Moeda: origens e funções

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Transcript Moeda: origens e funções

Moeda & Padrões Monetários
Prof. Fernando Carlos G C Lima
Funções da moeda
Meio de troca
 “Moeda real”
 Meio de troca X meio de pagamento
Reserva de valor
 Entesouramento X preferência pela liquidez
Unidade de conta
 Moeda de conta X “moeda imaginária”
“Metalistas” (neo-clássicos)




Principal função da moeda: meio de troca
Origem: a moeda é criatura do mercado
Aumento da complexidade das operações de
escambo
Uma mercadoria é selecionada pelo mercado
para intermediar as trocas (Menger: ouro &
saleability)
Uso de moeda reduz os custos de transação
(& custos de informação)
Papel do Estado: “selo de garantia”
Moeda-mercadoria
• Características intrínsecas da mercadoria “moeda”:
divisibilidade, durabilidade, relação valor/peso... (v.
Jevons)
• Eventualmente, as mercadorias escolhidas foram
ouro, prata e cobre  moeda metálica
Folclore?
 Pecuniário: gado como moeda e a questão do
troco
 Salário: sal (açúcar? algodão? tabaco?) como
moeda e a questão da reserva de valor
“Cartalistas” (Knapp, Keynes)
Principais funções da moeda: unidade de conta e meio
de pagamento
Origem: a moeda é criatura do Estado
Antropólogos & arqueólogos  a moeda antecede o
mercado
 escambo facilitado pela criação da unidade de conta
Ex.: colônias inglesas na África: moeda emitida para
cobrar impostos
Alexander Prestige (1707): “a moeda em geral
poder ser classificada como real e imaginária”
Reforma monetária de Carlos Magno (795)
Sistema monetário europeu (até final do século XVIII; em
Portugal, até 1435; na Inglaterra, até 1971)
Denarius (dinheiro, penny) = única moeda de prata
cunhada em todo o Império (pesava 1,9 gr., dos
quais 1,7 era prata)
Solidus (soldo, shilling) = 12 denari. Equivalia, em prata, a
uma antiga moeda de ouro chamada solidus
Libra (libra, pound) = 240 denarii ou 20 solidi (equivalia a
409 gr. de prata pura)  obviamente, jamais foi
cunhada porque pesaria quase meio quilo...
Desvalorização da moeda
Desvalorização da moeda (unidade de conta) em
relação ao metal (prata e/ou ouro)
 Redução do conteúdo metálico da unidade de
conta (i.e., do poder de compra da moeda)
 A partir de meados do século XIII começou a
cunhagem de moedas de ouro e de grandes
moedas de prata porque as moedas de prata
(denarii) já não serviam para as transações
internacionais
Métodos de desvalorização
Enfraquecimento (debasement)
- Redução do peso da moeda
- Aumento da liga
 Redução do conteúdo intrínseco e manutenção do
valor extrínseco (mais usado com moedas de prata)
Levantamento da moeda (crying up)
Aumento (por decreto) do valor oficial sem alterar o
valor intrínseco (usado com moedas de
ouro)
Desvalorizações: causas
Para compensar desgaste, cerceio e falsificação
Atrair metais para a Casa da Moeda para:
- aumentar os ganhos de senhoriagem
- aumentar a oferta de moeda (UC) para compensar o
aumento da demanda por moeda
 Guerras monetárias (hoje, guerra cambial...)
Reduzir dívidas em termos reais (metálicos)
 Conflitos distributivos
Desvalorizações: consequências
Inflação
- aumento dos preços (em UC) dos produtos
importados
- aumento da oferta de moeda  monetaristas
(Espanha no século XVII?)
Confusão: aumento dos custos de transação
Moedas novas eram entesouradas (lei de
Gresham)
Bimetalismo: características
Regime (padrão) monetário baseado em dois metais (ouro
& prata)
 Padrão metálico: necessidade de moedas de
valores distintos (& moedas de troco, cujo valor
intrínseco independe do valor extrínseco)
- O valor UC dos dois metais é fixado pelo governo
- Curso forçado: moedas circulam de acordo com seu valor
de face (em tese, = ao valor intrínseco)
- Livre cunhagem
 valor nominal da moeda = valor pago ao possuidor do
metal + custo de brassagem + custo de
senhoriagem
Bimetalismo & lei de Gresham
Lei de Gresham: “a moeda má expulsa de circulação a
moeda boa” (expulsar a moeda boa = exportar,
entesourar, derreter...)
Mundell: “a moeda sobrevalorizada (oficialmente)
expulsa de circulação a moeda subvalorizada
oficialmente”
Ex.: moeda cerceada X moeda nova, quando ambas
têm o mesmo valor nominal
Ex.: valor legal X valor de mercado do ouro e da prata
 Operações de arbitragem Europa X Ásia (séc. XVII)
 Guerras monetárias (guerras cambiais...)
Padrão-ouro: características
Preço do ouro fixado em UC
 taxa de câmbio fixa
 notas bancárias conversíveis àquela taxa
(mas a emissão de notas não precisava ser
centralizada: UK X US)
Pressupostos:
livre comércio
Livre movimentação de capitais
Teorias: TQM & mecanismo do ajuste automático
Padrão-ouro: mecanismo de ajuste
automático (Hume)
Ajuste pela balança comercial
X > M  entrada de ouro
↑ $  bancos emitem notas conversíveis
↑ P  TQM: preços aumentam
↓ X  diminui a competitividade das X
↑ M  preços externos mais baixos
M>X
Na margem, o BP estará sempre em equilíbrio
Padrão-ouro: mecanismo de ajuste
automático (II)
Ajuste pela conta de capital
M > X  ↓ $  ↑ taxa de juros  ↑ K
“regra do jogo”: o BC eleva a taxa de
redesconto quando ao BP é deficitário para
mostrar “comprometimento” com o PO
Saudades (& mitos) do PO
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Regra (versus política discricionária)
Estabilidade de preços
Estabilidade financeira (moeda lastreada)
Estabilidade econômica (fim das crises)
Liberalismo econômico: não intervenção
produz equilíbrio
• Ouro era moeda de rico
Mentalité (I)
Mentalité = maneira de pensar as questões sociais
A mentalité determinava a noção do que seria uma política
econômica possível e desejável
Esta mentalidade PO = construção intelectual desenvolvida
para lidar com um mundo que não mais existia e
 foi mantida por determinadas forças sociais e
políticas [1%] que adotaram medidas que acabaram
sendo responsáveis por uma catástrofe econômica
Mentalité (II)
Mentalidade PO  quando ocorriam déficits no BP e
perda de ouro os governos deflacionavam a
economia para reduzir preços e salários.
 Uma questão crítica eram os salários, que eram o
principal componente do custo de produção
 Mas as mudanças na estrutura do mercado de
trabalho (sindicatos, burocratização) reduziram
muito a flexibilidade dos salários
“Mentalidade”, segundo Keynes (I)
“O morador de Londres podia pedir, por telefone e
tomando seu chá matinal na cama, qualquer
produto à venda no mundo, na quantidade de
desejasse, e acreditar que logo fosse entregue na
sua casa. Ele também poderia, nesse mesmo
momento e usando o mesmo método, aventurar
sua fortuna em riquezas naturais e novos
empreendimentos em qualquer parte do mundo e
usufruir, sem pressões ou trabalho, dos seus
futuros frutos e vantagens;
“Mentalidade”, segundo Keynes (II)
“Ou poderia decidir diversificar a segurança de
sua fortuna com a confiança dos cidadãos
de qualquer municipalidade de qualquer
continente que a imaginação ou a
informação pudesse recomendar.
“Mentalidade”, segundo Keynes (III)
“Poderia garantir, sem demora, meios baratos e
confortáveis para transitar em qualquer país ou clima
sem passaporte ou outra formalidade, mandando
seu empregado para a agência bancária mais
próxima para sacar metais preciosos como achasse
conveniente, e então viajar para outro país sem
precisar conhecer sua língua, sua religião ou
costumes e se consideraria ofendido e muito
surpreso se ocorresse qualquer contratempo.
“Mentalidade”, segundo Keynes (IV)
“Mas, acima de tudo, ele encarava este estado
de coisas como normal, certo e
permanente, a não ser no sentido de que
as coisas poderiam ser ainda melhores no
futuro; qualquer desvio seria aberrante,
escandaloso, e evitável”
Keynes, JM. How to pay for the war, 1919
Discourse (I)
Discourse: retórica no debate sobre política econômica
e particularmente a retórica do PO
 Este discurso ajudou a formar e a sustentar a
mentalidade PO
As virtudes vitorianas (poupança, confiança,
estabilidade...) eram ritualmente invocadas
como atributos de um sistema monetário
virtuoso
 Ouro = moral, princípio, civilização
 Moeda administrada: imoral...
Discourse (II)
• PO era mantido através de políticas deflacionárias
• A retórica do PO era pelo corte de salários
 Apenas os “especuladores” discordavam
 Tal retórica deslegitimava os argumentos daqueles
que ousassem questionar os méritos da
conversibilidade do ouro
PO & crises de 1914 e 1929
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Crise de 1913-4 (1ª GM): abandono do PO
Corrida ao Banco da Inglaterra
1913-4: criação e início das operações do FED
Anos 1920: Padrão ouro-divisas
Crise de 1929: corrida ao Banco da Inglaterra
Inglaterra abandona o PO, seguida pelos EUA
(1934) e França (1936)
 Desde então: padrão monetário de moeda
fiduciária
Padrão-ouro no Brasil
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Primeiro Banco do Brasil (1809-29): conversibilidade?
1906-14: Caixa de Conversão
1926-30: Caixa de Estabilização
Emitiam notas conversíveis; mas também circulavam
notas emitidas pelo TN
• Reservas (lastro) eram formadas por libras esterlinas
• Antes de ter seu valor fixado, o mil-réis foi
desvalorizado em 1906, 1910 e 1926
• Notas conversíveis foram rapidamente
convertidas em libras em 1914 e 1929-30