esse processo histórico foi
a base para a construção
conceitual do termo soberania
que aos poucos viu-se
transferir da vinculação da
posse de terra à pessoa do rei
e para o propriamente dito
poder real.
• Após a consolidação dos Estados nacionais e o
estabelecimento da divisão de poderes
internamente, os soberanos passaram a
reconhecerem-se mutuamente como iguais.
• Nesse contexto produziu-se a Paz de Vestfália
em 1648. Esse acordo configurou o Princípio da
Soberania como poder supremo, legítimo,
confirmado pelo reconhecimento de outros
Estados. Foi assim que tanto no direito
constitucional como no direito internacional
evidenciou-se principalmente nas relações
internacionais entre Estados.
• A lógica do sistema de Wetfália - onde cada
Estado é a única autoridade legítima sobre o
seu território - manteve o cenário
internacional equilibrado até o início do
século XX.
• Não obstante conciliar a intensificação das
relações internacionais com tal autonomia
política de cada ator, o ambiente
internacional era um sistema de ordem
descentralizada com base na reciprocidade,
sob a égide dos princípios internacionais
estabelecidos para a regulação do
relacionamento entre os Estados.
O contrato social
Jean Jacques Rousseau (1762)
Em que consiste a soberania, e o que a torna inalienável
Existe assim no Estado uma força comum que o
sustenta e uma vontade geral que o orienta; e a
soberania está constituída pela aplicação de
uma à outra. De onde se vê que pela sua
natureza o soberano é uma pessoa moral; que
só tem existência abstrata e coletiva, e a idéia
que se associa a esse termo não pode ser
vinculada a um indivíduo. Como esta é uma das
proposições mais importantes do direito político,
procuremos esclarecê-la melhor.
• Acredito poder afirmar como princípio incontestável
que só a vontade geral pode orientar as forças do
estado de conformidade com o seu objetivo, que é o
bem comum. Se a oposição dos interesses
particulares tornou necessária a criação das
sociedades civis, isso só foi possível devido ao
acordo desses mesmos interesses.
• O vínculo social está representado pelo que há de
comum entre eles, e a sociedade não poderia existir
se não houvesse um ponto de concordância entre
todos esses interesses. Ora, como a vontade tende
sempre ao bem do ser que a exerce, a vontade
particular tem sempre como objeto o bem privado, e
a vontade geral o interesse comum, segue-se que
esta última é ou deve ser a única motivação
verdadeira do organismo social.
• Mais ainda: mesmo no caso de haver em
determinado momento uma concordância entre
duas vontades, não se poderia jamais garantir
que ela seria duradoura, e que nunca surgiria
uma oposição entre essas vontades.
• A ordem das coisas humanas está sujeita a
tantas mudanças, e os modos de pensar e de
ser mudam tão facilmente que seria temerário
afirmar que amanhã se continuará desejando o
que hoje se quer; e se a vontade geral está
menos sujeita a essa inconstância, nada pode
debelar a vontade particular.
• Assim, mesmo se o organismo social pudesse
dizer: desejo agora tudo o que deseja essa
pessoa, nunca poderia dizer, a respeito da
mesma pessoa, o que ela vai desejar amanhã, e
se esse desejo seria também o seu.
• Ora, a vontade geral que deve orientar o Estado
não é a de um tempo passado, mas a do
momento presente, e a verdadeira característica
da soberania é a necessidade de que haja
sempre concordância de tempo, lugar e efeito
entre a direção da vontade geral e o emprego
da força pública.
• Acordo com o qual não se pode continuar
contando quando uma outra vontade dispõe
dessa força.
• É bem verdade que em um Estado bem
ordenado é sempre possível inferir a duração de
um ato da vontade do povo se ele não é
prejudicado por uma ação contrária; mas é
sempre em virtude de um consentimento
presente e tácito que o ato anterior mantém a
sua eficácia. Veremos em seguida quais são as
condições para que se presuma haver esse
consentimento.