Introdução à Política Externa Brasileira II

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Introdução à Política Externa Brasileira II

A Política Externa Independente no governo de Jânio Quadros

• No dia 31 de janeiro de 1961, Jânio Quadros tomou posse como presidente do Brasil. • Seu governo durou pouco mais de sete meses, mas, nesse breve período, o presidente Quadros colocou as bases para a implantação de uma política externa inovadora, denominada Política Externa Independente (PEI). • Essa linha política apresentava-se de um lado, como a continuação e o aprofundamento do projeto nacional desenvolvimentista inaugurado por Getúlio Vargas e, de outro, como uma proposta pioneira, sobretudo, no que dizia respeito à tradicional aliança com os Estados Unidos.

• Aproveitando as mudanças internacionais favoráveis à adoção de uma política externa mais autônoma em relação à potência norteamericana, Jânio Quadros procurou estabelecer relações políticas e comerciais com todos os países, inclusive os países socialistas. • Já antes de sua posse como presidente, Jânio Quadros visitou Cuba, em 1960, e, em seguida, viajou para Moscou com o intuito de restabelecer relações diplomáticas com a URSS, que haviam sito interrompidas em 1947, durante a gestão do presidente Gaspar Dutra. • Jânio Quadros pertencia a um partido conservador, a União Democrática Nacional (UDN), enquanto seu vice, João Goulart, pertencia a um partido de esquerda, o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). O fato de pertencer a um partido conservador permitiu ao presidente Quadros maior espaço de manobra.

• Ele pôde, durante sua gestão, adotar posturas diferentes no âmbito da política interna e da política externa. • o presidente Quadros adotou uma postura predominantemente conservadora, procurando alinhar a economia brasileira aos princípios do FMI, enquanto no exterior ensejava uma administração autônoma dos Estados Unidos, o que agradava aos grupos de esquerda e aos nacionalistas. • A PEI foi concebida justamente como instrumento para uma política de desenvolvimento nacional.

• Era uma experiência inédita, que dava à política externa brasileira, até então limitada a visões regionalistas, uma dimensão mundial e uma postura ativa frente às mudanças internacionais. • No final dos anos 50, início dos anos 60, o cenário internacional transformou-se, favorecendo a ampliação das relações internacionais. Destacamos: • a recuperação econômica da Europa Ocidental e do Japão, que se apresentavam ao Brasil como possíveis alternativas comerciais;

• o surgimento do Movimento dos Países Não-Alinhados, em 1961, que sublinhava a necessidade de uma nova ordem internacional contra a divisão do mundo em dois blocos, • o processo de descolonização na África e na Ásia; a emergência da URSS como nova potência mundial.

• Tudo isso criou as condições necessárias para que o Brasil buscasse desenhar as linhas guia de uma nova política externa, mais autônoma. • Em relação, por exemplo, a Portugal, aliado tradicional do Brasil, o presidente Quadros procurou afastar se da política colonialista do presidente Salazar, passando a defender a independência das colônias africanas de Angola e Moçambique. • Da mesma forma, criticou o sistema de apartheid vigente na África do Sul.

• No continente americano, o presidente Jânio Quadros procurou aproximar-se da Argentina, formando um movimento de resistência contra uma possível intervenção norteamericana na América Latina, em razão da Revolução Cubana. • Com a atuação da PEI, o governo brasileiro procurava reagir à queda do comércio exterior, buscando novos mercados para os produtos brasileiros, sem distinguir entre mercados pertencentes a países democráticos ou socialistas.

• A PEI defendia a formulação de planos de desenvolvimento econômicos que previam a aceitação de ajuda internacional desde que essa ajuda não contrastasse o desenvolvimento nacional. • A defesa de uma política externa independente não agradou aos grupos conservadores brasileiros, que se assustaram com a insistência do governo de aproximar o Brasil aos países comunistas. • Em 1960, Jânio Quadros enviou João Goulart, seu vice considerado pelos conservadores um esquerdista de primeira para uma missão comercial na China, em busca de novos mercados. • No mesmo ano, Jânio Quadros condecorou, em Brasília, o ministro da economia de Cuba, Che Guevara. Tais ações agravaram a crise interna, levando à renúncia do presidente Jânio.

A Política Externa Independente no governo de João Goulart

• Jânio Quadros anunciou a renúncia ao cargo de presidente com o intuito de aumentar seus poderes, esperando que tal ato não fosse aceito. • A direita civil e militar, porém, aceitou a renúncia e barrou a posse de João Goulart como novo presidente. Leonel Brizola promoveu a campanha da legalidade, que resultou no retorno de Jango, mas via parlamentarismo. Tancredo Neves foi nomeado primeiro-ministro.

• O presidente João Goulart tomou posse no dia 7 de setembro de 1961, já enfrentando a oposição dos grupos conservadores que desde sua gestão como vice-presidente consideravam sua atuação política altamente suspeita por seu envolvimento ideológico com a esquerda nacional. • San Tiago Dantas foi nomeado Ministro das Relações Exteriores. Tal decisão salvou o destino da Política Externa Independente, pois o ministro Dantas conseguiu colocar em prática o discurso de autonomia ensejado pelo presidente Quadros. • Apesar da resistência dos conservadores, o Ministro das Relações Exteriores empenhou-se em estabelecer um plano estratégico de atuação da PEI.

• Ele esquematizou as diretrizes da Política Externa Independente em cinco princípios: • 1) contribuição para a preservação da paz, por meio da prática da coexistência e do apoio ao desarmamento geral e progressivo; • 2) reafirmação e fortalecimento dos princípios de não-intervenção e autodeterminação dos povos; • 3) ampliação do mercado externo brasileiro mediante o desarmamento tarifário da América Latina e a intensificação das relações comerciais com todos os países, inclusive os socialistas;

• 4) apoio à emancipação dos territórios não-autônomos, independente da forma jurídica utilizada para sua sujeição à metrópole; • 5) política de autoformulação dos planos de desenvolvimento econômico e de prestação e aceitação de ajuda internacional.

• A ampliação dos mercados internacionais foi uma das preocupações principais da PEI, para contrabalançar a necessidade de importação do país e aumentar o PIB nacional. • No final de 1961, foram restabelecidas as relações diplomáticas com a União Soviética, justificando tal decisão pelo alto índice de crescimento econômico do bloco soviético, e pelas consequentes oportunidades comerciais que o restabelecimento de tais relações oportunizaria para o país.

• Em 1962, durante a crise de Cuba, o Brasil posicionou se contra a possível intervenção norte-americana na ilha de Cuba, mantendo-se coerente com o princípio da PEI de defesa da não-intervenção, e por considerar indevida a ingerência de qualquer estado nos assuntos internos de outros países.

• Tal postura pôs em alerta o governo norte americano, preocupado com uma possível perda de controle sobre o continente sul americano, assim como confirmou o temor dos grupos conservadores brasileiros sobre o suposto esquerdismo do presidente Goulart.

• A situação de divisão interna agravou-se quando o presidencialismo foi restabelecido no Brasil, em janeiro de 1963, significando o fim das limitações de poder impostas ao presidente Goulart com o parlamentarismo. • Durante este período, a política externa brasileira sofreu fortes desgastes, devido às continuas mudanças de ministro das relações exteriores. Em 1964, João Goulart aprovou a regulamentação da remessa de lucros para o exterior, enquanto o Itamaraty, que havia abandonado a PEI, renovava o Acordo Militar com os Estados Unidos.

• A ação do Presidente Goulart perdeu força sem o apoio nacional e internacional. O golpe de 31 de março de 1964 marcou o fim da Política Externa Independente. • Os Estados Unidos foram acusados de ter ajudado os militares a derrubar o governo de João Goulart. • Segundo os historiadores Amado Luiz Cervo e Clodoaldo Bueno, “os Estados Unidos não se envolveram diretamente com a elaboração do golpe de 1964, mas dele tinham conhecimento, bem como o acompanharam com óbvio interesse e simpatia e estavam preparados para um eventual apoio aos sublevados caso fosse necessário (operação Brother Sam). • Além disso, acolheram o novo governo (de Castelo Branco) com satisfação e inauguraram com este uma política de apoio e colaboração”.

Da segurança nacional à “diplomacia da prosperidade”(1964-1969)

• No dia 15 de abril assume a presidência do Brasil o general Humberto Castelo Branco; Vasco Leitão da Cunha assume o Ministério das Relações Exteriores. • As Forças Armadas passaram a governar apoiadas em tecnocratas. • Economistas liberais e pró-norte-americanos, como Roberto Campos (apelidado de Bob Fields) foram colocados como responsáveis do Ministério da Fazenda e Planejamento.

• Os Eua ajudaram os militares brasileiros, liberando recursos em centenas de milhões de dólares, recursos bloqueados durante a presidência de Goulart. As finanças estabilizaram-se. • No campo diplomático, o governo de Castelo Branco representou um verdadeiro recuo, abandonando o terceiro-mundismo, o multilateralismo e a dimensão mundial da PEI regredindo para uma aliança automática com os Eua e para uma diplomacia de âmbito hemisférico e bilateral.

• O que embasava tal retrocesso era a geopolítica da Guerra Fria, teorizada pela ESG, Escola Superior de Guerra criada no Brasil em 1948 seguindo o modelo americano, com seu discurso centrado nas fronteiras ideológicas e no perigo comunista. • Em troca da subordinação, o Brasil esperava receber apoio econômico. Como prova de lealdade o Brasil rompeu as relações diplomáticas com Cuba em 1964. Em troca da subordinação, o Brasil esperava receber apoio econômico.

• Na seqüência a pedido de Washington, o Brasil enviou tropas à Rep. Dominicana em 1965, sob bandeira OEA. Esta atitude danificou a imagem do Brasil na AL. • O conceito de SUBIMPERIALISMO passou a ser empregados em relação à diplomacia do regime militar brasileiro. • O Brasil manteve suas relações diplomático-comerciais com o bloco soviético mas reduziu sua intensidade e seu peso político. As relações com a RP da China, ao contrário, foram rechaçadas.

• Teve também um afastamento em relação aos países afro-asiáticos e ao Movimento dos Países-não-alinhados. O regime militar queria distanciar se do passado político de Goulart, mas quis manter uma certa autonomia como no caso da recusa de enviar tropas brasileiras no Vietnam. • O MRE se manteve como um dos principais depositários de algo que pode ser chamado de “projeto nacional”. O Itamaraty foi a única instituição não expurgada por Comissões de Inquérito Externo.

Governo do general Arthur da Costa e Silva (1967-1968)

• Em 1967, nova constituição • Mudou-se o nome do país em República Federativa do Brasil. Foram promulgadas uma Lei da Imprensa e uma Lei de Segurança Nacional, institucionalizando as medidas coercitivas do regime. • O general Arthur da Costa e Silva assumiu como novo presidente. Foi retomado o desenvolvimento econômico que atingiu um crescimento de 9,3% do PIB em 1968

• As relações internacionais representaram uma ruptura com o governo anterior, contrariando frontalmente Washington. • A DIPLOMACIA DA PROSPERIDADE do chanceler Magalhães Pinto era voltada para a autonomia e desenvolvimento e assemelhava à PEI, embora sem fazer referência às reformas sociais.

• o Brasil foi indicado para a presidência do grupo dos 77, que era um movimento de países do terceiro mundo que visava o desenvolvimento, uma espécie de versão econômica dos não alinhados.

• A ênfase da Diplomacia da Prosperidade foi o desenvolvimento e a soberania nacional. O país buscava retomar a cooperação tecnológico-nuclear com vários países, bem como aprofundar relações comerciais com países socialistas. • Consequentemente as relações com os Eua agravaram-se e o governo norte americano passou a criticar Costa e Silva. O seu governo acabou em 1968.

Médici e a Diplomacia do Interesse Nacional (1969-1974)

• São conhecidos como os anos de chumbo. Nova Lei de Segurança ainda mais rigorosa, introduzindo a pena de morte e promovendo novo expurgo das forças armadas.

• . No campo econômico, as coisas eram diferentes. Famosa a frase do presidente “O Brasil vai bem, mas o povo vai mal”. Sob o comando de Delfim Neto, o Brasil cresceu em torno de 10% entre 1970 e 1973, fenômeno conhecido como MILAGRE BRASILEIRO.

• No plano internacional sua política foi chamada de DIPLOMACIA DO INTERESSE NACIONAL.

• A solidariedade terceiro-mundista foi abandonada, bem como o discurso politizado (que deu lugar ao pragmatismo), foi retomado o bilateralismo e a via solitária enquanto se retomava um relacionamento satisfatório com os EUA. • A nova política tinha projetos ambiciosos: o ingresso do Brasil no Primeiro Mundo, o BRASIL POTÊNCIA.

• Laços com a Europa Ocidental e o Japão foram estreitos objetivando a atração de investimentos e tecnologia. Forte impacto simbólico teve a ampliação do mar territorial brasileiro de 12 para 200 milhas em 1970 contra a vontade dos EUA. • O que permitiu conciliar as boas relações com os EUA e o projeto nacionalista industrializante de grande potência foi a questão interna brasileira (combate à guerrilha) que gerou solidariedade por parte da Casa Branca num momento em que governos de esquerda estavam no poder no Chile e no Peru.

• O Brasil cumpriu com o papel que Washington esperava, fornecendo apoios aos golpes de estados no Chile, no Uruguai, na Bolívia. • A Diplomacia de Interesse Nacional tirou proveito das brechas existentes no sistema internacional, enfatizando uma estratégia individual de inserção, estabelecendo relações essencialmente bilaterais,

Geisel e o Pragmatismo Responsável e Ecumênico (1974-1979)

• Para a sucessão foi indicado o general Ernesto Geisel, presidente da Petrobras e chefe da casa militar durante o governo Castelo Branco. O novo governo representou a volta dos castelistas (liberais). • O principal projeto de Geisel era o encaminhamento do processo de abertura política. Era preciso encerrar o ciclo militar antes que este sofresse um desgaste irreparável e comprometesse as Forças Armadas como instituição.

• A motivação conjuntural era que o país estava mergulhando com a crise do petróleo. • O fim do milagre anulava um dos instrumentos legitimadores do regime, o sucesso econômico, sendo necessário uma descompressão política para evitar radicalização e explosão. Iniciava-se a discussão da abertura política. • O primeiro passo da diplomacia denominada PRAGMATISMO RESPONSAVEL E ECUMENICO do chanceler Antônio Azeredo da Silveira foi aproximar se dos países árabes.

• O Itamaraty permitiu a instalação de um escritório da OLP em Brasília, apoiou o chamado voto anti-sionista na ONU, uma condenação ao racismo que incluía o sionismo como uma de suas formas.

• Adotou uma intensa política exportadora de produtos primários, industriais e serviços em troca do fornecimento de petróleo. • Relações diplomático-comerciais com a RP da China em 1974.

• A atuação brasileira na ONU conheceu um intenso protagonismo. Foi o primeiro país a reconhecer o governo marxista do Movimento Popular de Libertação da Angola mantendo estreitas relações com o Moçambique e outros estados da África. • O pragmatismo responsável encontrou forte oposição por parte dos Eua bem como nos segmentos conservadores da política brasileira. • Fortes ataques por parte da mídia, o que não tinha acontecido durante o governo Medici.

• O projeto de abertura política gerou mais problemas que a inovação da política externa. Episódios de violência a partir de 1976, as crescentes dificuldades econômicas geraram manifestações e revoltas crescentes.

Figueiredo e o “universalismo”(1979-1985)

• O general João Baptista Figueiredo foi empossado como presidente no dia 15 de março de 1979.

• O principal motivo do novo governo era a continuidade e a conclusão do processo de redemocratização, encerrando o ciclo militar.