O direito nos impérios antigos.
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Transcript O direito nos impérios antigos.
Universidade de São Paulo
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
Departamento de Geografia.
Aluno: Antonio Sérgio Martins
Disciplina: A produção da metrópole no período atual: Estado, corporações e
organizações de solidariedade.
Professor: Ricardo Mendes Antas Jr.
O direito na História
Autor: José Reinaldo de Lima Lopes.
O direito nos impérios antigos.
Os impérios antigos são atravessados por divisões fundamentais, divisões que
utilizam critérios geográficos e atividades sociais distintas.
Divisão entre cidade e campo.
A cidade
A cidade opõe-se ao campo. Dela vêm as novidades que alteram a vida dos
camponeses, tais como o ferro e os instrumentos de aço.
Os impérios antigos organizam-se em torno de cidades que submetem pelo poder
militar outras cidades e o campo em sua volta. Neste mesmo campo, o que se
encontram são sociedades tribais, de clãs familiares que ocupam a terra e a
trabalham em comum, ou pastoreiam o gado.
A cidade é o centro do controle que detém a escrita (memória escrita), os livros,
faz o senso e cobra tributos, isto é, a forma de apropriação externa a comunidade
tribal. A cidade promove, controla e organiza o uso da força natural dos rios:
construindo canais de irrigação, fazendo silos e armazéns. A cidade antiga é um
depósito, um reservatório de riquezas, ela também é um cofre dos quais poucos
detém a chave.
A cidade se reduz a dois aspectos centrais: arrecadar os tributos e manter a
indispensável paz interna e externa. Por isso, sua interferência na vida das
comunidades tribais em geral é apenas para extrair estes tributos e em caso de
conflitos que possam degenerar em rompimento do equilíbrio do império, manter a
paz. A cidade impõe militarmente a paz.
O campo
No campo, as comunidades vivem segundo suas próprias regras, as comunidades do
campo tem a sua própria justiça, em geral presidida por um conselho de anciãos, ou
por alguém que é escolhido pelos mais respeitados. A justiça da aldeia tratava das
regras cotidianas de relações neste universo de relações comunitárias, face a face que
no mundo antigo é a maior parte.
Internamente as divisões que ocorrem no campo levam em consideração as
distintas atividades de subsistência como o pastoreio e a agricultura. Os principais
conflitos no campo ocorriam quando uma atividade se dava no território da outra, por
exemplo, quando algumas cabras eram encontradas nas áreas de agricultura se
alimentando da plantação
O direito na Grécia
O modelo grego que nos interessa é o modelo ateniense, pois é sobre ele que se
voltarão os filósofos e juristas ocidentais. Também Atenas compartilha um
elemento fundamental de nossa tradição jurídica: a laicização do direito e a ideia
de que as leis podem ser revogadas pelos mesmos homens que as fizeram.
Costuma-se dizer que da Grécia veio pouca coisa na tradição jurídica e que a
rigor o ocidente deve mais a Roma nesta área. Trata-se de uma meia verdade. Em
primeiro lugar a própria filosofia grega tem papel relevante, em um certo ponto
em diante a filosofia vai debruçar-se sobe o mundo das coisas humanas, o
universo da liberdade. Assim passa-se à reflexão metódica sobre a liberdade, a
política e a ética. A filosofia passa a refletir sobre a lei, quem faz, por que faz como
faz as leis? Como se mudam as leis?
Aristóteles deixou-nos uma classificação das provas que fazia sentido neste
sistema: elas eram naturais e artificiais. Naturais eram prova da existência da lei,
testemunhas, contratos, juramentos. Em outras palavras, as provas naturais eram
evidências empíricas. As artificiais são fornecidas por nossa invenção e
descoberta, procedem de nosso raciocínio: são indícios e presunções pelos quais
passamos daquilo que sabemos. Aloquência fornece provas.
Deslocamento do centro da vida da família para a cidade.
Para o pensamento grego já não são suficientes as decisões levadas a cabo
pelos juízes de aldeia, os velhos, sábios e prudentes. A solidariedade cívica
precisa de regras universais, que valham para todos os casos e que não sejam
simples aplicação da prudência a cada caso concreto. A simples solidariedade de
sangue ou tradição é incapaz de gerar um amplo espaço público, uma polis ou
uma democracia. Para os gregos a cidade não pode depender da justiça do cadi,
da aldeia, do simples respeito pessoal que se tem para com os mais velhos ou
mais experientes, embora a experiência em assuntos de justiça e de política
continue a importar.
Depois de concluída a transição da centralidade da família para a cidade os
habitantes gregos começam a refletir da seguinte forma: se acima das
solidariedades familiares é possível construir uma solidariedade cívica, então é
também possível que haja uma solidariedade ainda mais universal, cosmopolita
ou até mesmo uma cidadania universal, um pertencimento ao gênero humano.
Em uma civilização voltada para o mar, com o grande comércio mediterrâneo, os
estrangeiros serão percebidos ao mesmo tempo como iguais e como diferentes
fornecendo elementos para esta discussão. Além das leis particulares de cada
cidade e cada nação haveria algo? Haveria um direito comum a todos os povos,
um direito das gentes ou natural?
A reflexão sobre o direito e a justiça, portanto, tem a ver com a própria
constituição das cidades. Há então um enorme esforço para superar a
solidariedade familiar e transformar a cidade no centro da vida social e política.
Aristóteles, falando da cidade e da justiça, dirá que objetivo é criar a amizade
entre os homens (cidadãos): mostra que não são apenas as famílias o fundamento
da vida social. É preciso criar uma amizade cívica, um espírito aberto aos outros de
fora das famílias.
Embora a tradição e os laços familiares ainda sejam determinantes na sociedade
grega, a existência da cidade e a consciência que ela é um artefato humano,
mesmo que naturalmente exigida pela sociabilidade, são tematizadas de tal modo
que até hoje somos contemporâneos do seu debate, assim como os mesmos
romanos se sentiram seus herdeiros.
Desenvolvendo uma civilização voltada para o mar, os gregos entram em contato
com a diversidade das culturas de outros povos. O espírito de comparação leva-os,
portanto, a indagar o que afinal é comum entre todas as nações. As próprias
diferenças entre as cidades gregas colaboram para que de compreenda o direito
com um espírito comparativo e flexível.
Com as constituições em Atenas, a Grécia põe fim à solidariedade familiar. O
grande propósito é abolir a justiça familiar, fonte de sangrentos conflitos. À cidade
compete decidir e manter a paz.
O direito em Roma.
Houve três formas distintas de resolver as controvérsias em Roma:
Primeiro: as ações da lei que correspondem ao período arcaico e mais antigo do
direito romano tendo como centro do saber jurídico a figura dos pontífices.
Segundo: o tempo do processo formular, em que a produção do direito, como
cultura e como regra, está na mão dos pretores ao lado dos juristas, as ações dos
pretores e juristas estão inseridas no período clássico.
Terceiro: período da cognição extraordinária, em que o imperador e seus juristas
se destacam como atores da nova ordem. Estes acontecimentos ocorrem durante
o período tardio.
Período arcaico O poder políticos será exercido de maneira mista com alguns
elementos representativos e oligárquicos. Assim é que convivem assembléias ao
lado de poderes conservadores, como o Senado, o Colégio de Pontífices, as
magistraturas.
O senado é um órgão vitalício visto como um conselho de anciãos, ele é
responsável pela ligação da cidade com a sua história, sua vida e sua autoridade.
Roma foi à civilização da tradição e o senado simbolizava a autoridade dos pais
fundadores. Em casos especiais respondia a consultas e opinava sobre os
negócios.
As assembléias tinham sim uma função legislativa. Na república havia
praticamente três: assembléia por centúrias, de origem militar, quando o exercito
era constituído por todos os cidadãos, a assembléia por tribos ou distritos e a
concilim plebis.
As magistraturas erma cargos eletivos para as funções determinadas e sempre
pelo prazo de um ano e se exerciam muitas vezes em grupos de dois ou mais de
modo de haver um controle recíproco do poder.
O que determina o perfil do direito romano arcaico é que ele somente se aplica
aos romanos, cidadãos. Tem um papel de destaque tudo aquilo que ajuda a
preservar a cidade tradicional: o patrimônio da família, verdadeira unidade de
produção. O papel do pai de família é central e os filhos só se emancipam quando
podem constituir suas próprias unidades produtivas.
No direito iquitário aplica-se por um processo formal e especial. Neste direito
existem casos em que o falar é fazer, nestes casos a palavra é performática, por
exemplo, no casamento, ele somente se realiza quando são pronunciadas as palavras
certas na ocasião certa e pelas pessoas certas, ou seja, o direito arcaico era assim:
cheio de fórmulas que precisavam ser pronunciadas no lugar certo e pelas pessoas
certas. Os pontífices desempenhavam um papel nestes casos.
Processo formular , período clássico .
O processo formular é o ambiente próprio do desenvolvimento da jurisprudência
clássica. Este processo tinha como personagem central o pretor urbano e o peregrino
que remetiam o julgamento ao juiz.
O pretor formulava os editos. O edito do pretor era anual, não era um código
sistemático exaustivo e sim uma proclamação verbal da tribuna.
O pretor era aquele que desenvolvia a fórmula que seria posteriormente aplicada
ao processo.
A tarefa do pretor é organizar a controversa transformando o conflito real em
conflito judicial, por isso o pretor pode ser descrito como um administrador.
A primeira fase do processo inicia-se com a comunicação da pretensão ao
adversário. O interessado deve fazer com que o seu adversário compareça perante o
magistrado para que ali formule sua pretensão. A tarefa de levar seu adversário ao
magistrado é exclusivamente privada. O queixoso precisa ser capaz de ele mesmo
levar o réu, naturalmente com isso se limita o acesso á justiça.
O nome do juiz a ser indicado também era discutido. O pretor dispunha de uma
lista de nomes de cidadãos romanos de classes superiores que deveriam prestar
este serviço na cidade, a lista era conhecida como álbum. O serviço de juiz era um
encargo próprio dos cidadãos, ao qual muitos procuravam escapar, mas que
consideravam em geral um ônus compatível com a honra e o respeito devidos aos
cidadãos superiores.
Depois que os termos das controversas tivessem sido definidos, as partes
firmavam um compromisso perante as testemunhas e o caso era transferido para
um juiz ou um colégio de árbitros que decidiria a questão.
Inserido nesse contexto é importante destacar o papel dos juristas: os juristas
formavam uma categoria aristocrática, não se tratava de uma profissão
propriamente dita, eles prestavam serviços dando conselhos aos pretores, aos
seus amigos, aos clientes etc. A remuneração do jurista não era em dinheiro, mas
uma influência poderosa, prestigio e popularidade.
Ninguém se tornava jurista em Roma por concurso simplesmente, quando
debatiam as questões, formavam-se os auditórios e os discípulos formando assim
um círculo unido às lideranças políticas e econômicas da cidade.
A tarefa dos juristas será original porque justamente valem-se dos instrumentos
gregos para refinar, ampliar, flexibilizar suas heranças romanas e também por
terem a capacidade de valer-se da retórica e da dialética aceitando o limite da
tradição, algo não alcançado pelos gregos.
O destaque para os pretores e juristas é dado, pois segundo o autor José
Reinaldo de Lima Lopes eles foram os autores do direito romano.
Cognição extraordinária
Após o período arcaico, e o período do processo formular é chegada à vez do
período tardio caracterizado pela centralidade do poder jurídico, por uma
valorização dos juristas e pela novidade do recurso ou apelação.
A terceira grande fase do direito romano é dominada por uma mudança no
perfil do processo e por mudanças sociais e políticas.
Ao lado da forma tradicional de justiça que tinha como principais figuras o
pretor e o juiz, surge uma forma concentrada de fazer justiça que tem como
central a figura do imperador.
O imperador em pessoa ou delegados seus são designados para o julgamento
de diversos casos. O imperador não efetuava essa tarefa sozinho, ele contava
com um conselho formado por juristas.
O príncipe torna-se aos poucos o juiz supremo, tanto em matéria civil como
penal, assim, a terceira grande fase do direito romano difere do processo
formular porque centraliza o juízo e introduz a possibilidade de apelação, pois
quando o julgamento se concentra num delegado inferior do imperador, este
pode reanalisar e corrigir o que foi feito pelo seu agente.
A alta idade média
As invasões
O período das invasões e assentamentos dos bárbaros dentro das fronteiras
do império corresponde já ao das tentativas de codificação do tardo-império.
Corresponde também ao de centralização da atividade legislativa no imperador.
Houve uma barbarização crescente e cotidiana, não apenas pelo número de
povos que ocupam o território, como também pelo abandono do patrão
clássico de vida civil. Para não perecer à perseguição pública, vão buscar entre
os bárbaros a humanidade dos romanos, pois não podem suportar mais, entre
os romanos, a desumanidade dos bárbaros, pois gostam mais de viver livres sob
a aparência de escravidão que ser escravizados sob a aparência de liberdade.
Características dos povos bárbaros
Os costumes dos povos bárbaros se assemelham muito de povo para povo,
eles eram povos sedentários em fuga, por causa da fome e das guerras. Por isso,
não contavam com a vida urbana, não tinham as individualidades definidas à
maneira romana. Desse modo o direito romano era encarado como direito
superior, assim como a civilização geral.
Após esse período surge então um primeiro problema a ser superado:
quem deverá viver segunda que lei? Não ocorre de pronto uma fusão de
romanos e bárbaros, eles vivem lado a lado, sem se misturar. Esta separação é
reforçada por proibições de casamentos inter-raciais e também de caráter
religioso.
Com o advento dos reinos bárbaros houve uma progressiva “pessoalidade
das leis”, assim a lei se aplica conforme a etnia, ou seja, em um mesmo
espaço do reino dos francos sobrevivem comunidades de galo- romanos. A
eles se aplica o direito romano, seu direito. Aos francos se aplicava o direito
franco, seus costumes, sua tradição. A igreja por sua vez tenderá a alinhar-se
ao principio da territorialidade, unificando o direito de todos os que aderem a
um rei bárbaro que se converte ao catolicismo
Desse modo com todo o desenvolvimento do direito medieval, sobreviverá
durante séculos a noção da possibilidade da existência simultânea, no mesmo
território, de ordens jurídicas paralelas, aplicáveis a grupos de pessoas
distintas.
As regressões
Houve durante esse período uma regressão no gosto, pois se abandona muito
do que era belo e monumental na civilização do mediterrâneo.
Há também uma regressão demográfica: diminui a população em virtude das
guerras, das pestes.
Há a ocorrência de uma regressão material, evidente abandono dos
monumentos, dos aquedutos, das estradas, dos campos cultivados.
Houve também uma regressão ao paganismo, pois as populações rurais voltam
a crer em espíritos e no encantamento das florestas.