Curso de Justiça de Michael Sandel
Download
Report
Transcript Curso de Justiça de Michael Sandel
Curso de Justiça de
Michael Sandel
Capítulo 2.
O princípio da máxima
felicidade.
O utilitarismo.
Verão
de 1884.
Quatro marinheiros.
Navio Mignonette: naufrágio.
Três
primeiros dias: comeram
pequenas porções de nabo.
Quarto
dia: pegaram uma tartaruga.
Depois:
8 dias.
ficaram sem alimentação por
19º
dia: taifeiro fica doente por
tomar água do mar.
Dudley
sugere sorteio.
Brooks:
Outro
contra.
dia: Stephen apunha-la um
canivete na jugular de Parker.
No
24º dia, durante o café da
manhã, são resgatados.
Quando
retornam à Inglaterra são
presos e levados a julgamento.
Dudley
Foram
e Stephens são condenados.
réus confessos.
A
pergunta mais difícil de responder
não é se você fosse o juiz como
julgaria, mas sim, se matar o taifeiro
naquela ocasião seria moralmente
justificável.
Resposta
da defesa: diante das
circunstâncias extremas, era melhor
que um morresse para salvar três.
Objeções:
enfraquecimento da regra
contra assassinato e se matar
alguém indefeso é errado.
Mas
a primeira opção, salvar três
para matar um, tem a ver com o
princípio do utilitarismo.
Pesar
custos e benefícios para tomar
certa atitude em determinada
situação.
Já
a segunda objeção tem a ver com
a rejeição de simplesmente medir as
conseqüências (custos e benefícios)
de um ato.
Esses
dois entendimentos sobre o
caso do bote salva-vidas ilustram
duas abordagens opostas da justiça:
-
moral depende das conseqüências
que ela acarreta, ou seja, a coisa
certa a fazer é a que trará melhores
resultados;
-
a segunda nos fala que as
conseqüências não são tudo com o
que devemos nos preocupar.
Para solucionar o caso do bote salvavidas, bem como outros dilemas
menos extremos com os quais
normalmente nos deparamos,
precisamos explorar algumas
grandes questões da moral e da
filosofia política e tentar responder
algumas questões:
- A moral é uma questão de avaliar
vidas quantitativamente e pesar
custos e benefícios?
-
Ou certos deveres morais e direitos
humanos são tão fundamentais que
estão acima de cálculo dessa
natureza?
-
Se certos direitos são assim
fundamentais – sejam eles naturais,
sagrados, inalienáveis ou categóricos
-, como podemos identificá-los?
-
E o que os torna fundamentais?
O Utilitarismo de Jeremy Bentham.
Desrespeito
as ideias do direito
Considerava
um absurdo total.
natural.
Seus
pressupostos filosóficos
exercem até hoje uma poderosa
influência sobre o pensamento de
legisladores, economistas, executivos
e cidadãos comuns.
O
mais elevado objetivo da moral é
maximizar a felicidade, assegurando
a hegemonia do prazer sobre a dor.
Maximizar
a utilidade.
O
que é utilidade para Bentham?
Tudo
aquilo que produza prazer ou
felicidade e que evite a dor ou
sofrimento.
Como
Bentham chega a este
raciocínio?
Todos
somos governados pelos
sentimentos de dor e prazer.
Prazer
e dor nos governam em tudo
o que fazemos e determinam o que
devemos fazer.
Todos
gostamos do prazer e não
gostamos da dor.
A
filosofia utilitarista reconhece este
fato e faz dele a base da vida moral
e política.
As
leis para Bentham devem: fazer o
possível para maximizar a felicidade
da comunidade em geral.
Qual
a grande pergunta que os
legisladores e os cidadãos devem se
fazer:
Se
somarmos todos os benefícios
dessa diretriz e subtrairmos todos os
custos, ela produzirá mais felicidade
do que uma decisão alternativa?
Todo
argumento moral, diz ele, deve
implicitamente inspirar-se na ideia
de maximizar a felicidade.
Bentham
achava que seu princípio da
utilidade era uma ciência da moral
que poderia servir como base para a
reforma política. Ele propôs uma
série de projetos com vistas a tornar
a lei penal mais eficiente e humana.
Panapticon:
presídio com uma torre
central de inspeção que permitisse
ao supervisor observar os detentos
sem que eles o vissem.
Gerenciamento
por empresário onde
se remuneraria com o lucro dos
trabalhos dos presos.
Terceirização
do sistema
penitenciário?
Arrebanhando mendigos.
Melhorar
o tratamento dado aos
pobres construindo um reformatório
autofinanciável para abrigá-los.
Reduzir
ruas.
Clássica
a presença de mendigos nas
visão utilitarista.
Bentham
percebe que mendigos nas
ruas reduz a felicidade aos
transeuntes.
Quer
pela visão que traz um
sentimento de dor para os mais
sensíveis e de repugnância, para os
mais insensíveis.
De
uma forma ou outra, mendigos
trazem infelicidade.
Mas
não seria injusto para os
mendigos?
Não
interessa, a soma do sentimento
de felicidade em geral será maior
que o da infelicidade.
E os custos dos abrigos?
Não
seria um gasto que relativizaria
o utilitarismo?
Bentham
propôs que qualquer
cidadão que visse um mendigo
pudesse apreendê-lo e levá-lo para o
abrigo mais próximo.
Uma
vez lá, o mendigo deveria
trabalhar para pagar sua estadia.
Cada
cidadão ganharia 20 xelins por
captura
Prisões-oficina.
Lógica
utilitarista nas prisões-oficina.
Minimizar
o desconforto.
Identificação
lado.
dos presos nas celas ao
Para
cada grupo, no qual todo
comportamento inconveniente deve
ser identificado, coloque-se um
grupo não suscetível àquele
comportamento inconveniente.
Perto
de loucos delirantes ou pessoas
com linguajar libertino?
Coloca-se
os surdos ou idiotas.
Perto
de prostitutas e jovens
desregradas?
Coloca-se
mulheres idosas.
Aqueles
que apresentam
deformações chocantes?
Coloca-se
os cegos.
Por
mais cruel que sua proposta
possa parecer, o objetivo de
Bentham não era punir os mendigos.
Ele apenas queria promover o bemestar geral resolvendo um problema
que afeta a felicidade social.
Existem
objeções às teorias de
Bentham?
Objeção 1: direitos individuais.
A
vulnerabilidade mais flagrante do
utilitarismo, muitos argumentas, é
que ele não consegue respeitar os
direitos individuais.
Ao
considerar apenas a soma das
satisfações, pode ser muito cruel
com o indivíduo isolado.
Exemplos:
Na
Roma antiga, cristãos eram
jogados aos leões no Coliseu para a
diversão da multidão. Imaginemos
como seria o cálculo utilitarista: Sim,
de fato o cristão sofre dores
excruciantes quando o leão o ataca e
o devora, mas pensemos no êxtase
do coletivo dos expectadores que
lotam o Coliseu. Se a quantidade de
romanos que se deleitam com o
espetáculo for muito maior do que a
de cristãos, que argumentos teria
um utilitarista para condenar tal
prática?
A tortura é justificável em alguma
circunstância?
Justificativa
da tortura em
interrogatória de suspeitos de
terrorismo.
Prisão
de suspeito de colocar bomba
no centro de Porto Alegre.
Você
tem todos os indícios para
saber que o suspeito é quem colocou
a bomba.
O
tempo vai passando e ele se
recusa a cooperar.
Seria
certo torturá-lo para que diga
em que lugar está a bomba?
Cálculo utilitarista.
É
moralmente justificável infligir dor
intensa a uma pessoa se isso evitar a
morte e sofrimento em grande
escala.
Segundo
o ex-vice-presidente
Richard Cheney s técnicas de
interrogatório contra membros da AlQaeda impedu outro ataque
terrorista.
O
que fazer quando a vida de
milhares estão em jogo?
O
utilitarista argumentaria que, até
certo ponto, mesmo o mais ardente
defensor dos direitos humanos
encontraria dificuldade para justificar
que é moralmente preferível deixar
um grande número de inocentes
morrer a torturas um único terrorista
suspeito que pode saber onde a
bomba está escondida.
Pergunta:
Se um grande número de
pessoas estiver em risco, devemos
abandonar nossos escrúpulos sobre
dignidade e direitos humanos?
E se tirarmos a culpa do suspeito?
Suponhamos
que a única forma de
induzir o suspeito de terrorismo a
falar seja a tortura de sua jovem
filha (que não tem noção das
atividades nefastas do pai). Seria
moralmente justificável fazer isso?
Talvez
o mais convicto utilitarista
vacilasse ao pensar nessa
possibilidade.
A cidade da felicidade.
Conto
“The
de Ursula K. Le Guin.
Ones Who Walked Away from
Omelas”.
O conto fala de uma cidade chamada
Omelas – uma cidade de felicidade e
celebração cívica, um lugar sem reis ou
escravos, sem propaganda ou bolsa de
valores, sem bomba atômica .
Claro que é um lugar surreal, mas a
autora conta mais sobre ele: “Em um
porão sob um dos belos prédios públicos
de Omelas, ou talvez na adega de uma de
suas espaçosas residências particulares,
existe um quarto com uma criança
trancada e sem janelas”.
A criança é oligofrênica, está malnutrida e
abandonada.
Todos sabem que ela está lá, todas as
pessoas de Omelas (...) Sabem que ela
tem que estar lá (...) Todos acreditam que
a própria felicidade, a beleza da cidade, a
ternura de suas amizades, a saúde de
seus filhos (...) até mesmo a abundância
de suas colheitas e o clima agradável de
seus céus dependem inteiramente do
sofrimento abominável da criança (...) Se
ela for retirada daquele local horrível e
lavada para a luz do dia, se for limpa,
alimentada e confortada, toda a
prosperidade, a beleza e o encanto de
Omelas definharão e serão destruídos.
São essas as condições.
Objeção 2: valores como moeda
comum.
O
utilitarismo procura mostrar-se
como uma ciência de moralidade
baseada na quantificação, na
agregação e no cômputo geral da
felicidade. Ele pesa as preferências
sem julgar.
As
preferências de todos têm o
mesmo peso.
Será
possível traduzir todos os bens
morais em uma única moeda
corrente sem perder algo na
tradução?
Os benefícios do câncer do
pulmão.
Philip
Morris, o que é?
Governo
preocupado com os altos
custos médicos causados pelo
consumo de cigarro resolveu:
Philip
Morris encomenda uma análise
custo-benefício dos efeitos do
tabagismo para o orçamento do país.
Qual
resultado da pesquisa?
Governo
lucra mais do que perde
com o consumo do tabaco.
Os
fumantes morrem mais cedo e
poupam ao governo pensões e
abrigos para idosos.
Somando
o que o Governo gasta em
saúde com os fumantes e diminuindo
o que ele lucra com a morte mais
cedo das pessoas, há uma receita
líquida aos cofres públicos de 147
milhões de dólares por ano.
Pode-se colocar preço na vida
humana?
Explodindo
tanques de combustível.
Década
de 70 – Ford Pinto.
Tanque
poderia explodir se outro
carro colidisse contra sua traseira.
Mais
de 500 pessoas morreram
quando seus automóveis pegaram
fogo.
Muitas
outras sequeladas.
Ford Pinto?
Num
dos processos foi descoberto
que a Ford Motor Company sabia do
erro de projeto.
O
conserto do por carro ficaria em 11
dólares.
O
que fez a Ford: um cálculo.
180
mortes por ano e 180 pessoas
com queimaduras.
180
mortes: +- 200.000 dólares.
180 queimaduras: +- 67.000
dólares.
Valor:
U$$ 49.500.000,00.
Do
outro lado:
11
dólares X 12,5 milhões de
unidades.
U$$
125.000.000,00.
O
custo de pagar o conserto era
muito maior do que enfrentar
processos judiciais.
O que fez Bentham para dar
credibilidade a sua tese.