Terras-do-sem-fim-20..

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JORGE AMADO (1912 – 2001)

TERRAS DO SEM-FIM (1943) Enredo Parte 1. O navio > Viagem de Salvador (Bahia) a Ilhéus. Coronéis, prostitutas e trabalhadores

-“Capitão” João Magalhães (pôquer com engenheiro militar) - Antônio Vítor (Ivone) - Juca Badaró (contrata Antônio Vítor) - Margot (prostituta, Juca Badaró interessa-se por ela, que vai para Tabocas por causa de Virgílio) - Um velho, cujo filho Joaquim havia sido enganado (caxixe, dr. Rui) e morto pelo coronel Horácio. Volta para se vingar

> Os interesses dos que ali estavam poderiam ser resumidos nas palavras: terras, dinheiro, cacau, e morte

Parte 2. A mata > Em Tabocas e Ferradas a mata lembra o mundo primitivo

> A mata representa o medo, os ancestrais e os mitos para a maioria dos homens, mas não para Juca Badaró

Mas diante deles, parabélum na mão, o rosto contraído de raiva, está Juca Badaró. Também ele estava ante a mata, também ele viu os raios e ouviu os trovões, escutou o miado das onças e o silvo das cobras. Também seu coração se apertou com o grito agourento do corujão. Também ele sabia que ali moravam as assombrações. Mas Juca Badaró não via na sua frente a mata, o princípio do mundo. Seus olhos estavam cheios de outra visão.

Via aquela terra negra, a melhor terra do mundo para o plantio do cacau.

via na sua frente não mais a mata iluminada pelos raios, cheia de estranhas vozes, enredada de cipós, fechada nas árvores centenárias, habitada de’animais ferozes e assombrações. Via o campo cultivado de cacaueiros, as árvores dos frutos de ouro regularmente plantadas, os cocos maduros, amarelos. Via as roças de cacau se estendendo na terra onde antes fora mata.

DIMENSÃO MÍTICA

X

A MATA Feiticeiro Jeremias Juca e Sinhô Badaró

DIMENSÃO ECONÔMICA E ‘MODERNA’

Horácio da Silveira

DIMENSÃO HUMANA

Ester, mulher de Horácio

Formação (colégio de freiras) Sonhos (amiga Lúcia, Rio de Janeiro, Paris...)

X

Vida naquele mundo ‘bárbaro’

Mas, de súbito, O grito de uma rã assassinada num charco por uma cobra atravessava a mata, as roças, entrava pela casa adentro, era mais alto que o pio das corujas e o rumor das folhas, era mais alto que o vento que assobiava, vinha morrer na sala que a lâmpada de querosene iluminava, estremecia o corpo de Ester. Silenciava a cantiga. Fechava os olhos e via - via nos mínimos detalhes - o réptil que chegava devagar,

Oleoso e repelente, se arrastando em curvas sobre a terra e as folhas caídas, de súbito se jogava em cima de uma rã inocente. (...) Nessas noites ela via as cobras em cada canto da casa, saindo de entre as gretas do tabuado, de entre as telhas, de cada vão de porta. Via de olhos fechados como cada uma ia se arrastando, se aproximando cautelosamente até o pulo fatal sobre as rãs. Tremia sempre que pensava que sobre o telhado podia estar uma delas, sutil e silenciosa, vindo de manso para o leito de jacarandá, talvez para se enroscar no seu pescoço durante o sono. Ou então para penetrar no berço da criança e se enrodilhar sobre ela. Quantas noites passara sem dormir porque repentinamente pensara que uma cobra descia pela parede? Bastava um rumor ouvido no princípio do sono. Era o bastante para enche-la de terror. Levantava-se, arrancava as cobertas, atirava se para a cama do filho.

FAMÍLIA BADARÓ

SINHÔ, pai de Don’Ana. Patriarca da família JUCA, irmão mais novo de Sinhô e casado com OLGA DON’ANA – contraste com Olga e com Ester RAIMUNDA – criada da casa dos Badarós, irmã de leite e afilhada de

Don’Ana e provável filha de Marcelino Badaró (pai de Sinhô e Juca) com a negra Risoleta > Típica representante dos negros na Casa Grande > Antônio Vítor mata um homem para salvar Juca Badaró > Começa a se afeiçoar por Raimunda

DIMENSÃO ECONÔMICA SE SOBREPÕE A TODAS AS DEMAIS

> A fazenda de FIRMO, aliado de Horácio, fica entre a propriedade dos Badarós e a Mata do Sequeiro Grande > Diferença entre Sinhô e Juca Badaró

E engraçado, Juca, tu é meu irmão, tua mãe foi a mesma velha Filomena que me pariu e Deus tenha em sua guarda. Teu pai era o finado Marcelino que era o meu pai também. E nós dois é tão diferente um do outro como pode ser duas pessoas no mundo. Tu gosta de resolver logo tudo com tiros e mortes. Eu queria que tu me dissesse: tu acha bom matar gente? Tu não sente nada? Nada por dentro? Aqui! - e Sinhô Badaró mostrava o lugar do coração.

> Negro Damião ouve essa conversa > autorreflexão nunca vivido por ele. Erra o tiro, irá enlouquecer

HORÁCIO, ESTER e VIRGÍLIO

> Virgílio, novo advogado de Horácio > Jantar na casa de Horácio, junto com seu aliado Maneca Dantas > Ester no piano, Virgílio compreende todo drama dela > Na hora de dormir, Ester e Virgílio só conseguem pensar um no outro > De repente, chega Firmo contando que os Badarós tentaram matá-lo

Horácio então explicou: essa mata do Sequeiro Grande é terra boa pra cacau, a melhor de toda zona. Nunca ninguém entrou nela pra plantar. Só quem vive lá é um maluco, metido a curandeiro. Do lado de cá da mata tou eu com minha propriedade. Já meti o dente na mata por esse lado. Do lado de lá tão os Badarós com a fazenda deles. Eles também já meteram o dente na mata. Mas pouca coisa de um lado e de outro. Essa mata é um fim do mundo, seu doutor, e quem tiver ela é o homem mais rico dessas terras de Ilhéus. Firmo se recompunha do susto. Horácio mandou dois homens pra acompanhá-lo na volta. Precisaria dele como parceiro, pra convencer os menores do entorno a estarem do seu lado: diga que venha tudo almoçar aqui amanhã.

Os homens haviam saído da sala. Virgílio ainda ouviu de Ester, a voz rápida: me leve daqui pra muito longe.

> Negro Damião havia ido correndo procurar o feiticeiro JEREMIAS, que habita o meio da mata

> Um dia, muitos anos antes, quando a floresta cobria muito mais terra, quando se estendia em todas as direções, (...) Jeremias se acoitou naquela mata. Era um negro jovem, fugido da escravidão. Os capitães-do-mato o perseguiam e ele entrou pela floresta Onde moravam os índios e não saiu mais dela. Vinha de um engenho de açúcar onde o senhor mandara chicotear as suas costas escravas. Durante muitos anos tivera tatuada nas espáduas a marca do chicote. Mas mesmo quando ela desapareceu, mesmo quando alguém lhe disse que a abolição dos escravos havia sido decretada, ele não quis sair da mata. Fazia muitos anos que chegara, Jeremias havia perdido a conta do tempo, já tinha perdido também a memória desses acontecimentos. Só não havia perdido a lembrança dos deuses negros que seus antepassados haviam trazido da África e que ele não quisera substituir pelos deuses católicos dos senhores de engenho.

> Jeremias vê a mata destruída e os corpos mortos > Morrendo diz: “- Cada filho vai plantar seu cacaueiro em riba do

sangue do pai.”

Parte 3. Gestação das cidades

> Maria, Lúcia e Violeta – Filhas do homem morto pela febre tifoide nas terras de Teodoro das Baraúnas, aliado dos Badarós > Formação de Ferradas e Tabocas (Itabuna) > Disputa dos coronéis: Badarós procuram em Ilhéus um engenheiro para fazer a medição > Virgílio suborna o escrivão Venâncio dono do cartório de Tabocas (caxixe) > Don’Ana é informada, manda chamar Teodoro das Baraúnas > incêndio no cartório > Dr. Jessé ridicularizado

INSTUTUIÇÕES

POLÍTICA – CORONÉIS IMPRENSA – FINALIDADE POLÍTICA

O Comércio é dos Badarós (Genaro e Manuel de Oliveira) Folha de Ilhéus, de Horácio (Dr. Rui, Filemon Andreia e Virgílio)

MEDICINA – LIGAÇÃO COM A POLÍTICA

Dr. Pedro (Badaró), Dr. Jessé (Horácio)

JUSTIÇA – CAXIXE POLÍCIA – SEU LIMITE É IMPOSTO PELOS CORONÉIS INSTITUIÇÃO: MODERNA REALIZAÇÃO: ARCAICA

Parte 4. O mar

> São Jorge do Ilhéus

Na cidade todos se misturavam, o pobre de hoje podia ser o rico de amanhã, o tropeiro de agora poderia ter amanhã uma grande fazenda de cacau, o trabalhador que não sabia ler poderia ser um dia chefe político respeitado. Citavam-se exemplos e citava-se sempre Horácio, que começara tropeiro e agora era dos maiores fazendeiros da zona. E o rico de hoje poderia ser o pobre de amanhã se um mais rico, junto com um advogado, fizesse um “caxixe” bem feito e tomasse sua terra. E todos os vivos de hoje poderiam amanhã estar mortos na rua, com uma bala no peito.

Por cima da justiça. do juiz e do promotor, do júri de cidadãos, estava a lei do gatilho, última instância da justiça de Ilhéus.

> Virgílio tinha um caso com Margot desde o tempo da faculdade > A cidade fofocava sobre ele e Ester > Juca contrata o “capitão” e “engenheiro militar” João Magalhães para fazer a medição do Sequeiro Grande

- Bem, já que vou fazer o favor, faço completo. Está certo.

- Vou lhe ficar devendo a vida toda, capitão. Eu e meu irmão. O senhor pode contar com a gente pro que quiser..

Antes de se despedir perguntou: - Quer receber agora mesmo ? Se quer, vamos até em casa...

- Ora, por quem me toma.. Quando o senhor quiser pagar... Não há pressa...

- Então podíamos nos encontrar hoje à noite. . .

-O senhor joga pôquer? (...) -- Tá certo - disse Juca. - Lhe levo o dinheiro lá...

E depois vou ganhar ele no jogo e fica de graça a medição. .

João Magalhães pilheriou também: - Eu é que vou ganhar mais dez pacotes e cobrar os vinte que queria... Venha forrado, seu Juca Badaró...

> Virgílio e Margot brigam, ele vai embora, João Magalhães aproxima a prostituta e Juca Badaró > Durante as medições de Sequeiro Grande, João Magalhães se apaixona por Don’Ana

Fora para passar oito dias, levara quinze, demorando-se na fazenda dos Badarós mesmo depois de terminado o serviço. Se arranjara de qualquer maneira com os instrumentos do agrónomo - com o teodolito, a trena, o oniometro, a baliza - instrumentos que ele nunca havia visto antes na sua vida de jogador de profissão. O cálculo real da medição das terras se devia muito mais aos trabalhadores que o haviam acompanhado e a Juca Badaró do que a ele, que só fizera apoiar tudo que os outros afirmavam, rabiscando cálculos sobre quadrados e triângulos. Haviam passado dois dias na mata, os negros carregando os instrumentos, Juca a acompanhá-lo exibindo seu conhecimento da terra.

Porém mais que a bondade das terras de Sequeiro Grande, interessara ao Capitão a figura morena de Don’Ana Badaró. Já em Ilhéus ele ouvira falar nela, diziam que fora Don’Ana quem dera ordens a Teodoro para que incendiasse o cartório de Venâncio. Em Ilhéus se falava de Don’Ana como de uma moça estranha pouco chegada ás conversas das comadres, pouco amiga das festas da Igreja (apesar da mãe tão religiosa), pouco amiga de bailes e namorados. Raras pessoas se lembravam de havê-la visto dançando e nenhuma delas saberia respeitar o nome de um namorado seu. Vivera sempre mais interessada em aprender a montar a cavalo, a atirar, a saber dos mistérios da terra e das plantações. Olga comentava com as vizinhas o desprezo com que Don’Ana tratava os vestidos que Sinhô mandava buscar na Bahia ou no Rio, vestidos caros realizados por costureiros de fama. Don’Ana não se preocupava com eles, queria era saber dos potros novos que haviam nascido na fazenda. Sabia o nome de todos os animais que a família possuía, mesmo dos burros de carga. Tomara a si a contabilidade dos negócios dos Badarós e era a ela que Sinhô se dirigia cada vez que necessitava de uma informação. A esposa de Juca dizia sempre que “Don’Ana devia ter nascido homem”.

> Procissão na festa de São Jorge > Sinhô e Horácio lado a lado

Parte 5. A Luta

> Tocaia para Sinhô Badaró > Juca Badaró incendeia a plantação de Firmo > Confronto sangrento do grupo de Juca com o de Braz, aliado de Horácio > Virgílio costumava passar a noite com Ester > Horácio em Ilhéus, Virgílio vai ao cabaré > Margot e Juca > Horácio pressiona Virgílio a mandar matar Juca > Virgílio com Ester na cama, tormentos por ter mandado matar um homem > Mais uma vez, Antônio Vítor salva Juca > Capitão Magalhães irá se casar com Don’Ana > Antônio Vítor, com Raimunda

> Horácio pega a febre tifoide, se recupera > Ester pega a mesma doença, morre > Virgílio vai procurar Margot > Juca é morto > Virada política: Horácio está na situação > Badarós incendeiam plantações de cacau dos rivais > Horácio paga na mesma moeda > Cerco à casa dos Badarós > Sinhô é levado embora ferido

> Teodoro das Baraúnas foge > Antônio Vítor e João Magalhães também > Don’Ana é quem mais resiste > Horácio absolvido por unanimidade

Um menino, anos depois, escreveria a história dessa terra. Este, no tribunal onde todos depois estavam e respondiam processo, tirava um papel por vez com o nome de quem seria julgado. Horácio e seus compadres foram absolvidos. O menino assistia a tudo, com os olhos vidrados.

Parte 6. Progresso

> Meses depois, Horácio descobre cartas de Ester em que fica revelado o caso dela com Virgílio > Manda matá-lo > Primeiro bispo da cidade > progresso > Sinhô, Don’Ana e João Magalhães > Maneca Dantas prefeito de Ilhúes > Tabocas - Itabuna

Cinco anos demoravam os cacaueiros a dar os primeiros frutos. Mas aqueles que foram plantados sobre a terra de Sequeiro Grande enfloraram no fim do terceiro ano e produziram no quarto. Mesmo os agrônomos que haviam estudado, mesmo os mais velhos fazendeiros que entendiam de cacau como ninguém, se espantavam do tamanho dos cocos produzidos, tão precocemente, naquelas roças. A melhor terra do mundo para o cacau, terra adubada com sangue.

Comentários

> Amplo painel social, não restrito a apenas uma classe > Constante interação entre as classes > Possibilidade de transição. Demonstração disso: Cel. Horácio foi tropeiro de burros > Organização social se dá em torno das famílias, cada uma com sua lei e sua religião > Influência de Gilberto Freire: miscigenação, força da organização familiar e sincretismo religioso > Resgate da cultura africana e indígena (Jeremias) > Processos de desenvolvimento e modernização capitalista do mundo rural > República Velha no país (1889-1930): coronealismo, moral particular, valentia, violência, vingança e patriarcalismo

> Presença do cancioneiro popular (já na epígrafe) Homem macho era Sinhô O chefe dos Badaró...

Uma vez, ele ia só, com cinco homem acabou.

Juca não era menos, coragem nele sobrava, E Juca não respeitava Nem os grandes nem os pequenos.