Transcript VIGOTSKI

Psicologia da Escrita: um estudo
a partir de Vigotski e Luria
Edimar Sartoro
E-mail: [email protected]
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Vigotski, em suas pesquisas, também se preocupou
com o desenvolvimento da escrita na criança. Para
ele a escrita tem que ser ensinada e é na escola
que esse ensino deve ocorrer:
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“[...] Porque na escola a criança não aprende o que sabe
fazer sozinha mas o que ainda não sabe e lhe vem a ser
acessível em colaboração com o professor e sob sua
orientação [...]” (VIGOTSKI, 2009, p. 331, grifo nosso).
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Para Vigotski e Luria a escrita tem um pré-história.

Luria afirma que: O momento em que uma criança começa
a escrever seus primeiros exercícios escolares não é, na
realidade, o primeiro estágio do desenvolvimento da
escrita. [...] podemos até mesmo dizer que quando uma
criança entra na escola, ela já adquiriu um patrimônio de
habilidades e destrezas que a habilitará a aprender a
escrever [...]. (2006, p. 143).
Premissas da linguagem escrita
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A escrita é constituída por um sistema simbólico
culturalmente elaborado que exige da criança o
desenvolvimento das funções psicológicas superiores,
especificamente a abstração;
“Trata-se
de uma linguagem sem seu aspecto
musical, expressivo, em suma, sonoro. É uma
linguagem de pensamento, de representação, mas
uma linguagem desprovida do traço substancial da
fala – o som material”. (idem, p. 313).
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“[...] através de uma linguagem de sons – a fala –,
a criança já atingiu um estágio bastante elevado de
abstração em relação ao mundo material”;
A criança, para a aprendizagem da escrita, “[...]
deve abstrair o aspecto sensorial da sua própria
fala e passar a uma linguagem abstrata, que não
usa palavras mas representações de palavras”
(Vigotski, 2009, p. 312).
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É exatamente o lado abstrato da escrita – o fato
de que esta linguagem é apenas pensada e não
pronunciada que constitui uma das maiores
dificuldades com que se defronta a criança no
processo de apreensão da escrita;
“Quem continua a achar que a maior dificuldade são
o atraso dos pequenos músculos e outros
momentos relacionados com a técnica da escrita,
enxerga as raízes da dificuldade não lá onde elas
efetivamente existem [...]”. (2009, p.313).
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A linguagem escrita é mais abstrata que a falada.
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“É uma linguagem sem interlocutor, produzida em um
situação totalmente inusual para a conversa infantil. A
situação da escrita é uma situação em que o destinatário
da linguagem ou está totalmente ausente ou não está em
contato com aquele que escreve”. (2009, p. 313);
A linguagem escrita requer da criança uma dupla
abstração: do aspecto sonoro da linguagem e do
interlocutor.
Os motivos da escrita
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“A nossa investigação nos levou ainda a concluir
que até o início da aprendizagem escolar as
necessidades/motivos de escrita é totalmente
imatura no aluno escolar.” (2009, p. 314).
“O aluno, ao se iniciar na escrita, além de não sentir
necessidade dessa nova função de linguagem,
ainda tem uma noção extremamente vaga da
utilidade que essa função pode ter para ele”. (2009,
p. 315).
Vigotski, assim, acredita que: “a motivação
antecede a atividade” (idem, p. 315)
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“A situação de linguagem falada cria a cada
minuto a motivação de cada nova reflexão da
fala, da conversa, do diálogo.” (p. 315)
“Na linguagem escrita nós mesmos somos
forçados a criar a situação, ou melhor a
representá-la no pensamento”. (p. 315)
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A investigação revela ainda que na linguagem escrita a
criança deve agir voluntariamente. A linguagem escrita é
mais intencional que a falada. Este é o motivo central da
escrita.
A escrita exige que as crianças comecem a tomar
consciência da linguagem:
 “A forma sonora da palavra, que na fala é pronunciada
automaticamente,
sem
decomposição
em
sons
particulares, tem de ser decomposta na escrita”.
 “Ao pronunciar qualquer palavra, a criança não se dá conta
dos sons que emite nem realiza nenhuma operação ao
pronunciar cada som separadamente”.
 “Na escrita, ao contrário, ela deve ter consciência da
estrutura sonora da palavra, desmembrá-la e restaurá-la
voluntariamente nos sinais escritos”. (p. 316)
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Escrever, assim, demanda uma ação analítica
voluntária por parte da criança: exige que ela pense
sobre a linguagem;
Quando as crianças falam e mesmo os adultos, o
fazem sem “ter consciência de que estão utilizando
palavras, de que estas são compostas por unidades
menores e a aprendizagem da linguagem escrita
requer a tomada de consciência de muitos
aspectos do funcionamento linguístico”. (p. 316)
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“Os signos da linguagem escrita e o seu
emprego são assimilados pela criança de
modo consciente e intencional, ao contrário
do emprego e da assimilação inconsciente
de todo o aspecto sonoro da fala” (p. 315).
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Somente com a internalização dos signos e
significados é que a criança desenvolverá a escrita.
Com relação a isto Vigotski (2009 p. 315) afirma
que:

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“[...]
a
aprendizagem,
geralmente,
precede
o
desenvolvimento. Assim, fica claro que a criança, em
primeiro lugar, precisa internalizar os motivos da escrita
para depois poder realizar esta atividade”.
“Ou seja, para que a criança escreva há necessidade de
razões mais intelectualizadas, uma vez que esta forma de
expressão não atende às necessidades imediatas da
criança, haja vista que ela já consegue se comunicar muito
bem pela fala”.
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A criança quando vai à escola já tem amplo domínio da
fala para expressar-se de forma organizada, mas ainda
não sabe como isso pode se organizar na escrita;
Cabe à escola intervir e ajudar nesse processo em que
a criança e o professor atuam com vistas à efetiva
elaboração interpessoal da aprendizagem por meio da
apresentação ordenada do conteúdo por parte do
professor e por intermédio da atividade das crianças
apropriando-se da leitura e da escrita.
Neste sentido, as crianças e o conteúdo a ser aprendido
devem ser colocados em mútua relação através da
mediação docente;
Pré-história da escrita na criança
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Para Vigotski o desenvolvimento da língua escrita
expressa-se como um processo histórico que
percorre pontos importantes:
O início desse percurso é destacado pelo gesto
como signo visual, como se eles fossem a “escrita
no ar”, constituindo-se nos fundamentos da futura
escrita, mas a criança nesta fase usa o gesto para
completar a fala;
Os rabiscos e a dramatização estão também
ligados à origem dos signos escritos;
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Outro aspecto do desenvolvimento da criança destacado por
Vigotski e que influencia na construção da escrita é o
simbolismo utilizado no brinquedo;
Para as crianças, os objetos podem se constituir em
representação de outros objetos, tornando-se seus signos, não
sendo necessário algum grau de similaridade, basta que eles
sirvam para executar os gestos representativos necessários
naquele momento.
Assim, em uma brincadeira um palito de fósforo pode se tornar
uma criança e um cabo de vassoura, um cavalo.
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Com relação a isso, Vigotski afirma que:
“[...] um objeto adquire uma função de signo, com
uma história própria ao longo do desenvolvimento
tornando-se, nesta fase, independente dos gestos
das crianças. Isso representa um simbolismo de
segunda ordem e, como ele se desenvolve no
brinquedo, consideramos a brincadeira do faz-deconta como um dos grandes contribuidores para o
desenvolvimento da linguagem escrita – que é um
sistema de simbolismo de segunda ordem”.
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Para o autor, tanto no brinquedo quanto no desenho identifica-se um
simbolismo de primeira ordem por estarem apoiados nos gestos e na
fala, que comunicam e indicam gradualmente os significados;
Somente mais tarde é que a representação gráfica começa a designar
algum objeto e atribui-se um nome aos rabiscos feitos no papel. A partir
desse pressuposto, compreendemos que a língua escrita é,
inicialmente, um simbolismo de segunda ordem porque tende a
representar os sons da fala.
Lentamente, a criança vai deixando de lado a língua oral como
intermediária entre a escrita e aquilo que ela representa. Nesse
momento, a escrita passa a representar diretamente a realidade,
tornando-se simbolismo de primeira ordem. Sendo esse um processo
contínuo de desenvolvimento das funções psicológicas da criança e da
aquisição de símbolos.
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“Isso significa que a linguagem escrita é constituída
por um sistema de signos que designam os sons e
as palavras da linguagem falada, os quais, por sua
vez, são signos das relações das entidades reais”;
Ao dominar esse sistema simbólico extremamente
complexo, a criança cria sinapses essenciais para
outras formas elaboradas de pensamento “[...] A
criança se desenvolve na medida em que aprende
[...]” (VIGOTSKI, 2009, p. 301).
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A língua escrita – produto e instrumento da prática
social muda profundamente os modos de
funcionamento da percepção, da memória e do
pensamento, assim, ao apropriar-se da língua escrita
a criança se apropria das técnicas e conhecimentos
oferecidas por sua cultura.
Esse sistema simbólico é considerado um dos
instrumentos culturais mais bem elaborados pela
humanidade, é um produto, mas ao mesmo tempo um
elemento importante para o próprio desenvolvimento
da humanidade no homem/mulher.