HRI 2014 – Matéria até 7 de abril

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História das Relações
Internacionais
Gilberto Maringoni
UFABC – 1º. Semestre 2014
10 de março a 30 de maio
1. Apresentação do curso, do
programa e da metodologia
• Ementa
• Examinar a historia das Relações Internacionais
(RI) a partir do desenvolvimento das relações
políticas e econômicas entre os diferentes povos
e continentes. Análise da formação do sistema
mundial, dos impérios coloniais mercantilistas e
dos sucessivos ciclos de hegemonia vinculados
à expansão européia. Formação e
desenvolvimento da diplomacia.
• A construção das Relações
Internacionais na Idade Moderna
confunde-se com a história da
formação dos Estados nacionais
europeus e da difusão do modo de
produção capitalista em escala
global. A partir das expedições
ultramarinas, lideradas inicialmente
por Portugal e Espanha, a Europa
tornou-se universal.
• O sociólogo mexicano Enrique Dussel[1]
assinala, no ensaio Europa, modernidade
e eurocentrismo que, empiricamente,
“nunca houve uma historia mundial até
1492 – data de início da operação do
‘Sistema-mundo’. Antes dessa data, os
impérios ou sistemas culturais coexistiam
entre si. Apenas com a expansão
portuguesa (...) todo o planeta se torna o
‘lugar’ de uma só ‘História mundial’”.
•
[1] DUSSEL, Enrique.”Europa, modernidade e eurocentrismo”, in A
colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas
latino-americanas. Edgardo Lander (org). Colección Sur Sur, CLACSO,
Buenos Aires, Argentina, 2005. pgs.55-70
• O foco principal do curso é tratar o
desenvolvimento das RI como
caudatário da dinâmica de formação
dos Estados nacionais e do
desenvolvimento do capitalismo.
Assim, as esferas da política, da
economia – finanças, investimento,
comércio e circulação de capitais -,
da sociedade e da cultura serão
examinadas a partir de sua
articulação com aqueles processos.
Sobre a escolha do Estado como tema central do
curso, vai aqui uma observação de Perry
Anderson, em Linhagens do Estado absolutista:
• “Hoje, quando a “Historia a partir de baixo”
tornou-se reconhecida tanto em círculos
marxistas como não-marxistas e produziu já
importantes benefícios para nossa
compreensão do passado, é apesar de tudo
necessário relembrar um dos axiomas básicos
do materialismo histórico: que a luta secular
entre as classes resolve-se em última instância
no nível político da sociedade – e não no plano
econômico ou cultural. Em outras palavras, é a
construção ou destruição dos Estados que sela
as modificações básicas nas relações de
produção, enquanto subsistirem as classes”.
Carl Polanyi,
A grande transformação:
• “A ação deliberada do Estado nos séculos XV e
XVI impingiu o sistema mercantil às cidades e
municipalidades ferrenhamente protecionistas.
O mercantilismo destruiu o particularismo
desgastado do comércio local e intermunicipal,
eliminando as barreiras que separavam esses
dois tipos de comércio não-competitivo e, assim,
abrindo caminho para o mercado nacional que
passou a ignorar, cada vez mais, a distinção
entre cidade e campo, assim como as que
existiam entre as várias cidades e províncias”.
Luiz Augusto Estrella Faria (UFRGS)
Capitalismo, espaço e tempo:
• A relação mercantil na história
humana apresentou sempre uma
dimensão espacial.
• De seus primórdios, o ato da troca
resultou do encontro de homens que
vinham de lugares diferentes e
proporcionou-lhes a possibilidade de ter
acesso a valores de uso produzidos além
de seu espaço econômico próprio.
• Nesse sentido, a troca foi sempre uma
ampliação do espaço econômico, cuja
dimensão possível esteve sempre
condicionada pelo desenvolvimento
dos meios de transporte e
comunicação.
• Antes do advento do capitalismo,
entretanto, o espaço da troca era dado
pelos processos de deslocamento e
pela expansão territorial das
sociedades.
• A ampliação do espaço estava, então,
sujeita a uma lógica de acumulação de
poder proporcionada pela conquista de
mais território, como mostra Giovanni
Arrighi.
• A própria noção de geografia econômica
não fazia sentido mais que descritivo do
espaço das atividades produtivas, pois os
limites geográficos eram as fronteiras do
poder político, e a expansão econômica —
a acumulação de riquezas — surgia como
resultante da expansão territorial.
• O capitalismo modifica
essa situação; sob sua
égide, a ampliação do
espaço vai ser resultado
do desenvolvimento do
mercado, de seu
crescimento.
• No volume de sua obra
intitulado O Tempo do
Mundo, Fernand Braudel
traça um percurso da relação
entre o desenvolvimento das
relações mercantis e a
diferenciação dos espaços
econômicos.
• No livro, ele mostra como o
espaço vai-se ampliando na
medida em que os mercados
locais vão desaparecendo,
fundindo-se na formação do
mercado capitalista.
• Fernand Braudel também mostra
o papel da evolução dos meios
de transporte e comunicação
nesse processo.
• Desse passo, nasce o mercado
capitalista, e uma nova dimensão
de espaço econômico é
constituída.
• O desdobramento dessa
ampliação do espaço resulta de
uma dialética de unidade e
contradição entre o Estado, de
um lado, o lugar do poder, e a
zona urbana, de outro, o lugar da
riqueza.
• Num primeiro momento, surgem em
lugares diferentes, pois, nos séculos
XV e XVI, quando nascem os
primeiros Estados modernos
(Portugal, Espanha, Inglaterra,
França, Escandinávia), as zonas
urbanas, onde se concentra a
acumulação da riqueza, estão no eixo
Itália-Alemanha, que só vai
presenciar a formação de Estados
nacionais muito tardiamente.
• "Será necessário o novo
impulso econômico do
século XVIII para que o
ferrolho se solte e a
economia se ponha sob o
controle dos Estados e dos
mercados nacionais",
aponta Fernand Braudel.
• O encontro desses dois lugares
forma uma díade em que as cidades
são submetidas ao poder central do
Estado.
• Ao longo dos séculos seguintes, o
advento das democracias
representativas e dos padrões de
política de governo liberais faz a
balança de poder voltar a pender
para o lado dos donos da riqueza.
• Ou seja, é através da criação de
um espaço público de disputas
políticas – o Estado – que o
sistema interestatal, próprio das
Relações Internacionais, pode
surgir. É esta a pedra angular de
nosso curso, sem deixar de lado
outras esferas dessa dinâmica.
Programa
1. Apresentação do curso, do programa e da
metodologia;
2. Primeiros Estados nacionais europeus. A onda dos
descobrimentos;
3. 1648-1789: Paz de Westfalia e conceito de soberania;
4. A Revolução Francesa e a Época Napoleônica;
5. 1815-1848 - Restauração e revolução;
6. O século britânico: indústria, armada e comércio;
7. Os nacionalismos europeus e a Era dos Impérios. A
“questão oriental”;
8. I Guerra Mundial, Revolução Russa e crise sistêmica;
9. Saídas da crise e a II Guerra. Hegemonia dos EUA;
10. A descolonização e a emergência do 3º. Mundo.
ONU, organismos multilaterais, bipolarização e
Guerra Fria;
Programa por aula
•
10 de março: Apresentação do curso, do programa e da metodologia;
•
14 de março: Primeiros Estados nacionais europeus. A onda dos
descobrimentos;
FIORI, José Luís, No princípio era Portugal
(http://www.cartamaior.com.br/?/Coluna/No-principio-era-Portugal/26869 )
SILVA FILHO, Constituição, estrutura e atuação dos poderes locais na
comarca de Vila Rica, págs. 29 a 48
(file:///C:/Documents%20and%20Settings/Gilberto.GILBERTOD05DB0/Meus%20documentos/Downloads/GERALDO_SILVA_FILHO.pdf )
•
•
17 de março: 1648-1789: A Paz de Westfalia e o conceito de soberania;
ARRIGHI, Giovanni, O Longo século XX, Contraponto/ Editora UNESP, Rio
de janeiro/ São Paulo, 1996, pags. 27 a 46
KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes potências, Editora
Campus, Rio de Janeiro, 1989, pags. 39 a 82
BREMER, Juan José, Tiempos de guerra y paz, Editorial Taurus, Cidade do
México, 2012, págs. 23 a 33
http://www.editorialtaurus.com/uploads/ficheros/libro/primeraspaginas/201201/primeras-paginas-tiempos-guerra-paz.pdf
RODRIGUES, Alessandra, CARVALHO, David, DINIZ, Luciano, Uma
abordagem sobre a compreensão da soberania no decurso da história
http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/bh/alessandra_mahe_cos
ta_rodrigues.pdf
•
•
24 de março : A Revolução Francesa e a Época Napoleônica;
HOBSBAWM, Eric J., A era das revoluções, Editora Paz e Terra, São
Paulo, 1977, pags. 23 a 116 (Caps. 1 a 4)
KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes potências, Editora
Campus, Rio de Janeiro, 1989, pags. 119 a 140
ANDERSON, Perry, Internacionalismo, um breviário, Anos 90, Porto
Alegre, 2005, p.13-42
•
28 de março : 1815-1848 - Restauração e revolução;
KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes potências, Editora
Campus, Rio de Janeiro, 1989, pags. 143 a 189
HOBSBAWM, Eric J., A era das revoluções, Editora Paz e Terra, São
Paulo, 1977, pags. 321 a 332
HOBSBAWM, Eric J., A era do capital, Editora Paz e Terra, São Paulo,
1982, pags. 21 a 46
•
31 de março e 4 de abril: O século britânico: indústria, armada e
comércio;
POLANYI, Karl, A grande transformação, Editora Campus, Rio de
Janeiro, 2000, pags. 15 a 35
HOBSBAWM, Eric J., A era do capital, Editora Paz e Terra, São Paulo,
1982, pags. 49 a 86
•
•
7 de abril: Os nacionalismos europeus e a Era dos
Impérios. A “questão oriental”;
HOBSBAWM, Eric J., A era do capital, Editora Paz e
Terra, São Paulo, 1982, pags. 101 a 134 (Caps. 5 e 6)
HOBSBAWM, Eric J., A era dos impérios, 1875-1914,
Editora Paz e Terra, São Paulo, 2003, págs. 87 a 124
e 203 a 232
ANDERSON, Perry, Internationalism, a breviary, New
Left Review, Londres, março/abril de 2002
(http://newleftreview.org/II/14/perry-andersoninternationalism-a-breviary)
•
11 de abril - PROVA
•
14 de abril: Os nacionalismos europeus e a Era
dos Impérios. A “questão oriental” (Parte II);
•
•
25 de abril: I Guerra Mundial e Revolução Russa
POLANYI, Karl, A grande transformação, Editora
Campus, Rio de Janeiro, 2000, pags. 36 a 47
HOBSBAWM, Eric J., A era dos extremos, Companhia
das Letras, São Paulo, 1996, pags. 29 a 89
•
28 de abril – Devolução das provas/ Crise
sistêmica
PARKER, Selwyn, O crash de 1929, Editora Globo,
São Paulo, 2009, pags. 21 a 52 5 e 9 de maio:
Saídas da crise e a II Guerra Mundial. Hegemonia
dos EUA;
HOBSBAWM, Eric J., A era dos extremos, Companhia
das Letras, São Paulo, 1996, pags. 223 a 252 e 253 a
281
KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes
potências, Editora Campus, Rio de Janeiro, 1989,
pags. 331 a 356
•
• 12 e 16 de maio: A descolonização e a
emergência do 3º. Mundo. ONU,
organismos multilaterais,;
ARRIGHI, Giovanni, O Longo século XX,
Contraponto/ Editora UNESP, Rio de
janeiro/ São Paulo, 1996, pags. 247 a 334
KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das
grandes potências, Editora Campus, Rio
de Janeiro, 1989, pags. 356 a 415
•
19 de maio: A Guerra Fria e o mundo bipolar;
ARRIGHI, Giovanni, O Longo século XX, Contraponto/
Editora UNESP, Rio de janeiro/ São Paulo, 1996,
pags. 337 a 371
HOBSBAWM, Eric J., A era dos extremos, Companhia
das Letras, São Paulo, 1996, pags. 537 a 562
HOBSBAWM, Eric, “Porque a hegemonia dos EUA
difere da do Império britânico”, in Globalização,
democracia e terrorismo, Companhia das Letras, São
Paulo, 2008, págs. 54 a 86
•
•
23 de maio: PROVA
•
30 de maio: Devolução e debate sobre as provas/
Avaliação da disciplina
26 de maio: Exibição do filme ‘Dr. Fantástico’ (Stanley
Kubrick)
• Metodologia
• Aulas expositivas, discussão de textos e pesquisas
bibliográficas.
• Avaliação
• Duas provas dissertativas/ Lista de presença
• Horário das aulas
• BH1335 - História das Relações Internacionais
A- Matutino (São Bernardo) – Segunda-feira das 10:00
às 12:00, sala A2-S111-SB, semanal - Sexta-feira das
08:00 às 10:00, sala A2-S111-SB, semanal
• BH1335 - História das Relações Internacionais
A- Noturno (São Bernardo) - Segunda-feira das 21:00
às 23:00, sala A1-S103-SB, semanal - Sexta-feira das
19:00 às 21:00, sala A1-S103-SB, semanal
•
42 horas/aula
Bibliografia básica:
• KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das
grandes potências, Editora Campus, Rio de
Janeiro, 1989
• LESSA, Antonio Carlos, História das relações
internacionais – a Pax Britannica e o mundo do
século XIX, Editora Vozes, Petrópolis, 2005
• WATSON, Adam, A evolução da sociedade
internacional: Uma análise histórica
comparativa, Editora Universidade de Brasília,
Brasília, 2004
Bibliografia complementar
•
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•
ANDERSON
, Perry, Linhagens do Estado absolutista, Editora Brasiliense, São Paulo, 2004
ARRIGHI, Giovanni, O Longo século XX, Contraponto/ Editora UNESP, Rio de janeiro/ São Paulo, 1996
BOBBIO, Norberto et alli, Dicionário de política, LGE Editora/ Editora UNB, Brasília, 2004
(http://bibliotecasolidaria.blogspot.com.br/2009/11/diccionario-de-politica-de-norberto.html)
FIORI, José Luís, O poder global, Boitempo Editorial, São Paulo, 2007
HOBSBAWM, Eric J., A era das revoluções, Editora Paz e Terra, São Paulo, 1977
__________________, A era do capital, Editora Paz e Terra, São Paulo, 1982
__________________, A era dos impérios, 1875-1914, Editora Paz e Terra, São Paulo, 2003
__________________, A era dos extremos, Companhia das Letras, São Paulo, 1996
__________________, Nações e nacionalismo desde 1780, Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1990
KRIPPENDORF, Ekkehart, História das relações internacionais, Antídoto, Lisboa, 1979
LYRIO, Maurício Carvalho, Ascensão da China como potência: Fundamentos políticos internos, Fundação
Alexandre Gusmão, Brasília, 2010
(http://www.funag.gov.br/biblioteca/index.php?option=com_docman&task=search_result&Itemid=41)
NOVAIS, Fernando, Estrutura e dinâmica do antigo sistema colonial, Editora Brasiliense, 1993
PARKER, Selwyn, O crash de 1929, Editora Globo, São Paulo, 2009
PECEQUILO, Cristina, A política externa dos Estados Unidos, EdUFRGS, Porto Alegre, 2003
POLANYI, Karl, A grande transformação, Editora Campus, Rio de Janeiro, 2000
SARAIVA, José Flávio Sombra (org.), História das Relações Internacionais Contemporâneas – da sociedade
internacional do século XIX à era da globalização, Editora Saraiva. São Paulo, 2007
(http://books.google.com.br/books?id=DKewvkeGn_gC&printsec=frontcover&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#
v=onepage&q&f=false)
SIGRILLO, Ângelo, O fim da URSS e a nova Rússia - De Gorbachev ao pós-Yeltsin, Editora Vozes, Petrópolis,
2000
SOUSA, Fernando, Dicionário de relações internacionais, Edições Afrontamento, Porto, 2005
(http://www.aeflup.com/ficheiros/Dicionario%20de%20Relacoes%20Internacionais.pdf)
Artigos
• ANDERSON, Perry, Nation-States and National Identity
(http://www.lrb.co.uk/v13/n09/perry-anderson/nationstates-and-national-identity)
• ________________, Internationalism, a breviary
(http://newleftreview.org/II/14/perry-andersoninternationalism-a-breviary)
• FIORI, José Luís, No princípio era Portugal
(http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.
cfm?coluna_id=5787)
• Faria, Luiz Augusto Estrella, Capitalismo, espaço e
tempo
(http://revistas.fee.tche.br/index.php/ensaios/article/view
File/1946/2322)
2. Primeiros Estados nacionais
europeus. A onda dos descobrimentos
• No princípio era Portugal
• José Luís Fiori
• O sistema mundial em que vivemos –
interestatal e capitalista - surgiu na
Europa, e só na Europa, entre 1150 e
1450, de um longo conflito sistêmico entre
“feudos” e “centros imperiais” de poder,
que conseguiram transformar suas
“economias naturais” em economias
capitalistas mais poderosas do que a dos
seus rivais.
• Neste período, a
Península Ibérica
cumpriu um papel
decisivo, na formação do
próprio sistema e no
início da sua expansão
para fora da Europa.
• Os reinos de Castela, Leon e Aragão, que
se transformaram no núcleo político do
Império Habsburgo, que dominou a
Europa, durante o século XVI, sob a
batuta de Carlos V e Felipe II.
• Mas antes dos espanhóis, foi o reino de
Portugal que se estruturou primeiro,
como estado nacional, e foi ele também
que liderou o primeiro século da expansão
mundial da Europa, depois da sua
conquista de Ceuta, em 1415.
• Ceuta, hoje um enclave espanhol no Marrocos, na entrada do
estreito de Gibraltar, era ponto estratégico na passagem do
Atlântico para o mar Mediterrâneo.
• Portugal nasceu de um
pequeno “feudo” - situado
entre os rios Minho e Douro que se rebelou contra Leon e
Castela, em 1143, e depois
travou uma guerra expansiva
de mais de dois séculos, em
duas frentes: contra os
muçulmanos, ao sul, e contra
os espanhóis, ao leste.
•
• Foi neste período de guerra quase
contínua com os “mouros” e os
“castelhanos” que se formou o estado
português, depois da “reconquista” de
Lisboa, em 1147, e da expulsão definitiva
dos árabes, do Algarve, em 1249; e
depois da assinatura do Tratado de Paz,
de 1432, referendando a separação e o
reconhecimento mútuo entre Portugal e
Castela, algumas décadas após a
Revolução de Avis, de 1385.
• Mas foi só no século
seguinte à expulsão
mulçumana de 1249, que
Portugal criou as estruturas
legais, tributárias e
administrativas do seu
estado moderno.
• V. pags. 41/43
• O mesmo Estado que seguiu se
expandindo, durante mais um século e
meio, depois da paz com os castelhanos,
até construir o primeiro grande império
marítimo da história moderna.
• O impulso inicial desta expansão “para
fora” não parece ter tido um objetivo nem
um sucesso mercantil imediato, e só
promoveu a ocupação e a colonização
dos territórios conquistados, depois de
1450, na Ilha da Madeira.
• Além disto, o empreendimento português
contou com ajuda externa, mas se
financiou sobretudo através da
capacidade tributária do novo estado, e da
riqueza de suas Ordens Militares
religiosas – em particular, os Templários,
sucedidos pela Ordem de Cristo, depois
do seu fechamento em 1312 – que
forjaram em conjunto uma verdadeira
máquina de guerra, conquista e
tributação.
• Na altura de 1147, a economia
portuguesa era local, e o seu
comércio era feito em espécie.
• Mas depois de 1249, houve um
aumento constante da circulação
nacional de mercadorias, a partir da
reforma monetária e do tabelamento
de preços, promovido por D. Afonso
III, na década de 1250.
• Em 1293, D. Diniz criou a primeira Bolsa de
Mercadorias do país, com um sistema de
seguros para os navios e cargas portuguesas, e
durante toda a segunda metade do século XIII,
foram criadas mais de 40 feiras comerciais,
responsáveis pela ativação de um incipiente
mercado nacional.
• Até o século XVI, o Estado português foi o
maior proprietário de terras do país, e atuou
como uma espécie de “banco de
financiamento” das atividades econômicas
públicas e privadas.
• Foi só em 1500, que o governo
português conseguiu criar o seu
sistema de títulos da divida
pública consolidada, e só foi
depois de 1540 que esta espécie
primitiva de “capitalismo de
Estado” foi cedendo lugar ao
desenvolvimento de um
capitalismo privado de grandes
companhias mercantis.
• Entretanto, este processo foi
interrompido em 1580, pela
incorporação de Portugal pelo
império espanhol de Felipe II, e
depois, pela submissão
diplomática, financeira e
comercial definitiva de Portugal, à
Holanda e à Inglaterra, a partir de
1640.
Esta história pioneira de Portugal deixou algumas
lições sobre a formação do sistema inter-estatal e do
próprio capitalismo:
• i. O primeiro estado nacional europeu já nasceu
dentro de um sistema de poderes competitivos;
ii. Suas fronteiras territoriais, sua unidade
política, e sua identidade nacional foram
construídas por duas guerras que duraram mais
de 200 anos;
iii. Estas guerras “nacionais” se prolongaram
imediatamente, num movimento de expansão
“para fora”, na direção da África, Ásia e
América, que durou mais um século e meio;
• iv. Estas guerras e conquistas
não tiveram inicialmente um
objetivo prioritariamente
mercantil, mas assim mesmo,
no longo prazo, tiveram um
papel decisivo na criação e
expansão de uma economia
de mercado e de um
capitalismo nacional
incipiente;
• v. Neste período, esta economia nacional
de forte cunho estatal, não alcançou a se
“privatizar”, nem chegou a criar um
sistema nacional de bancos e crédito
capaz de mobilizar o capital financeiro
português, o segredo do sucesso posterior
da Holanda e da Inglaterra;
vi. Por fim, se pode dizer que Portugal
teve um papel decisivo no “big-bang”
do “sistema interestatal capitalista”,
que está vivendo uma nova explosão
expansiva neste início do século XXI.
Rompendo vínculos
• O processo de formação da monarquia – e do Estado
unificado português - iniciou-se por volta de 1139. Nesse
ano, Afonso Henriques, fundador da dinastia dos
Borgonha, rompeu os vínculos de subordinação política
com o reino de Castela, declarando-se rei em uma
extensão de terras situadas entre as regiões dos rios
Minho e Douro.
• A partir daí, o reino expandiu-se para os territórios
situados na porção meridional da península,
conquistando territórios mouros, até incorporarem, no
século XIII, o reino muçulmano do Algarve. Portugal
define suas fronteiras históricas.
• De forma pioneira na Europa, tem seguimento
um processo de unificação e construção do
Estado português, com fisionomia e aparência
de instituição pública e organismo político com
administração impessoal, reconhecida pela
nobreza e pelas oligarquias comerciais.
• Consolida-se um corpo legislativo e montase um aparelho judiciário baseado no direito
romano. A administração pública passou a se
basear na economia das cidades e não mais
dos feudos.
• O advento da dinastia de Avis consolida e
aprofunda essa tendência, especialmente
a partir de 1383, nas guerras contra
Castela.
• O Estado passa a ter instrumentos
fiscais centralizados e um corpo bélico
unificado de defesa e do monopólio do
comércio.
Geraldo Silva Filho
Constituição, estrutura e atuação dos poderes locais na comarca de
Vila Rica (1711-1750)
• Portugal do final da Idade Média firmou-se como um
Estado de guerra, o que exigia finanças sólidas e
capacidade de mobilização de vastos contingentes de
soldados e militares, impossível de ser obtido no âmbito
da organização feudal. Com polítiocas fiscais rígidas e a
possibilidade de ter soberania sobre a moeda e um
corpo parlamentar representativo das diversas
oligarquias locais, o Estado moderno toma foco.
• Entre 1385 e 1490 – as cortes portuguesas reuniramse 55 vezes. Isso quer dizer que a Coroa realizava com
certa regularidade um processo de consulta com seus
segmentos sociais dominantes – nobreza, clero e
comerciantes – para participar de decisões importantes
do Estado.
O surgimento dos primeiros Estados
nacionais no final da Idade Média e do
feudalismo resultaram da combinação de
duas condições históricas determinantes:
• 1. O alargamento de suas bases
territoriais e demográficas;
• 2. Com o desaparecimento do escravismo
e de uma crescente e gradual
complexidade da vida urbana abre espaço
para a consolidação de uma classe
burguesa.
Protagonismo português
Fatores principais
• Inúmeros foram os fatores que colaboraram
com o protagonismo português no processo das
grandes navegações, entre eles, destaca-se a
centralização política de Portugal. Isso porque,
já no século XIV o Estado português passou por
um processo de unificação política, por meio da
Dinastia de Avis (1385-1582), que facilitou a
organização de sistema de arrecadação de
impostos e estrutura administrativa centralizada.
• Em segundo lugar, está uma burguesia
mercantil, que, na ausência de investimentos
efetivos do Estado, que não vislumbrava
inicialmente resultados positivos nessas ações,
abriu espaço para que a iniciativa privada o
fizesse.
• Salienta-se, também, como fator favorável, a
posição geográfica portuguesa, banhada pelo
mar Mediterrâneo e pelo oceano Atlântico,
verdadeiramente debruçado sobre a África, o
que a colocava numa situação de contato direto
com as possibilidades de navegação pelas vias
marítimas.
Formação do Estado português
• O surgimento da monarquia
nacional portuguesa, assim
como a espanhola, está
estreitamente associada às
guerras de expulsão dos
muçulmanos da Península
Ibérica que ficaram
conhecidas como Guerras de
Reconquista.
• Desde a expansão islâmica, ocorrida no
século VIII, povos árabes dominavam boa
parte da Península Ibérica. Os reinos
cristãos de Leão, Castela, Navarra e
Aragão limitavam-se a uma pequena
porção ao norte da península.
• A partir do século XI, no contexto das
Cruzadas e da expansão do cristianismo,
esses reinos cristãos iniciam uma guerra
contra os muçulmanos. Na luta contra os
árabes, esses reinos contaram com o
apoio do nobre francês Henrique de
Borgonha.
• A formação do Estado português está
associada justamente à doação, feita pelo
soberano de Leão, Afonso VI. Além de
receber o condado Portucalense, Henrique
casou-se com a filha ilegítima do rei, Dona
Teresa.
• A independência do condado em relação ao
reino de Leão foi conseguida pelo filho de
Henrique e Teresa, D. Afonso Henriques, após
muita luta e a expulsão de Dona Teresa em
1139 para garantir a independência, porque ela
defendia a sujeição do condado ao reino dos
pais.
• D. Afonso Henriques, então, inicia a
dinastia de Borgonha, e dá
prosseguimento à guerra contra os
muçulmanos, expandindo as
fronteiras do novo reino para o sul da
península.
• O novo monarca doava terras à
nobreza guerreira, porém, sem o
direito a hereditariedade, o que
impediu a formação de uma nobreza
proprietária autônoma, mantendo a
hegemonia da autoridade real.
• Além de se expandir, o novo reino
enriquecia graças à posição
privilegiada de entreposto
comercial entre as rotas do mar
mediterrâneo e do norte da
Europa.
• O setor mercantil lusitano tornou-se mais
forte a partir do século XIV graças ao
advento da peste negra e das guerras no
continente, que tornavam as rotas por
terra mais inseguras.
• Em 1383, o último rei da
Dinastia de Borgonha morre
sem deixar herdeiros diretos,
desencadeando uma acirrada
disputa sucessória, sendo que
parte da nobreza apoiava a
entrega da coroa de Portugal
ao rei de Castela, genro de
Fernando I, último soberano
da casa de Borgonha.
• Porém os comerciantes aliados a setores
populares conseguem impor no trono
D.João, Mestre de Avis, derrotando os
exércitos castelhanos e setores da
nobreza na batalha de Aljubarrota.
• Esse episódio da história de Portugal ficou
conhecido como Revolução de Avis. A
consequência desse episódio foi o início
da dinastia de Avis, que se aproximou da
burguesia mercantil, e que fez Portugal
largar na frente nas Grandes Navegações
e nos “Descobrimentos”.
• A Guerra dos 80 anos ou Revolta Holandesa
de 1568 a 1648, foi o conflito de secessão na
qual o território englobando aquilo que é hoje
os Países Baixos se tornou um país
independente frente à Espanha.
• Durante esta guerra, a República Holandesa
tornou-se uma potência mundial por um curto
período, com grande poder naval, e
beneficiou de um crescimento econômico,
científico e cultural sem precedentes.
• Entre 1580 e 1640, Portugal foi anexado à
Holanda. Herdou a guerra contra
Espanha.
• Depois, até 1689, o reino guerreou contra
os dois. Portugal converteu suas colônias
em centros militares e geradores de
receita para a coroa.
• Ao contrário dos holandeses, ingleses e
venezianos, os portugueses não
concederam aos mercadores autorização
para organizarem um governo colonial.
Embora o sistema gerasse um cipoal de
corrupção e negócios clandestinos, pode
alimentar a coroa por um bom tempo.
• Os espanhóis só investiram depois na
conquista ultramarina, a partir de 1492,
conquistando qase toda a América Central
e a do Sul.
• Por essa época, entraram em cena as
Companhias da Índias Ocidentais e
Orientais, dirigidas por holandeses e
ingleses. No século XVII a supremacia
dos mares seria ds holandeses.
• A supremacia lusitana estendeu-se até
fins do século XVIII.
Final do século XVI
• Estados unitários: Espanha, França, Ingaterra
tendem a formar unidades econômicas num
mundo medieval em que essas unidades são as
grandes cidades.
• Diplomacia: invenção veneziena, pela
necessidade de contatos permanentes entre
aliados (1495)
• Portugueses e espanhóis fundam impérios
ultramarinos e dividem o Novo Mundo pelo
tratado de Tordesilhas (1494) e de Saragoça, no
pacífico.
Paul Kennedy
Ascensão e queda das grandes potências
O advento da modernidade
• Ao redor do ano de 1500
situa-se a divisão de mundo
entre a época pré-moderna e
a moderna. A queda de
Constantnopla (1453), pelas
mãos dos turcos otomanos
acontecera meio século antes.
• Os tempos marcam também a supremacia
econômica das cidades-estado italianas,
centradas em Veneza, Genova, Florença
e Milão, verdadeiros enclaves capitalistas
num mundo feudal.
•
Elas anteciparam em pelos menos dois
séculos várias das características do
sistema interoestatal moderno. Essas
características se deram especialmente
na gestão do Estado e da guerra.
• O período assistiu a hegemonia
econômico-financeira de dois Estados,
primeiramente Veneza e depois
Amsterdam.
Estado e guerra
• Nas relações inter estatais, a
principal característica dos Estados
capitalistas é a busca do equilíbrio de
poderes, que reduz custos de defesa,
Assim, pode se desenvolver um
sistema de diplomacia que serviria de
modelo para estados 200 anos
depois.
• O conhecimento do mundo que os
europeus tinham era escasso e
fragmentado. Pouco ou nada sabiam das
civilizações orientais e menos ainda do
que existia nas Américas.
• O período coincide, na Europa, com a
formação do Estado-nação, em meio ao
mundo feudal. Novas classes sociais
afloram no cenário político e social, como
a burguesia. Melhores meios de
comunicação também ao o tom.
• Mas era a guerra e suas conseqüências
que criavam uma pressão contínua no
sentido da formação da nação. Isso não
apenas por apelos patrióticos, mas
especialmente pela organização e custeio
dos exércitos engendrar novas políticas
tributárias, delimitadas geograficamente,
visando financiar o aparato bélico.
• Uma conseqüência dessas foi a extensão
do envolvimento dos estados em
atividades não militares.
Crescimento para fora
• Em meados do século XV, as potências
européias começaram a criar impérios fora do
continente. A partir de 1415, com a captura de
Ceuta, na costa marroquina, os portugueses
dão início a uma expansão de ultramar que
duraria dois séculos.
• Em 1460, os portugueses haviam se apossado
da costa ocidental da África e de madeira e
Açores, no meio do Atlântico. Em aliança com
empresários genoveses, começaram a viabilizar
comercialmente as novas colônias.
• No fim do século, Vasco da
Gama havia estendido a
influência portuguesa ao
Índico e ao pacífico.
• Tentaram quebrar o monopólio
muçulmano-veneziamno do
acesso às especiarias e
mercadorias de luxo na África.
Quase conseguiram.
Giovanni Arrighi
O longo século XX
• O aspecto crucial do surgimento do moderno
sistema interestatal foi a oposição constante
entre as lógicas capitalista e territorialista do
poder, bem como a recorrente resolução de
suas contradições através da reorganização do
espaço político-econômico mundial pelo
principal Estado capitalista de cada época.
• Essa dialética entre capitalismo e territorialismo
é anterior ao estabelecimento, no século XVII,
de um sistema interestatal pan-europeu.
• Inicialmente, o subsistema
regional de cidades-Estados
capitalistas que emergiu na Itália
setentrional não foi mais do que
um dos “enclaves anômalos”que
se multiplicaram no espaço
político do sistema de poder
medieval.
• Italia
• Mas à medida que se acelerou a decadência do
sistema de governo medieval, o enclave
capitalista da Itália setentrional organizou-se
num subsistema de jurisdições políticas
separadas e independentes, unidas pelo
princípio do equilíbrio do poder e por densas e
vastas redes de diplomacia com sedes
permanentes.
• De variadas formas, esse subsistema de
cidades-Estado – centrado em Veneza, Genova,
Florença e Milão – antecipou em pelo menos
dois séculos muitas das principais
características do moderno sistema interestatal.
Esse subsistema, um enclave capitalista em pleno
mundo medieval, tinha pelo menos quatro
características essenciais ao desenvolvimento do
posterior sistema interestatal:
1. Era um sistema predominantemente
capitalista
2. Era baseado num “equilíbrio de
poder”, que conseguiu preservar
suas principais características
políticas e econômicas, impedindo
que a lógica territorialista
suplantasse a dinâmica capitalista;
3. Por força da dinâmica capitalista, tinham
sua relação social fundamental baseada
no trabalho assalariado, o que lhes
garantia a formação de um mercado
interno que impulsionava o próprio
desenvolvimento;
4. O poder político assumiu a direção de
novas e inéditas redes de diplomacia.
Isso possibilitava a administração dos
monopólios de comércio na rede por
parte do poder estatal. As redes
diplomáticas eram construídas através da
longas rotas comerciais.
• Tais características – em especial
o equilíbrio de poder, peça
essencial do sistema interestatal
posterior – deu previsibilidade ao
funcionamento do sistema,
otimizou gastos bélicos e
promoveu inédita concentração
de riqueza e poder nas mãos da
oligarquia.
• http://portugalglorioso.blogspot.com.br/201
4/03/mapa-da-europa-1000-dc-atehoje.html
3.1648-1789: A Paz de Vestfália
e o conceito de soberania
Gilberto Maringoni
UFABC 2014
O sistema mundial
José Luís Fiori
• O atual "sistema político mundial", que
nasceu na Europa no século XVI e se
universalizou nos últimos 500 anos, não
foi uma obra espontânea nem diplomática.
Foi uma criação do poder, do poder
conquistador de alguns Estados territoriais
europeus que definiram suas fronteiras
nacionais no mesmo momento em que se
expandiram para fora da Europa e se
transformaram em impérios globais.
• Da mesma forma, o "sistema econômico
mundial", que também se constituiu nesse
mesmo período a partir da Europa, não foi
uma obra exclusiva dos "mercados" ou do
"capital em geral". Foi um subproduto da
expansão competitiva e conquistadora de
algumas economias nacionais europeias
que se internacionalizaram junto com seus
respectivos "Estados-economias", que se
transformaram, imediatamente, em
impérios coloniais.
• Duas características distinguem a originalidade
e explicam a força vitoriosa desses poderes
europeus:
• Primeiro, a maneira como os Estados
territoriais criaram e se articularam com suas
economias nacionais, produzindo uma "máquina
de acumulação" de poder e riqueza
absolutamente nova e explosiva - os "Estadoseconomias nacionais";
• Segundo, a maneira como esses "Estadoseconomias nacionais" nasceram, em conjunto e
numa situação de permanente competição e
guerra entre si e com os poderes imperiais de
fora da Europa.
• De acordo com o sociólogo alemão
Norbert Elias, desde o início desse
sistema, nessa competição
permanente, "quem não sobe, cai".
Por isso, as guerras se
transformaram na atividade principal
dos primeiros poderes territoriais
europeus e depois seguiram sendo a
atividade básica dos Estados
nacionais.
• E, com isso, as guerras acabaram cumprindo na
Europa, um papel contraditório, atuando
simultaneamente como uma força destrutiva e
integradora, promovendo uma espécie de
"integração destrutiva" de territórios e regiões
que tinham se mantido distantes e separados
até os séculos XVI e XVII, e que só passaram a
fazer parte de uma mesma unidade, ou de um
mesmo sistema político, depois da Guerra dos
30 anos, da Paz de Vestfália (em 1648) e das
Guerras do Norte, no início do século XVIII.
• Dentro desse novo sistema
político, todos os Estados
estavam obrigados a se expandir
para poder sobreviver.
• Por isso se pode falar de uma
"compulsão expansiva" de todo o
sistema e de cada um de seus
Estados territoriais e da sua
necessidade de conquista
permanente de novas posições
monopólicas de poder e de
acumulação de riqueza.
• É nesse sentido que se pode dizer que,
desde a formação mais incipiente do novo
sistema, suas unidades competidoras
tinham que se propor, em última instância,
à conquista de um poder cada vez mais
global sobre territórios e populações cada
vez mais amplos e unificados até o limite
teórico da monopolização absoluta e da
constituição de um império político e
econômico que teria uma abrangência
mundial.
O breve século XX
Giovanni Arrighi
• O moderno sistema de governo emergiu da
desintegração do sistema da Europa medieval,
que consistia numa relação senhor-vassalo,
uma mistura de público e privado, mobilidade
geográfica do poder e legitimação dada por um
corpo comum de leis, religião e costumes.
• O sistema moderno torna as esferas públicas e
privadas distintas; a jurisdição é claramente
demarcada por fronteiras nacionais e está
estreitamente associado ao desenvolvimento do
capitalismo como sistema de acumulação
mundial.
• Este vínculo é tanto contraditório
como único: o capitalismo e os
Estados nacionais surgiram juntos e
são interdependentes, mas há
condições que fazem os capitalistas
se oporem à ampliação do poder do
Estado; enquanto o foco estatal é a
aquisição de territórios e o controle
de populações, o foco do capitalista é
o acúmulo de capitais.
• O Estado usa o controle
do capital como meio de
adquirir territórios; o
capitalista usa o controle
do território como meio
de acumular capitais.
• O apoio capitalista ao Estado está
condicionado ao seu funcionamento
como facilitador do acúmulo de
capitais.
• Arrighi cita como exemplo China e Europa nos
séculos XIV-XV: enquanto o capitalismo é o
grande motivador do esforço europeu de
adquirir territórios, a China (superior
tecnologicamente e muito rica) não tem
motivação econômica para ir à Europa.
A invenção do Estado moderno ocorre
primeiro nas cidades renascentistas da
Itália setentrional. Veneza tem uma
oligarquia mercantil que controla o poder
estatal, com quatro características
básicas:
• Sistema capitalista de gestão do estado e
da guerra.
• Equilíbrio de poder como garantia de
independência.
• Guerras concebidas como indústria de
produção de proteção, autocusteadas.
• Desenvolvimento de redes de diplomacia
para manutenção do equilíbrio.
• Às cidades italianas sucederam a
Espanha. A nova tecnologia militar e
o fluxo de riquezas vindas da
América produziram um enorme
aumento nos gastos militares; a
escalada militar e a afirmação dos
Estados nacionais criaram enormes
conflitos e tensão social; o uso da
religião nos conflitos de poder
aumentou a violência.
O domínio dos Habsburgos
Paul Kennedy
• Durante um século e meio, depois de
1500, uma combinação de reinos,
ducados e províncias espalhados por
todo o continente, governados por
membros espanhóis e austríacos da
família Habsburgo, ameaçou tornarse a influência política e religiosa
predominante na Europa.
• Uma característica européia
no século XVI é sua
fragmentação política, ao
contrário do que ocorria em
impérios de larga extensão,
como o otomano e o chinês.
Durante séculos, a unidade
de poder foi pequena e
descentralizada.
• Muito provavelmente, a geografia
continental tenha favorecido esta
pluralidade. As conseqüências políticas e
sociais de um crescimento não
centralizado foram da maior significação.
• A evolução econômica não podia ser
sufocada.
• Não havia uma autoridade única a regular
todas as instancias de comercio. Houve
sempre senhores locas a tolerar práticas e
usos comerciais que outros não
aceitariam.
Histórico das guerras
• As lutas que perturbaram a paz na Europa nos
cem anos anteriores a 1500 foram localizadas,
os choques entre os vários Estados italianos e a
rivalidade entre as coroas francesa e inglesa e
as guerras dos cavaleiros teutônicos contra
lituanos e poloneses foram exemplos disso. A
partir do final do século XVI, as disputas se dão
entre cinco ou seis Estados maiores e outros
menores.
• O histórico das guerras podem ser marcados
por três características:
A. Reforma
• O advento da Reforma Protestante,
liderada por Martinho Lutero (1483-1546).
A alegação de que a liberdade da punição
de Deus sobre o pecado poderia ser
comprada, confrontou um vendedor de
indulgências.
• Lutero viu este tráfico de indulgências
como um abuso que poderia confundir as
pessoas, deixando de lado a confissão e o
arrependimento verdadeiros.
• Sua recusa em retirar seus escritos a pedido do
do Papa Leão X em 1520 e do Imperador Carlos
V na Dieta de Worms em 1521 resultou em sua
excomunhão pelo Papa e a condenação como
um fora-da-lei pelo imperador do Sacro Império
Romano.
• Lutero ensinava que a salvação não se
consegue com boas ações, mas é um livre
presente de Deus, recebida apenas pela graça,
através da fé em Jesus como único redentor do
pecador. Sua teologia desafiou a autoridade
papal na Igreja Católica Romana.
B. Habsburgos
• A criação de uma combinação dinástica, a
dos Habsburgos, que formou uma rede
de territórios que se estendiam de
Gibraltar à Hungria e da Sicília a
Amsterdam, superando tudo o que já se
vira na Europa, em tamanho.
• A Casa de Habsburgo se constituiu pelas
ramificações de uma família nobre da
Europa foi uma das mais importantes e
influentes entre os séculos XIII e XX.
• Foi a dinastia soberana de vários Estados
e territórios. Entre os seus principais
domínios estavam o Sacro Império
Romano Germânico (962-1806), onde
imperou de1273 até seu
desmembramento em 1806, como
consequência das Guerras Napoleônicas
(1799-1815); e o Império Austro-Húngaro,
que governou desde a sua fundação em
1867 até sua dissolução em 1918, pelo
Tratado de Saint-Germain-en-Laye, como
consequência da Primeira Guerra Mundial
(1914-1918).
Império Habsburgo, c.1580
• Por ter sido elevada a realeza em
1273, é denominada a "família
imperial" do Sacro Império
Romano Germânico (962-1806);
e por ter sido a soberana da
Áustria desde1278 até 1918,
tendo inclusive sido a única
governante do Império ÁustroHúngaro (1867-1918), é
denominada como a "família
imperial austríaca".
• Reunia nele as heranças das casas de
Áustria, Borgonha, Aragão, Castela e as
imensas terras espanholas no Novo
Mundo.
• A Reforma Protestante e a invasão turca
da Europa Oriental obrigaram os dois
ramos dos Habsburgos a juntar forças
para preservar o catolicismo europeu
durante toda a Contra-Reforma e a guerra
dos Trinta Anos (1618-1648).
• O combate aos turcos marcaria por mais de dois
séculos o destino da dinastia Habsburgo, entre
1453 (queda de Constantinopla, atual Istambul)
e 1718 (Tratado de Passarowitz, fim da guerra
austro-turca).
• As possessões dos Habsburgos não
formaram porém um conjunto unido, apesar
da criação de um governo central comum a
todos os territórios, com um conselho áulico, um
conselho secreto e um conselho de guerra.
Disputas de família trouxeram muitas
instabilidades aos domínios.
C. Império Otomano
• O Império Otomano foi um estado que existiu
entre 1281 e 1923 e que no seu auge
compreendia a Anatólia (Turquia), o Médio
Oriente, parte do norte da África e do sudeste
europeu. Nos séculos XVI e XVII, o império
otomano constava entre as principais potências
políticas européias e em vários países europeus
foi sentido o receio dos avanços nos Balcãs. No
seu clímax, compreendia uma área de
11.955.000 km².
• Em 1453, após a captura da cidade de
Constantinopla (atual Istambul) esta tornou-se
sua capital.
• Não é inexato afirmar, sob as
perspectivas histórica e geográfica,
que os impérios muçulmanos se
constituíam as forças de mais rápida
expansão no mundo do século XVI.
• Os turcos otomanos avançavam para
o ocidente e os persas conheciam um
renascimento de poder, prosperidade
e cultura. Em várias partes os
muçulmanos avançavam em poder
e influência no oriente.
• Militar e culturalmente, o Império
Otomano obteve uma área geográfica
maior que a do Império Romano em
seus melhores dias, abarcando 14
milhões de súditos e envolvendo uma
política de dominação flexível e
tolerante em relação a outras raças.
Constantinopla era maior que
qualquer cidade européia em 1600,
com 500 mil habitantes.
• Como o teórico do nacionalismo Ernest
Renan (1823-92) afirma, o Império
Otomano era, em contraste com outros
estados-nações (como a França,
Alemanha ou Reino Unido) uma
unidade política multiétnica.
• Em "Qu 'est-ce qu' une nation ?", de 1882,
ele afirma que "o turco, o eslavo, o grego, o
arménio, o árabe, o sírio, o curdo, são tão
distintos hoje como sempre foram desde o
primeiro dia da conquista".
• No entanto, ao contrário de outros
imperalismos, o Otomano não foi
economicamente eficiente e acabou por
fechar-se em si mesmo.
• Em fins do século XVI, o império mostrava
os primeiros sinais de excessiva extensão
estratégica, com exército e marinha com
elevados custos, impossíveis de serem
supridos a contento. A excessiva
centralização despótica e uma burocracia
ineficiente e uma excessiva ortodoxia para
com o comércio em seus domínios.
• .
• Tarifas excessivas levaram
estabelecimentos à falência e
despovoaram cidades.
• Com a crise econômica, o saque
por parte do exército, que já
existia, atingiu níveis alarmantes.
Nessa atividade, foram seguidos
dos funcionários civis
Religião e poder
• Era quase impossível separar o poder político
das ordens religiosas nesses anos. Disputas
religiosas – não havia separação entre Igreja e
Estado – fatalmente se traduziam em disputas
territoriais e contendas pelo poder político.
• O principal objetivo das dinastias francesas, em
especial os Bourbons (1555-1889), na Europa
era romper o poder dos Habsburgos em
inúmeros conflitos de maior ou menor
intensidade. No século XVI, apenas a Inglaterra,
França, Escandinávia, Polônia, Moscóvia e as
terras sob controle otomano não faziam parte
dos domínios dos Habsburgos.
• A verdadeira “revolução militar” dos
princípios da Europa moderna, com
aumento maciço da escala, custo e
organização da guerra. Aumentou a
proporção da infantaria em relação às
forças de cavalaria.
• Sendo mais barato recrutar e
equipar soldados a pé, os exércitos
aumentaram expressivamente de
tamanho, com conseqüente aumento
das burocracias e comandos.
• Guerra implicava condições materiais
crescentes para mantê-las. Se
pensarmos que os Habsburgos
envolveram-se em cerca de 140 anos
de guerras entre os séculos XVI e
XVII, fica claro um dos motivos de
sua decadência. O objetivo principal
dos Habsburgos era a tentativa de
impor um sistema hegemônico da
cristandade, o que traria estabilidade
e previsibilidade ao sistema europeu.
• Em 1618, a revolta dos
Estados protestantes da
Boêmia (atuais repúblicas
Tcheca e Eslováquia) contra o
governante católico Fernando
II (Habsburgo) foi o episódio
deflagrador de uma guerra
que se estenderia por três
décadas.
A Guerra dos Trinta Anos
• A Guerra dos Trinta Anos consistiu-se num
grande conflito multidimensional – entre
variadas guerras localizadas ou de maior ou
menor dimensão - travado pelos Habsburgos da
Áustria e da Espanha contra sucessivas
coalizões de Estados inimigos de 1618 até a
Paz de Vestfália, em 1648. A escala, o número
de homens envolvidos e os custos de um
conflito armado no século XVI eram muito
maiores do que no século anterior.
• Os embates ocorreram especialmente na
Alemanha, nos quais rivalidades entre católicos
e protestantes e assuntos constitucionais
germânicos foram gradualmente transformados
em uma luta européia.
• Apesar de as disputas religiosas serem a causa
direta do conflito, ele envolveu um grande
esforço político da Suécia e da França para
procurar diminuir a força da dinastia dos
Habsburgos, que governavam a Áustria. A
guerra causou sérios problemas econômicos e
demográficos na Europa Central.
• A Guerra dos Trinta Anos
envolveu os principais países da
Europa – além de expedições
holandesas que atacaram, em
além mar, Brasil, Angola e Ceilão
(Sri-Lanka) – transformando-se
naquilo que alguns historiadores
chama de primeira guerra global.
• Segundo Paul Kennedy, “o final da
Guerra dos Trinta Anos constitui uma
questão confusa. A Espanha celebrou
subitamente a paz com os holandeses em
1648, reconhecendo finalmente sua
independência total; isso foi feito, porém,
para privar a França de um aliado e a luta
franco-Habsburgo continuou.
• Tornou-se puramente franco-espanhola,
quando a Paz de Vestfália trouxe
finalmente tranquilidade à Alemanha e
permitiu que os Habsburgos da Áustria se
afastassem do conflito.
A Paz de Vestfália
• A Paz de Vestfália (região alemã) designa
uma série de tratados que encerrou a
Guerra dos Trinta Anos e também
reconheceu oficialmente as Províncias
Unidas e a Confederação Suíça.
• O Tratado Hispano-Holandês, que pôs fim
à Guerra dos Oitenta Anos, foi assinado
no dia 30 de janeiro de 1648 (em
Münster), após quatro anos de
negociações.
• Em 24 de outubro do mesmo ano foi
assinado o tratado de paz entre o Sacro
Império Romano-Germânico, os outros
príncipes alemães, a França e a Suécia.
Os tratados concluídos nessas duas
cidades da Westfália foram depois
reunidos no Ato Geral de Vestfália em
Münster em 24 de Outubro de 1648
• O Tratado dos Pirineus, de 1659, o qual
deu fim à guerra entre França e Espanha,
também costuma ser considerado parte
da Paz de Vestfália.
• A essência da solução de Vestfália foi o
reconhecimento do equilíbrio religioso dentro do
Sacro Império Romano (império Habsburgo),
apesar dos sinais evidentes de sua decadência.
Cerca de um quarto da população europeia vivia
sob seus domínios.
• A idéia da constituição de um sistema político
mundial, ou europeu, era fundado da noção de
equilíbrio de poder, direito exercido pelos
Estados e não acima deles. Constituiu-se assim
uma nova ordem anárquica, com uma
reorganização dos espaços politicos destinados
a permitir a liberdade de comércio.
• A Paz de Vestfália inaugurou o moderno
sistema internacional, ao acatar noções e
princípios tais como o de soberania estatal e
o de Estado nação.
• Os resultados do tratado foram muito
abrangentes. Dentre outras conseqüências,
os Países Baixos ficaram independentes da
Espanha, terminando-se com a Guerra dos
Oitenta Anos; a Suécia ficou com a
Pomerânia, Wismar, Bremen e Werden.
• O poder dos Sacro-Imperadores foi
irreparavelmente abalado e os
governantes dos estados germânicos
voltaram a gozar da prerrogativa de
determinar a religião oficial dos seus
territórios.
• O tratado deu reconhecimento legal aos
calvinistas. Três grandes potências
emergiram: a Suécia, as Províncias
Unidas e a França. O poderio da Suécia
foi, contudo, de pouca duração.
Decorrências
• As guerras posteriores a 1540 estavam
intimamente ligadas ao nascimento do Estadonação. Entre fins do século XV e fins do século
XVII, a maioria dos países europeus presenciou
a centralização da autoridade política e militar,
em geral no monarca, acompanhada de maiores
poderes e métodos de tributação pelo Estado e
realizada por uuma máquina burocrática muito
mais complicada do que existia quando os reis
deviam “viver de seus próprios recursos” e os
exércitos nacionais eram mantidos com um
recrutamento feudal.
• A guerra e suas consequências
criavam uma pressão premente e
contínua no sentido da “construção
da nação” do que a lenta evolução
das tendências sociais.
• O poder militar permitiu a muitas
dinastias europeias manter-se acima
dos grandes magnatas e assegurar a
uniformidade a a autoridade política.
• A guerra tornou concreto o
destino da arrecadação fiscal.
Nos últimos anos do reinado de
Isabel, da Inglaterra (1533-1603)
e de Felipe II, da Espanha (15271598), três quartos das despesas
dos governos eram destinados à
guerra ou ao pagamento de
dívidas.
• A monopolização e burocratização do poder
militar do Estado são claramente parte central
da “criação da nação”. O exército deixava de ser
um corpo transitório, composto por mercenários,
e tornava-se permanente e estável. O poder
passava a ser nacional.
• O sistema de estados europeus era na verdade
um sistema de cinco grandes potências: França,
o Império Habsburgo, Prússia, Inglaterra e
Rússia, bem como países menores, como
Savoia e Espanha.
O poder agora era “nacional”.
• O aspecto mais significativo no cenário europeu
após 1660 foi o amadurecimento de um sistema
realmente multipolar de Estados, cada qual com
a tendência cada vez mais acentuada de tomar
decisões sobre a guerra e a paz a partir dos
‘interesses nacionais’ e não por motivos
transnacionais ou religiosos.
• Países que tinham sido inimigos numa guerra
muitas vezes se aliavam na guerra seguinte, o
que dava ênfase a uma Realpolitik calculada, e
não a convicções religiosas profundas na
determinação de seus interesses.
• A paz representava o coroamento de um
processo marcado pelo início da hegemonia e
francesa na Europa e pelo declínio do poder dos
Habsburgos.
• A Alemanha foi a única que saiu derrotada
desses trinta anos de guerra. Os principais
campos de batalhas dos intermitentes conflitos
foram as cidades e principados da Alemanha,
que sofreram danos muito graves.
• Conseqüências de longo prazo da
guerra foram, além da emergência da
França como o poder terrestre
dominante na Europa, a formação
das Repúblicas da Holanda e Suíça e
a contínua fragmentação da
Alemanha, pois torna 39 Estados
alemães quase que independentes
do Imperador, atrasando a sua
unificação em um único Estado.
Arrighi
• As Províncias Unidas sobressaíram-se neste cenário,
por serem os primeiros a liquidar o sistema de governo
medieval. A Holanda surge como potência hegemônica
após a Guerra dos Trinta Anos.
•
Os acordos para proteger o comércio em tempo de
guerra celebrados na Paz da Vestfália criaram as
condições para a expansão do capitalismo; Haia
permanece até hoje como o centro da diplomacia
européia.
• Províncias Unidas ou República dos Sete Países
Baixos Unidos foi um Estado formado pelas províncias
do norte dos países baixos – entre eles a Holanda –
agrupados desde o Tratado de Utrecht, em 1579, até a
ocupação francesa, em 1795.
• De 1652 a 1815 há a luta entre França e
Inglaterra pela supremacia. Na primeira
fase ambas tentaram anexar a Holanda
para controlar suas redes comerciais; na
segunda fase dos conflitos o alvo são as
próprias redes comerciais holandesas; a
geografia política do comércio mundial é
reestruturada radicalmente: saem de cena
portugueses, espanhóis e holandeses;
ascendem franceses e ingleses no século
XVIII.
Consequências da Paz
• Reconheceu-se a completa independência da Suíça
(curiosamente, a própria Suíça não é signatária da Paz
de Vestfália).
• Reconheceu-se a independência da República das Sete
Províncias Unidas dos Países Baixos (previamente a
sua revolta, um século antes, havia sido possessão da
Casa de Habsburgo e, portanto, da Espanha).
• Os diversos estados alemães independentes receberam
o direito de conduzir a sua própria política externa, mas
lhes era vedado cometer atos de guerra contra o Sacro
Imperador. O Império, como um todo, se reservava o
direito de fazer a guerra e de celebrar tratados.
• A França saiu da guerra em uma posição muito melhor
do que as outras potências, sendo capaz de ditar boa
parte do tratado.
O conceito de soberania
• Foi a Paz de Vestfália,assinada em 1648,que
consagrou o princípio da “soberania nacional” e
gerou o “sistema político-estatal europeu”. Mas
ao consagrar o princípio da soberania criou um
sistema de poder anárquico, no qual o exercício
do “equilíbrio de poder” e a guerra se tornaram
as duas formas conhecidas e possíveis de
resolução dos conflitos entre os Estados
soberanos. Configurou-se, assim, uma forma
primitiva de governança supranacional.
• Em síntese, as primeiras “economias nacionais”
nasceram como uma estratégia de guerra
defensiva dos primeiros Estados territoriais
europeus e depois se transformaram numa
imposição do sistema político interestatal,cuja
regra número um era a continuidade e a
intensificação permanente da competição
político-militar entre seus Estados-membros.
• Como resultado,desde o início o sistema político
europeu esteve sob o controle compartido ou
competitivo de uns poucos Estados que
impuseram aos demais sua liderança políticomilitar e econômica. Foram as grandes
potências, que nunca passaram de seis ou sete,
que desde o início se transformaram no núcleo
dominante de todo o sistema.
Alessandra Rodrigues,
David Carvalho e Luciano Diniz
• A Paz de Vestfália é frequentemente apontada
como o marco da diplomacia moderna, pois deu
início ao sistema moderno do Estado nação - a
primeira vez em que se reconheceu a soberania
de cada um dos Estados envolvidos.
• As guerras posteriores ao acordo não mais
tiveram como causa principal a religião, mas
giravam em torno de questões de Estado.
Também fortaleceu as divisões internas da
Alemanha, impedindo-a de formar um Estadonação unido, o que perdurou até o final do
século XIX.
• Nessa conjuntura é que surge o Estado nacional
com uma característica antes desconhecida: a
soberania. Este Estado tem sua forma unitária
com poder unificado de onde originava toda sua
vontade. Seu fortalecimento era importante para
assegurar a supremacia e toda uma idéia de
soberania sistematicamente construída com
base num Estado moderno centralizado e
burocrático.
• A soberania era, portanto, una, indivisível,
imprescritível, inalienável. E sua supremacia
assegurava oposição aos poderes da Igreja,
subordinando-os, e ao poder feudal, eliminando
mediadores políticos entre os indivíduos e o
Estado. Daí, respectivamente, os primórdios da
dupla face da soberania, a externa e a interna.
• Na Idade Média, o poder era
fragmentado e não havia a idéia de um
Estado nacional com um exército,
moeda, poder unitário e sequer
soberano.
• O que se poderia chamar à época de
soberania aparece com uma diferente
conotação: expressava-se na noção de
propriedade de território.
• Poder-se-ia dizer que a construção do
conceito no Ocidente se deu devido a
fatos históricos como os conflitos
existentes entre os poderes da Igreja, do
sistema feudal, e dos reis representantes
do Estado, nas lutas que se travavam
para conquistar territórios visando
imposição de uma autoridade sob os
barões feudais (assegurando certa noção
de soberania interna) e ao Santo Império
Romano (assegurando certa noção de
soberania externa).
• Neste período surgiram vários
centros de poderes independentes,
cada um exercia o que se poderia
designar ‘soberania medieval’.
• Significava tão-somente determinada
qualidade investida num Senhor que
exercia no seu território um poder, ou
seja, manifestava superioridade no
poder de governo e na produção de
leis naquele local.
• Esse processo histórico foi
a base para a construção
conceitual do termo soberania
que aos poucos viu-se
transferir da vinculação da
posse de terra à pessoa do rei
e para o propriamente dito
poder real.
• Após a consolidação dos Estados nacionais e o
estabelecimento da divisão de poderes
internamente, os soberanos passaram a
reconhecerem-se mutuamente como iguais.
• Nesse contexto produziu-se a Paz de Vestfália
em 1648. Esse acordo configurou o Princípio da
Soberania como poder supremo, legítimo,
confirmado pelo reconhecimento de outros
Estados. Foi assim que tanto no direito
constitucional como no direito internacional
evidenciou-se principalmente nas relações
internacionais entre Estados.
• A lógica do sistema de Wetfália - onde cada
Estado é a única autoridade legítima sobre o
seu território - manteve o cenário
internacional equilibrado até o início do
século XX.
• Não obstante conciliar a intensificação das
relações internacionais com tal autonomia
política de cada ator, o ambiente
internacional era um sistema de ordem
descentralizada com base na reciprocidade,
sob a égide dos princípios internacionais
estabelecidos para a regulação do
relacionamento entre os Estados.
4. O pós Vestfália e o sistema
internacional
• Gilberto Maringoni
• UFABC 2014
Bibliografia da aula
• Pecequilo, Cristina. Manual do candidato
– Política internacional (Funag, 2009) págs. 17 a 27
• Bull, Hedley. A sociedade anárquica
(Funag, 1977), págs. 7 a 35
• Dicionário de Relações Internacionais,
(Afrontamento, 2005) – Verbete
“Anarquia”
Estado e nação
Manual do candidato – Política internacional (2009)
Cristina Pecequilo
• O primeiro conceito a ser apontado na
área de Relações Internacionais é o do
espaço no qual ocorrem as interações
sociais, o do Sistema Internacional (SI).
• Outros termos que podem ser indicados
como sinônimos de SI são cenário e
ambiente.
• Sua característica básica é a anarquia,
representada pela ausência de um
governo ou leis que estabeleçam
parâmetros regulatórios para estas
relações, em contraposição ao sistema
doméstico dos Estados.
• A partir deste princípio básico, a
ordem internacional é definida por
meio dos intercâmbios e choques que
se estabelecem entre os atores da
política internacional.
• O ponto de partida desta visão clássica é
o surgimento do Estado Moderno é a Paz
de Vestfalia em 1648 (o outro marco é o
Tratado de Utrecht, 1713).
• Tratados de Utrecht (1713-1715)
• O século XVIII iniciou-se e foi marcado pela
deflagração da Guerra da Sucessão Espanhola,
quando Carlos II de Espanha morreu em 1700, sem
descendência direta.
• O trono era pretendido por Filipe d'Anjou (Bourbon)
e por Carlos, da casa da Áustria (Habsburgo).
• Os opositores, de um lado, a França, em apoio a
Filipe d'Anjou; do outro, a Grande Aliança, a favor
do príncipe Carlos, formada por Grã-Bretanha,
República Neerlandesa, Prússia, Portugal e a casa
de Savóia.
• O conflito, que se estendeu entre 1702 a 1714,
envolveu a maioria das nações da Europa
ocidental.
• A questão da sucessão na Espanha foi
solucionada em favor de Filipe V, que
conservou a coroa da Espanha (1700-1746) e
as respectivas colônias, mas renunciou ao
direito de sucessão ao trono francês.
• A integridade do território francês foi preservada
e a Inglaterra recebeu importantes bases
marítimas - Gibraltar, Minorca, Terra Nova
(Newfoundland), Acádia - e obteve o direito de
abastecer as colônias da América Espanhola
com escravos negros.
• Carlos foi indicado imperador do Sacro Império RomanoGermânico, com o nome de Carlos VI da Germânia
• Sob seu pano de fundo, no entanto, várias outras questões
emergiam: a rivalidade entre a França e a Inglaterra pela
hegemonia continental (que poderia ser chamada de mundial á
época).
• O Tratado de Utrecht foi o documento que pôs fim à esse conflito,
regulamentando a paz entre as potências beligerantes, em 17131715, na cidade holandesa do mesmo nome.
• A Inglaterra ganhou da França, além da Terra Nova, a baía de
Hudson e St. Kitts e o reconhecimento da sucessão hanoveriana.
• O sul dos Países Baixos, Milão, Nápoles e Sardenha passaram à
Áustria.
• A França restituiu conquistas recentes, mas manteve tudo o que
fora conseguido na Paz de Nijmegen, em 1679, além da cidade de
Estrasburgo.
• O duque de Savóia ganhou a Sicília e aumentou as
fronteiras do norte da Itália.
• Os holandeses asseguraram, junto ao governo
austríaco, o direito de guarnecerem fortalezas no sul dos
Países Baixos.
• A Inglaterra obteve conquistas navais, comerciais e
coloniais significativas, assumindo posteriormente um
papel preponderante no que diz respeito às questões de
ordem mundial.
• Em 1713 foi reconhecida a soberania de Portugal sobre
as terras da América Portuguesa, compreendidas entre
os rios Amazonas e Oiapoque. Em 1715 acordou-se a
restituição aos portugueses da Colônia do Sacramento.
• Consequências:
• - Pôs termo à hegemonia francesa. nivelando as
forças européias;
• - Beneficiou principalmente a Inglaterra (que
adquiriu novas colônias e novos privilégios
comerciais);
• - Fez passar para o primeiro plano da cena
política européia duas potências até aí
secundárias, a Prússia e a Sabóia.
• - No Brasil, definições de fronteiras ao norte e ao sul
•
•
Crsitina Pecequilo:
Avaliando o SI a partir desta visão, três características
definem este ambiente:
1. A sua dimensão global e fechada, resultante do
processo de expansão do mundo ocidental iniciada
pelas potências portuguesa e espanhola nos séculos
XV e que atingiu no século XX o limite de todo os fluxos
e Estados que compõem o SI;
2. A heterogeneidade que corresponde às diferenças
entre os atores que ocupam o espaço internacional, a
diversidade destes mesmos atores (Estados, OIGs e
FTs) e dos fenômenos que ocorrem no ambiente global
(igualmente conhecidas como forças que se
subdividem em naturais, demográficas, econômicas,
tecnológicas e ideológicas); e, por fim,
3. A estrutura, que representa a ordem do SI, ou seja, o
Equilíbrio de Poder (EP) que se estabelece entre os
Estados e define uma determinada hierarquia.
• OIGs - Organizações Internacionais
Governamentais – Formadas por Estados,
as OIGs são as instituições multilaterais
de diversas abrangências, como a ONU,
OEA, Unasul, FMI etc.
• FTs - Forças Transnacionais – Pertencem
à categoria dos atores não estatais, como
empresas transnacionais, ONGs etc.
Ao longo da história, três tipos de ordem
podem ser encontradas:
• A unipolar, com a proeminência de um pólo de
poder (Império Romano); a bipolar, com a
existência de dois pólos principais (Guerra Fria,
1947/1989 entre EUA e URRS); e
• A multipolar composta por diferentes pólos.
Como indicado, o “tipo ideal do EP” foi o
Concerto Europeu de 1815 a 1914, composto
pelos pólos França, Grã-Bretanha, Prússia
(Alemanha depois de 1870 com a unificação),
Rússia e Império Austro-Hungaro
Estados
• Unidades políticas centralizadas surgidas a
partir da Paz de Vestfalia em 1648,
contrapondo-se às instâncias fragmentadas e
não seculares da Idade Média.
• Os princípios básicos do Estado Moderno são a
territorialidade com base em fronteiras
definidas, a soberania política sobre este
território, constituindo um governo organizado, e
a existência de uma população que habita este
espaço geográfico.
• Juridicamente, os Estados reconhecem-se
mutuamente, respeitando seus limites
territoriais (respeito aos princípios de nãointervenção e não-ingerência), e
estabelecem relações diplomáticas entre
si. Em síntese, três componentes
materiais compõem estas unidades
políticas, o território, a população e o
governo.
• Todos os Estados são, portanto,
soberanos dentro de seu determinado
território.
• Ainda que os Estados sejam iguais de direito,
não o são de fato. As diferenças referem-se a
suas histórias (processo de construção e idade
como Estados Vestfalianos), constituições
domésticas (regimes, formas de governo e
dinâmica dos atores da sociedade civil e a seus
recursos de poder.
• À medida que o poder é um elemento essencial
da política (seja ela doméstica ou internacional),
a posse destes recursos por um determinado
Estado delimita sua capacidade de atuação e
projeção no sistema e sua medida de
vulnerabilidade. Estes elementos correspondem
ao nível de autonomia.
Ainda o pós-Vestfália
A evolução da sociedade internacional (1977)
Adam Watson (1914-2007)
• A ordem de Vestfália, negociada pelos
governantes soberanos, legitimou uma
colcha de retalhos de independências na
Europa. As fronteiras que separavam os
Estados daqueles soberanos eram
claramente desenhadas com uma linha
grossa e o que acontecesse dentro
daquela linha era de competência
exclusiva daquele Estado.
• A soberania, sobretudo
quando aplicada aos
principados do império
legitimava a extensão de cujus
régio efus religio ("Tal
príncipe, sua religião"). A
ruptura da Igreja universal
agora se refletia na ruptura da
estrutura laica da Europa.
• Em sua ênfase no caráter separado dos
Estados europeus, em vez de sua unidade da
cristandade e em sua rejeição a qualquer idéia
de que um papa ou imperador tivesse alguma
autoridade universal, ou de que um Estado
dominante pudesse ditar os acordos para os
outros, os acordos de Vestfália foram antihegemônicos.
• Em todas essas questões, os acertos refletiram
as visões de seus arquitetos, a França, a Suécia
e a Holanda, que eram potências protestantes
ou seguiam uma política chamada de
protestante.
• A ordem de Vestfalia foi imposta
pelos vencedores sobre os
vencidos e os objetivos da
coalizão vencedora tornaram-se o
direito público da Europa.
• Os Habsburgos foram obrigados
a abandonar seus objetivos
estratégicos. O papa,
compreensivelmente, denunciou
o acordo como inválido e risível.
• “O século XVII assistiu ao efetivo
estabelecimento de uma Europa
de Estados legitimamente
independentes que se
reconheciam uns aos outros
como tais. (...) cada Estado,
especialmente aqueles mais
poderosos, sentia-se obrigado a
levar em conta as ações dos
demais.”
• “Eles reconheciam que,
uma vez que as limitações
medievais haviam
desaparecido ou haviam se
tornado irrelevantes, novas
regras e procedimentos
eram necessários para
regular suas relações.”
Hedley Bull
A sociedade anárquica (1977)
• O ponto de partida das relações internacionais é a
existência de Estados. comunidades políticas
independentes, cada uma das quais possui um governo
e afirma a sua soberania com relação a uma parte da
superfície terrestre e a um segmento da população
humana.
• De um lado, os Estados têm, com relação a esse
território e a essa população, o que poderíamos chamar
de "soberania interna", ou seja, a supremacia sobre
todas as demais autoridades dentro daquele território e
com respeito a essa população; de outro, detêm o que
se poderia chamar de "soberania externa", que consiste
não na supremacia mas na independência com respeito
às autoridades externas.
• A soberania dos Estados, interna e externa,
existe tanto no nível normativo como no factual.
• Os Estados não só afirmam a sua soberania
interna e externa como na prática exercem
efetivamente, em graus variados, essa
supremacia interna e independência externa.
• A comunidade política independente que
simplesmente afirma o direito à soberania (ou é
julgada soberana por outros), mas não pode
exercer na prática esse direito não é
propriamente um Estado.
• As comunidades políticas independentes que de acordo
com este critério são ou foram Estados incluem cidadesestado, como os da antiga Grécia ou da Itália
renascentista, e os modernos Estados nacionais.
• Abrangem Estados cujos governos se baseiam no
princípio da legitimidade dinástica, como os que
predominavam na Europa moderna até a época da
Revolução Francesa, assim como Estados em que o
governo se baseia nos princípios da legitimidade popular
ou nacional, como os que têm predominado na Europa
depois daquela época.
• Incluem Estados multinacionais, como os impérios
europeus do século XIX, e Estados de uma única
nacionalidade; Estados de território dividido, como os
Estados imperiais oceânicos da Europa Ocidental, e
aqueles cujo território representa uma única entidade
geográfica.
• Há também uma grande variedade de
comunidades políticas independentes que
existiram ao longo da história sem serem
Estados no sentido aqui definido.
• Por exemplo: os povos germânicos da
Idade das Trevas eram comunidades
políticas independentes, mas embora os
seus governantes exercessem
supremacia sobre uma população, não a
afirmavam sobre um território definido.
• Os reinos e principados da Cristandade
Ocidental, na Idade Média, não eram
Estados, pois não possuíam soberania
interna, porque não tinham supremacia
sobre outras autoridades no seu território
e dentro da sua população; e também não
possuíam soberania externa, porque não
eram independentes do papa ou, em
certos casos, do imperador do Sagrado
Império Romano.
• Antes da chegada dos europeus, havia em certas
regiões da África, da Austrália e da Oceania comunidades políticas independentes unidas pelos laços
de linhagem ou parentesco, nas quais inexistia uma
instituição que atuasse como governo.
• Essas entidades não recaíam no âmbito das "relações
internacionais", se por tal expressão queremos designar
(como é habitual) não as relações entre nações, mas as
relações entre Estados, no sentido estrito.
• As relações dessas comunidades políticas
independentes poderiam ocupar um lugar dentro de uma
teoria mais ampla das relações dos poderes, de que as
relações entre os Estados constituiria um caso especial;
mas o fato é que elas se situam fora do domínio estrito
das "relações internacionais."
O conceito de ordem
na política internacional
• Um sistema de Estados (ou sistema
internacional) se forma quando dois ou mais
Estados têm suficiente contato entre si, com
suficiente impacto recíproco nas suas decisões,
de tal forma que se conduzam, pelo menos até
certo ponto, como partes de um todo.
• Naturalmente, dois ou mais Estados podem
existir sem formar um sistema internacional,
neste sentido.
• Um exemplo é o das comunidades políticas
independentes que existiam no continente
americano antes da chegada de Cristóvão
Colombo; essas comunidades não formavam
um sistema internacional com os Estados
europeus.
• As comunidades políticas independentes que
havia na China durante o período dos Estados
beligerantes (481-221 a.C.), não formavam um
sistema internacional com os Estados existentes
na mesma época na Grécia e no Mediterrâneo,
• Mas quando os Estados mantêm contato regular
entre si, e quando, além disso, a sua interação é
suficiente para fazer com que o comportamento
de cada um deles seja um fator necessário nos
cálculos dos outros, podemos dizer que eles
formam um sistema.
• A interação dos Estados pode ser direta
(quando são vizinhos, parceiros ou competem
pelo mesmo fim) ou indireta (em conseqüência
do relacionamento de cada um com um
terceiro), ou simplesmente pelo impacto deles
sobre o sistema.
• Assim, o Nepal e a Bolívia não são vizinhos,
competidores ou parceiros em qualquer
empreendimento comum (exceto talvez como membros
das Nações Unidas), mas eles se influenciam
mutuamente por meio da cadeia que vincula outros
Estados, a que ambos estão presos.
• A interação dos Estados que define um sistema
internacional pode ter a forma de cooperação ou de
conflito, ou mesmo de neutralidade ou indiferença
recíprocas com relação aos objetivos de cada um. Essa
interação pode abranger toda uma gama de atividades políticas, estratégicas, econômicas, sociais -, como
acontece hoje, ou apenas uma ou duas delas.
• Conforme implicado na definição de sistema
internacional proposta por Raymond Aron, basta que as
comunidades políticas independentes em questão
"mantenham regularmente relações entre si", e que
"sejam todas capazes de estar implicadas em uma
guerra generalizada".
• Existe uma "sociedade de Estados" (ou "sociedade
internacional") quando um grupo de Estados,
conscientes de certos valores e interesses comuns,
formam uma sociedade, no sentido de se considerarem
ligados, no seu relacionamento, por um conjunto comum
de regras, e participam de instituições comuns.
• Se hoje os Estados formam uma sociedade
internacional é porque, reconhecendo certos interesses
comuns e talvez também certos valores comuns, eles se
consideram vinculados a determinadas regras no seu
inter-relacionamento, tais como a de respeitar a
independência de cada um, honrar os acordos e limitar o
uso recíproco da força. Ao mesmo tempo, cooperam
para o funcionamento de instituições tais como a forma
dos procedimentos do direito internacional, a maquinaria
diplomática e a organização internacional, assim como
os costumes e convenções da guerra.
• Nesta acepção, uma sociedade internacional
pressupõe um sistema internacional, mas pode
haver um sistema internacional que não seja
uma sociedade.
• Em outras palavras, dois ou mais Estados
podem manter contato entre si, interagindo de
tal forma que cada um deles represente um
fator necessário nos cálculos do outro, sem que
os dois tenham consciência dos interesses e
valores comuns, mas percebendo que estão
ambos sujeitos a um conjunto comum de regras,
ou cooperando para o funcionamento das
instituições comuns.
• Assim, por exemplo, Turquia, China, Japão,
Coréia e Sião (atual Tailândia) eram parte de
um sistema internacional dominado pela Europa
antes de integrarem uma sociedade
internacional também dominada pela Europa.
• Em outras palavras: esses países mantinham
contato com as potências européias e
interagiam com elas em grau significativo no
comércio e na guerra antes de reconhecer,
juntamente com aquelas potências, interesses
ou valores comuns, admitindo que estavam
todos sujeitos às mesmas normas e
cooperavam para o funcionamento de
instituições comuns.
• Quando os Estados participam de um
mesmo sistema internacional, mas não de
uma sociedade internacional, como no
caso dos contatos entre Estados europeus
e não-europeus, do século XVI até o fim
do século XIX, pode haver comunicação
entre eles, acordos, troca de diplomatas
ou de mensageiros, não só a respeito do
comércio mas da paz, da guerra e de
alianças. Mas em si mesmas essas
formas de interação não demonstram a
existência de uma genuína sociedade
internacional.
• Pode haver comunicação, acordos e
troca de representantes sem que haja
a percepção de interesses ou valores
comuns, que confiram a essas trocas
substância e uma perspectiva de
permanência, sem que se
estabeleçam regras a respeito do
modo como tal interação deva
prosseguir, e sem a tentativa de
cooperar em instituições nas quais
haja de fato um interesse comum.
• Quando Cortez e Pizarro encontraram os
monarcas asteca e inca, quando George
III (1738-1820) enviou lorde Macartney a
Pequim, ou quando os representantes da
Rainha Vitória entraram em acordo com
os chefes maori, o Sultão de Socoto ou o
Cabala de Uganda, isso ocorreu fora do
quadro de qualquer concepção
compartilhada de uma sociedade
internacional de que os dois lados fossem
membros, com os mesmo direitos e
deveres.
• Na verdade a sociedade internacional
tem tratado a preservação da
independência dos Estados como um
objetivo subordinado à preservação
da própria sociedade internacional, o
que reflete o papel predominante
desempenhado pelas grandes
potências na formação dessa
sociedade, de que elas se
consideram guardiães.
• Assim, a sociedade internacional permite
muitas vezes a extinção da independência
de Estados individuais, como acontece
nos processos de partição e absorção das
pequenas potências pelas potências
maiores, em nome de princípios tais como
"compensação" e "equilíbrio de poder", o
que levou ao declínio contínuo do número
de Estados europeus, a partir da Paz de
Vestfália, de 1648, até o Congresso de
Viena de 1815.
• Da mesma forma, pelo menos na
perspectiva das grandes potências, que
se consideram seus guardiães, a
sociedade internacional trata a questão da
independência dos Estados, considerados
individualmente, como sujeita à
preservação do sistema, tolerando e
estimulando a limitação da soberania ou
independência dos pequenos Estados
mediante recursos como os acordos que
definem esferas de influência ou criam
Estados tampões ou neutralizados.
• A real instituição do equilíbrio de
poder, no sentido de um esforço
consciente para evitar a
preponderância de qualquer estado
em particular, começou a ser
desenvolvida na coalizão contra
Filipe lI, e sua preservação foi um
objetivo implícito da Paz de Westfália
de 1648, que marcou o fim das
prctensões dos Habsburgos a uma
monarquia universal.
• Mas só muito mais tarde, na época da luta
contra Luís XIV, o equilíbrio de poder foi
admitido pela teoria internacional como
uma instituição da sociedade
internacional, e os vários autores do
período precedente que contribuíram para
o desenvolvimento dessa concepção
pertenciam a uma distinta tradição de
comentaristas políticos e históricos, cujas
observações não se integravam à teoria
do direito natural da sociedade
internacional.
• Sustenta-se em geral que a existência da
sociedade internacional é desmentida em
razão da anarquia, ou seja, da ausência
de governo ou de regras. É óbvio que, ao
contrário dos indivíduos que vivem no seu
interior, os Estados soberanos não estão
sujeitos a um governo comum, e que
neste sentido existe uma "anarquia
internacional" - expressão que
Goldsworthy Lowes Dickinson (18621932) tornou famosa.
• No moderno debate sobre as
relações internacionais um tema
persistente tem sido o fato de
que, devido a essa anarquia, os
Estados não formariam na
verdade um tipo de sociedade, o
que só poderia acontecer se eles
estivessem sujeitos a uma
autoridade comum.
Anarquia nas relações Internacionais
Dicionário de Relações Internacionais
• Característica definidora da política
internacional e do sistema vestfaliano de
Relações Internacionais, onde não existe um
poder soberano superior que regule as
entidades do sistema.
• Anarquia, então, é a inexistência de um centro
regulador de poder hierárquico, com capacidade
de definir e impor normas e condutas que
obrigue as unidades do sistema internacional.
Assim, a política internacional é anárquica no
sentido em que não existe um governo
internacional que governe hierarquicamente o
sistema internacional da mesma forma que
acontece no sistema nacional.
• Deste modo, o sistema internacional contemporâneo
caracteriza-se por ter uma organização anárquica, onde
as unidades principais do sistema são Estados
territoriais relativamente coesos e soberanos sem um
poder superior acima deles.
• Assim, fala-se de anarquia internacional para referir a
ausência de um soberano comum ao sistema, ao
relacionamento entre entidades sem um poder acima
delas. Ao contrário dos sistemas políticos internos, no
sistema internacional não existe um governo que
detenha o monopólio do uso legítimo da força (Max
Weber), não existe uma polícia internacional e um
tribunal internacional que administre o uso legítimo da
força.
• Nem mesmo um consenso universal e
inequívoco sobre quais os valores e normas
fundamentais que devem regular o sistema
internacional através do Direito Internacional.
• Deste modo, a anarquia internacional, mesmo a
“madura” (Barry Buzan) do final do século XX e
início do século XXI, baseia-se num sistema de
auto-ajuda e de alianças, onde uns Estados são
mais fortes do que outros e onde estes podem
ter a tentação de subjugar os mais fracos à sua
força superior.
O contrato social
(in Rousseau e as relações internacionais, Editora UnB, 2003, p. 127-129)
Jean Jacques Rousseau (1762)
Em que consiste a soberania, e o que a torna inalienável
Existe assim no Estado uma força comum que o
sustenta e uma vontade geral que o orienta; e a
soberania está constituída pela aplicação de
uma à outra.
De onde se vê que pela sua natureza o soberano
é uma pessoa moral; que só tem existência
abstrata e coletiva, e a idéia que se associa a
esse termo não pode ser vinculada a um
indivíduo. Como esta é uma das proposições
mais importantes do direito político, procuremos
esclarecê-la melhor.
• Acredito poder afirmar como
princípio incontestável que só a
vontade geral pode orientar as
forças do estado de conformidade
com o seu objetivo, que é o bem
comum. Se a oposição dos
interesses particulares tornou
necessária a criação das
sociedades civis, isso só foi
possível devido ao acordo desses
mesmos interesses.
• O vínculo social está representado pelo
que há de comum entre eles, e a
sociedade não poderia existir se não
houvesse um ponto de concordância entre
todos esses interesses.
• Ora, como a vontade tende sempre ao
bem do ser que a exerce, a vontade
particular tem sempre como objeto o bem
privado, e a vontade geral o interesse
comum, segue-se que esta última é ou
deve ser a única motivação verdadeira do
organismo social.
• Mais ainda: mesmo no caso de haver em
determinado momento uma concordância entre
duas vontades, não se poderia jamais garantir
que ela seria duradoura, e que nunca surgiria
uma oposição entre essas vontades.
• A ordem das coisas humanas está sujeita a
tantas mudanças, e os modos de pensar e de
ser mudam tão facilmente que seria temerário
afirmar que amanhã se continuará desejando o
que hoje se quer; e se a vontade geral está
menos sujeita a essa inconstância, nada pode
debelar a vontade particular.
• Assim, mesmo se o organismo social pudesse
dizer: desejo agora tudo o que deseja essa
pessoa, nunca poderia dizer, a respeito da
mesma pessoa, o que ela vai desejar amanhã, e
se esse desejo seria também o seu.
• Ora, a vontade geral que deve orientar o Estado
não é a de um tempo passado, mas a do
momento presente, e a verdadeira característica
da soberania é a necessidade de que haja
sempre concordância de tempo, lugar e efeito
entre a direção da vontade geral e o emprego
da força pública.
• Acordo com o qual não se pode continuar
contando quando uma outra vontade dispõe
dessa força.
• É bem verdade que em um Estado bem
ordenado é sempre possível inferir a duração de
um ato da vontade do povo se ele não é
prejudicado por uma ação contrária; mas é
sempre em virtude de um consentimento
presente e tácito que o ato anterior mantém a
sua eficácia.
Holanda e países baixos
José Luís Fiori
• Nos séculos XVI e XVII, a Holanda foi berço do
capitalismo comercial e da ciência moderna, e foi a
pátria de Grotius, Spinoza, Vermeer, Rembrandt,
Huygens e Sawammerdam, entre tantos outros gênios
que viveram em Amsterdam, Utrecht ou Leiden, como no
caso de Descartes ou Hobbes.
• Naquele período, a Holanda foi considerada terra por
excelência do inconformismo e da liberdade do
pensamento. E foi também o lugar onde se deu o
primeiro “milagre econômico nacional” da história do
capitalismo. Assim mesmo, costuma se dedicar pouca
atenção à história real, violenta e descontínua que está
por trás desta visão estilizada e idílica da ascensão
holandesa, e de sua revolução capitalista.
• No século XVI, os Países Baixos
eram uma pequena província do
Império Habsburgo, de Carlos V e
Felipe II, retalhada por rios e canais,
e ocupada por uma rede compacta
de cidades.
• Naquele período, suas cidades
costeiras funcionaram como um dos
entrepostos mercantis do império
espanhol, com um comércio de baixo
valor agregado e pouco impacto
sobre toda a economia da Província.
• A partir de 1540, entretanto, o
pequeno território holandês foi
transformado no epicentro
geopolítico e militar da guerra
entre o Império Espanhol e a
França, que começou na Itália, no
final do século XV, e se
prolongou durante quase todo o
século XVI.
• A partir deste momento, aumentou
enormemente a pressão tributária e a opressão
política e religiosa dos espanhóis sobre sua
província, provocando uma reação cada vez
mais violenta, que se transformou em
insurreição nacional, a partir de 1572.
• Seguiram-se 80 anos de resistência e luta, até o
reconhecimento espanhol da independência
holandesa, na Paz de Vestfália, em 1648.
Nestes 80 anos, as Províncias Unidas viveram
cercadas e em estado permanente de guerra,
dentro do seu próprio território.
• Em 1585, a situação havia se
deteriorado de tal forma que
Amsterdam chegou a oferecer
a soberania holandesa, aos
Reis da França e da
Inglaterra, e viveu dois anos
como protetorado da Rainha
Elizabeth I.
• Mas em 1590, este cenário mudou de forma
súbita e radical. Amsterdam centralizou o poder
e impôs sua hegemonia dentro da federação, e
em seguida fez um enorme esforço fiscal e
organizou em poucos anos um dos maiores e
mais eficientes exércitos da Europa, iniciando
uma ofensiva militar impressionante e vitoriosa
que conquistou 43 cidades e 55 fortalezas
espanholas, em menos de 10 anos.
• Em seguida criou um anel protetor de cidades
fortificadas e militarizadas, e manteve sua
ofensiva até o estabelecimento de uma trégua
de 12 anos, com a Espanha, entre 1609 e 1621.
• O que chama a atenção é que foi exatamente
neste período da ofensiva vitoriosa da revolução
que se deu o chamado “milagre econômico
holandês”, com o aumento exponencial dos
seus gastos e investimentos, do seu comércio
de alto valor, da sua indústria e da sua inovação
tecnológica, da sua finança e da sua integração
econômica nacional.
• Foram 15 anos de expansão acelerada, e só no
final deste período se pode falar de comércio de
longa distância, e de império colonial, que
começam com a criação da Companhia das
Índias Orientais, em 1602.
• Além disto, foi neste mesmo período
que a Holanda completou sua
“revolução financeira” com a criação de
um mecanismo de financiamento de
suas guerras, através de um “motor”
revolucionário de multiplicação nacional
da riqueza financeira, alimentado pelos
seus títulos da dívida pública de longo
prazo, negociados na bolsa de valores
e transformados na base do sistema de
crédito holandês.
• Fernand Braudel afirma que os primeiros
mercados e economias nacionais, que
nasceram na Europa, não foram uma obra
espontânea ou expansiva da divisão do
trabalho provocada pela tendência dos
indivíduos à troca de mercadorias: foram
uma obra do poder e uma estratégia
política do Estado, que recortou e extraiu
o novo “espaço econômico” de um
conjunto mais amplo e preexistente, que
Braudel chamou de “economia-mundo
européia”.
Karl Marx descreve esse mesmo momento do
nascimento da economia nacional
inglesa no Capítulo XXIV do Capital, em que
trata do processo da acumulação originária:
• “As diversas etapas da acumulação originária tiveram
seu centro, por ordem cronológica mais ou menos
precisa, na Espanha, Portugal, Holanda, França e
Inglaterra. Mas foi na Inglaterra, em fins do século XVII,
que esse processo se resumiu e sintetizou
sistematicamente no “sistema colonial”, no “sistema
dadívida pública”,no “moderno sistema tributário” e no
“sistema protecionista”.
• Em grande medida, todos esses métodos se baseiam na
mais avassaladora das forças.Todos eles se valem do
poder do Estado”.
4. A Revolução Francesa e
a Época Napoleônica;
Gilberto Maringoni
UFABC - 2014
A evolução da sociedade internacional
Adam Watson
• O século XVIII, do acordo de Utrecht – 1714, que
colocou fim à disputa pela sucessão espanhola – até a
Revolução Francesa, foi um período de progresso e
ordem na Europa. Uma sociedade internacional de
Estados – ou de príncipes – funcionava bem, com
governantes e instituições e com pressupostos básicos
que seus membros aceitavam.
• Houve guerras entre Estados, mas não foram conflitos
com grandes causas religiosas ou disputas
hegemônicas entre os Estados. Eram guerras menores,
de ajuste.
• “O século XVIII não era um tempo de estagnação
econômica, mas representou um longo período de
expansão demográfica, de urbanização crescente e de
fábricas e comércio em expansão”. (Hobsbawm)
• O equilíbrio de poder tornou-se uma prática viável para
os estadistas do século XVIII. O sistema funcionava em
torno de cinco Estados principais: França, Áustria, GrãBretanha, Prússia e Rússia.
• A Turquia otomanacontinuava a ser parte do sistema,
porém fora da regras institucionais dominantes, o que a
colocava em posição secundária. O século XVII foi o
tempo da razão e das luzes, de acordo com seus
líderes, que estabeleceram a partir disso, regras
mínimas do direito internacional. Sustentava-se que as
sociedades humanas eram contratos sociais que
existiam para proteger interesses individuais de seus
membros.
• O direito internacional diferia do direito interno, onde
havia regras e autoridades claras.
• Uma das instituições organizadoras
da comunidade internacional
(européia) do século XVIII foi um
diálogo diplomático, multilateral e
contínuo.
• A inovação italiana de realizar negócios
entre príncipes por intermédio de uma
rede de agentes residentes foi
desenvolvida pelas cortes espanhola e
francesa, atingindo o clímax com a
complexa diplomacia de Luís XVI (16541715).
Linhagens do Estado absolutista
Perry Anderson
• As monarquias centralizadas da França,
Inglaterra e Espanha representavam uma
ruptura decisiva com a soberania
piramidal e parcelada das formações
sociais medievais, com seus sistemas de
propriedade e vassalagem. Para Friedrich
Engels, “A condição básica da velha
monarquia absoluta era um equilíbrio
entre a aristocracia fundiária e a
burguesia”. Em suma, era um Estado
burguês em formação.
• As monarquias absolutas introduziram os
exércitos regulares, uma burocracia
permanente, o sistema tributário nacional,
a codificação do direito e os primórdios de
um mercado unificado.
• Para Althusser, “O regime político da
monarquia absoluta é apenas a nova
forma política necessária à manutenção
da dominação e da exploração feudais, no
período de desenvolvimento de uma
economia mercantil”.
• Pode-se dizer que as monarquias
absolutas foram a forma políticoinstitucional encontrada pelas classes
dominantes – nobreza feudal e burguesia
ascendente – para centralizar o Estado e
potencializar o desenvolvimento do
capitalismo mercantil.
• Para Engels, “a ordem política
permaneceu feudal, ao passo que a
sociedade tornava-se cada vez mais
burguesa”.
• Mas o afloramento de uma
contradição estrutural gerou, ao longo
do tempo, instabilidades
incontornáveis no funcionamento do
Estado absolutista: a intensificação
da propriedade privada na base
contrapôs-se ao incremento da
autoridade política no topo,
corporificada no poder discricionário
do monarca. Esta contradição está na
base da ruptura representada pela
Revolução Francesa.
Dicionário de política
Norberto Bobbio
• O absolutismo como forma específica de organização do poder
• Surgido talvez no século XVIII, mas difundido na
primeira metade do século XIX, para indicar nos círculos
liberais os aspectos negativos do poder monárquico
ilimitado e pleno, o termo-conceito Absolutismo
espalhou-se desde esse tempo em todas as linguagens
técnicas européias para indicar, sob a aparência de um
fenômeno único ou pelo menos unitário, espécies de
fatos ou categorias diversas da experiência política.
• Tais variantes expressavam-se ora (e em
medida predominante) com explícita ou
implícita condenação dos métodos de
Governo autoritário em defesa dos
princípios liberais, ora, e bem ao contrário
(com resultados qualitativa e até
quantitativamente eficazes), com ares de
demonstração da inelutabilidade e da
conveniência se não da necessidade do
sistema monocrático e centralizado para o
bom funcionamento de uma unidade
política moderna.
• De um ponto de vista descritivo, podemos partir
da definição de Absolutismo como aquela forma
de Governo em que o detentor do poder exerce
este último sem dependência ou controle de
outros poderes, superiores ou inferiores.
• O Absolutismo se diferencia de forma clara
da tirania.
• Trata-se de um regime político constitucional
(no sentido de que seu funcionamento está
sujeito a limites e regras preestabelecidas), não
arbitrário (enquanto a vontade do monarca não
é ilimitada) e sobretudo de tradições seculares e
profanas.
• O Absolutismo do poder monárquico é
alcançado, ao menos em teoria, na medida em
que o príncipe não encontra mais limites para o
exercício de seu poder nem dentro nem fora do
Estado nascente.
• Ele não é mais súdito de ninguém e reduziu a
súditos todos aqueles que estão debaixo de
suas ordens. Delineou-se, na verdade, em seus
traços essenciais, o novo e indiscutível princípio
de legitimidade do príncipe no Estado: o
princípio de soberania. Significa também a
secularização do poder ( a separação da
religião).
A era das revoluções
Hobsbawm
• O mundo de 1789 era essencialmente
rural e é impossível entendê-lo sem
assimilar esse fato fundamental. Em
países como a Rússia e a Escandinávia,
cerca de 90 a 97% da população era rural
• Havia apenas duas cidades européias que
poderiam ser consideradas grandes,
Londres, com um milhão de habitantes, e
Paris, com 500 mil. Vinte outras tinham
cerca de 100 mil habitantes. Havia uma
multiplicidade de pequenos lugarejos e
aldeias.
• Era um mundo no qual estavam vivas
ainda as marcas do mundo feudal. Mesmo
em regiões dominadas por relações mais
capitalistas, a terra era privilégio de
poucos senhores que administravam
enormes latifúndios.
• Ali, a relação social fundamental era a de
servidão. À diferença da escravidão, o
regime de servidão não tornava o
camponês propriedade do senhor. No
entanto, a relação era de total submissão,
pois as terras eram sempre do senhor.
• Essa situação gerava uma
contradição com a organização e a
centralização do Estado baseado no
avanço das relações capitalistas de
produção.
• A posse da terra dava ao senhor e
sua família privilégios políticos e
sociais e acesso aos mais altos
postos do Estado. Era inconcebível
existir um nobre sem a posse de uma
grande propriedade.
• Embora essa ordem feudal fosse obsoleta
em termos econômicos, ela seguia viva e
ativa em termos políticos.
• Para garantir seus privilégios em tempos
de decadência, os nobres expulsavam
todos os mal nascidos de todos os cargos
rendosos no Estado. Ou seja, havia um
claro choque entre a tendência à
profissionalização dos negócios de Estado
e o poder político do feudalismo
remanescente.
• A ideologia principal desse mundo era o
iluminismo.
Dicionário de política
Norberto Bobbio
Iluminismo
• O termo Iluminismo indica um movimento de idéias que
tem suas origens no século XVII (ou até talvez nos
séculos anteriores, nomeadamente no século XV,
segundo interpretação de alguns historiadores), mas
que se desenvolve especialmente no século XVIII,
denominado por isso o "século das luzes".
• Esse movimento visa estimular a luta da razão contra a
autoridade, isto é, a luta da "luz" contra as "trevas". Daí
o nome de Iluminismo, tradução da palavra alemã
Aufklärung, que significa aclaração, esclarecimento,
iluminação. O Iluminismo é, então, uma filosofia militante
de crítica da tradição cultural e institucional; seu
programa é a difusão do uso da razão para dirigir o
progresso da vida em todos os aspectos.
• Não se trata de um movimento
homogêneo; não é possível encontrar nele
um sistema de idéias ou uma escola; dirse-ia que é, acima de tudo, uma
mentalidade, uma atitude cultural e
espiritual, que não é somente dos
filósofos, mas de grande parte da
sociedade da época, de modo particular
da burguesia, dos intelectuais, da
sociedade mundana e até de alguns
reinantes.
• Este modo de pensar e de sentir
é difundido, no século XVIII, em
muitos países da Europa.
• Suas primeiras manifestações se
encontram na Inglaterra e na
Holanda, mas é um movimento
que interessa especialmente à
França, onde a decadência do
Governo absolutista leva a
filosofia a focalizar a doutrina
política e social.
• Aqui, das classes privilegiadas, o clero
possui cerca de um quinto do território
nacional, com uma enorme renda e com
isenções e privilégios substanciais, e a
nobreza tem privilégios análogos e rendas
feudais extraordinárias; por isso, a
burguesia, cuja cultura e importância
econômica aumentaram
consideravelmente, a ponto de se haver
tornado um sustentáculo da sociedade,
não pode deixar de considerá-las classes
de parasitas.
• A insistência dos iluministas sobre a natureza e
o espírito das leis e das Constituições deriva do
temor do perigo sempre presente do despotismo
e do culto genuíno da liberdade civil e política,
que para eles tem o significado inequívoco de
que a obrigação se acha expressa e, ao mesmo
tempo, limitada na lei.
• Embora profundamente diversos em suas
doutrinas, Montesquieu, Voltaire, Rousseau e
Diderot acreditam firmemente em tal princípio.
Os temas ligados à reforma judiciária são objeto
de atenta reflexão.
• A filosofia do Iluminismo é a filosofia da
burguesia. O burguês é o homem novo, que luta
pelas reformas progressivas contra o
obscurantismo e os privilégios da aristocracia e
do clero.
• Sua filosofia é a filosofia da libertação, isto é, de
um ideal realizado intelectualmente, mas não
socialmente. A liberdade de comércio, a
abolição dos privilégios e das imunidades das
outras duas classes, a divulgação da cultura, a
revisão do sistema fiscal, etc, são os motivos da
filosofia do século XVIII, mas são especialmente
as aspirações da burguesia.
O capitalismo americano
José Luís Fiori
• Os Estados Unidos foram o primeiro estado nacional
que nasceu fora da Europa, mas não fora do sistema
geopolítico e econômico europeu.
• Pode-se dizer inclusive, que a “Guerra da
Independência” americana foi, em grande parte, um
capítulo da disputa entre a Inglaterra e a França pela
supremacia mundial. E sua conquista definitiva ocorreu
entre as duas grandes guerras (“Dos 7 Anos” e
“Bonapartista”) que definiram a hierarquia de poder
internacional, e a supremacia inglesa, dentro e fora da
Europa, a partir de 1815.
• Os EUA acabaram se transformando no único estado
nacional extra-europeu que nasceu de um império e de
uma economia em plena expansão vitoriosa.
• Mais do que isto, durante a chamada “revolução
industrial” que transformou os Estados Unidos –
imediatamente - na primeira periferia “primárioexportadora” de sucesso da economia industrial inglesa.
• Situação econômica privilegiada que se consolidou e
expandiu durante todo o século XIX, antes e depois da
Guerra de Secessão, enquanto a Inglaterra abria
espaços de expansão comercial para sua ex-colônia, e
assumia a responsabilidade – em alguns momentos por cerca de 60% do investimento direto dentro de todo
o território norte-americano, que passou a fazer parte de
uma espécie de “zona de co-prosperidade” anglosaxônica , ou mesmo, num caso avant la lettre, de
“desenvolvimento a convite”, da Inglaterra.
• O desenvolvimento econômico
dos EUA não foi uma exceção,
pelo contrário, foi uma parte
essencial da expansão e das
contradições do sistema
inter-estatal e do capitalismo
europeu.
Internacionalismo, um breviário
Perry Anderson
• As origens do sentimento moderno de
nacionalismo como força secular
remontam ao século XVIII. Foi nesse
período que eclodiram as duas maiores
revoluções que originaram a primeira
concepção ideológica da nação tal como a
compreendemos hoje – a rebelião das
colônias norte-americanas contra a GrãBretanha e a derrubada do absolutismo na
França.
• As revoluções americana e francesa, que efetivamente
forjaram nossa idéia de nação como uma coletividade
popular, foram produtos das sociedades que estavam
entre as mais avançadas de seu tempo: suas ideologias
marcaram uma dramática ruptura com as visões de
mundo que haviam inspirado revoluções européias
anteriores nos Países Baixos no século XVI e na
Inglaterra no século XVII, ambos levantes
profundamente religiosos, feitos em nome de deus tanto
ou mais que em nome do povo.
• No entanto, as revoluções francesa e americana
ocorreram num mundo ainda anterior à Revolução
Industrial; um mundo no qual o capital continuava
basicamente comercial ou agrário.
• Justamente por este motivo, as elites
de cada país eram tipicamente
capazes de mobilizar produtores
diretos nas cidades e no campo – ou
seja, massas populares, compostas
principalmente de artesãos e
agricultores.
• Ainda não havia, como fato social
geral, aquele abismo social entre
manufatureiros e trabalhadores,
criado mais tarde pelas indústrias.
Idade contemporânea
• A passagem do século XVIII para o século XIX inaugura
o que, convencionalmente, se denomina de história
contemporânea.
• Depois de quase quatro séculos de acumulação de
capital, de comércio colonial, de sucessivas guerras
hegemônicas e contra-hegemônicas, da desestruturação
do feudalismo, da expansão da linguagem escrita e do
ensino, da lenta conquista e subjugação de outras
civilizações, a Europa teve de enfrentar uma profunda
transformação de seu processo histórico, que reafirmava
tendências anteriores.
• Assim, o desenvolvimento da burguesia desencadeou
as duas grandes revoluções, a Francesa e a Industrial,
que marcaram o início de uma nova era.
• Entretanto, a vitória da burguesia trazia
consigo também diversas contradições.
• A ideologia libertadora, impulsionada pelo
iluminismo liberal, impulsionou a
radicalização do pensamento e da prática
social.
• Assim, o século XIX conviveu com novas
e velhas tendências, que disputavam a
hegemonia da Europa, como chave para a
hegemonia do mundo.
A era das revoluções
Hobsbawm
• O principal objetivo do Iluminismo era
“Libertar o indivíduo das algemas que o
agrilhoavam, representado pelo
tradicionalismo ignorante da Idade Média,
da superstição das Igrejas, da
iracionalidade que dividia os homens em
uma hierarquia de patentes mais baixas e
mais altas, de acordo com o nascimento
ou algum outro critério irrelevante. A
liberdade, a igualdade e a fraternidade
eram seus slogans.
Revolução Francesa
• É o nome dado aos processos políticos e sociais que,
entre 5 de Maio de 1789 e 9 de Novembro de 1799,
alteraram o quadro político e social da França. Em
causa estavam o Antigo Regime (Ancien Régime) e a
autoridade do clero e da nobreza. Foi influenciada pelos
ideais do Iluminismo e da Independência Americana
(1776).
• A Revolução é considerada como o acontecimento que
deu início à Idade Contemporânea. Aboliu a servidão e
os direitos feudais na França e proclamou os princípios
universais de "Liberdade, Igualdade e Fraternidade".
• A Revolução Francesa foi o momento
em que o pensamento político
iluminista da Europa foi colocado em
prática, com a ascensão ao poder da
burguesia.
• Ao menos parte da burguesia, que
não se acomodou na mera compra
de títulos de nobreza, buscou
alcançar o poder para si, alterando a
ordem vigente. Era um projeto total,
de refundação da sociedade.
• O mundo contemporâneo foi moldado nas
duras batalhas revolucionárias francesas
do século XVIII.
• A sociedade francesa, até as vésperas da
Revolução, era dividida em três estados, os
chamados Estado Gerais:
• um primeiro, que compreendia a nobreza; o
segundo, de que faziam parte os clérigos e
• o terceiro e último, composto de todos aqueles
excluídos dos dois primeiros: a pequena
burguesia, o campesinato e a população
urbana.
Revolução Francesa - antecedentes
• Com exceção da Grã-Bretanha,
que fizera sua revolução no
século XVI, e alguns Estados
menores, as monarquias
absolutistas reinavam em todos
os Estados em funcionamento no
continente europeu.
• A religião ia lentamente sendo
confinada na esfera privada, mas
ainda provocava a stasis (sedição
e rebelião) em vários países.
•Mas a stasis
religiosa foi sendo
substituída pela
stasis social e
nacionalista.
• O despotismo esclarecido surgiu como
resposta à possibilidade de modernização
dos Estados, e atingiu as áreas mais
atrasadas, como Espanha, Portugal,
Rússia e Áustria, conseguindo conter
temporariamente o impulso pela
transformação social e política. Na
França, a falta de flexibilidade dos
governantes diante das novas exigências
sociais condicionou a revolução.
Os revolucionários franceses
dividiam-se em três alas:
1. Os girondinos, que representavam os
interesses da grande burguesia, conhecidos
também pela planície, porque sentavam à
direita da mesa diretora da Assembleia e
ficavam em uma disposição mais baixa;
2. Os jacobinos, que faziam parte do grupo mais
radical dentro da Assembleia, sentavam-se à
esquerda e no alto à mesa diretora;
3. Os sanscullotes, principalmente pequenos
proprietários que queriam aprofundar a
revolução, representando, de certo modo, a
grande maioria da população que participou da
revolta.
• As lutas internas da revolução
aprofundaram-se de tal forma que,
em um momento, as três alas
revolucionárias tornaram-se inimigas.
Com essa divisão, em breve o
vocabulário direita e esquerda
marcaria a política ocidental para
representar progressistas e
conservadores.
• De acordo com Adam Watson, a
Revolução Francesa foi o ato mais
dramático de autoafirmação da classe
média (burguesia) na história europeia.
• O Terceiro Estado derrubou o antigo
regime com uma força explosiva que
modificou profundamente as relações
entre as várias comunidades europeias,
que, desde Vestfália (1648), tinham sido
organizadas numa sociedade de Estados
semelhantes, num certo tipo de equilíbrio.
• O grande aumento de poder que a
Revolução liberou no Estado mais
importante do sistema foi reforçado pelas
ideias, colocadas em termos universais,
que ela desenvolvia e disseminava e que
eram atraentes aos equivalentes
insatisfeitos do Terceiro Estado em outros
Estados do continente europeu.
• “Em outras palavras, a Revolução
produziu e seus lideres ativamente
estimularam, uma stasis geral na Europa
a Leste da França.”
• Terminaram os privilégios da nobreza e do
clero, um primeiro passo no sentido do
igualitarismo.
• É importante lembrar que a Revolução Francesa
semeou novas ideologias na Europa, conduziu a
guerras, mas foi até certo ponto derrotada pela
tentativa de retornar aos padrões políticos,
sociais e institucionais do Antigo Regime
através de um movimento denominado de
Restauração ou Contra-Revolução. Nesse
período, o rei francês Luís XVIII outorgou a seus
súditos uma Carta Constitucional.
Causas da Revolução
• As causas da revolução são
estruturais e conjunturais.
• Entre as do primeiro grupo, há que
considerar que a França passava por
um período de crise econômica após
anos de prosperidade. A participação
francesa na guerra da independência
norte-americana, os elevados custos
da Corte de Luís XVI e a crise na
agricultura, tinham deixado as
finanças do país em mau estado.
• Os votos eram atribuídos por ordem e não
por cabeça (1- Nobreza, 2- Clero, 3 Estado ou Povo), havendo grandes
injustiças entre as antigas ordens, ficando
sempre o 3º Estado altamente prejudicado
perante a aprovação das Leis.
• Os chamados Privilegiados estavam isentos de
Impostos, apenas uma ordem sustentava o
País, deixando obviamente a Balança Comercial
negativa perante os elevados custos das
sucessivas guerras, altos cargos públicos e os
supérfluos gastos da corte do Rei Luís XVI.
A Assembleia Constituinte
• Os deputados dos três estados eram unânimes
em um ponto: desejavam limitar o poder real, à
semelhança do que se passava na vizinha
Inglaterra e que igualmente tinha sido
assegurado pelos norte-americanos nas suas
constituições.
• No dia 5 de maio, o rei mandou abrir a sessão
inaugural dos Estados Gerais e, no seu
discurso, advertiu que não se deveria tratar de
política, isto é, da limitação do poder real, mas
apenas da reorganização financeira do reino e
do sistema tributário.
• A França ainda tinha grandes
características feudais: 80% de sua
economia era agrícola.
• Quando uma grande escassez de
alimentos ocorreu devido a uma onda de
frio causada naquela região, a população
foi obrigada a mudar-se para as cidades e
lá nas fábricas eram constantemente
exploradas, e a cada ano que passava,
tornava-se mais miserável. Viviam a base
de pão preto e em casas de péssimas
condições, sem saneamento básico e
vulneráveis a muitas doenças.
• A reavaliação das bases jurídicas do
Antigo Regime foi montada à luz do
pensamento Iluminista, representada por
Voltaire, Diderot, Montesquieu, John
Locke etc.
• Eles forneceram pensamentos para
criticar as estruturas políticas e sociais
absolutistas, e sugeriram a idéia de
uma maneira de conduzir liberal
burguesa.
• As causas econômicas também eram
estruturais. As riquezas eram mal distribuídas; a
crise produtiva manufatureira estava ligada ao
sistema corporativo, que fixava quantidade e
condições de produtividade. Isso descontentou
a burguesia.
• Outro fator econômico foi a crise agrícola, que
ocorreu graças ao aumento populacional. Entre
1715 e 1789, a população francesa cresceu
consideravelmente, entre 8 e 9 milhões de
habitantes. Como a quantidade de alimentos
produzida era insuficiente e as geadas abatiam
a produção alimentícia, o fantasma da fome
pairou sobre os franceses.
A Bastilha
• No dia 14 de Julho, populares armados
invadiram o Arsenal dos Inválidos, à procura de
munições e, em seguida, invadiram a Bastilha,
uma fortaleza que tinha sido transformada em
prisão política, mas que já não era a terrível
prisão de outros tempos.
• Os rebeldes tomaram a Bastilha por causa da
pólvora que lá estava armazenada. Caiu assim
um dos símbolos do absolutismo. A Queda da
Bastilha causou profunda emoção nas
províncias e acelerou a queda dos intendentes.
Novas municipalidades e guardas nacionais
foram organizadas.
• A Revolução Francesa se deu no
mais populoso e poderoso Estado
da Europa. Em 1789, um em
cada cinco europeus era francês.
A Revolução é um marco em
todos os países. Suas
repercussões ocasionaram os
levantes que levaram à libertação
da América Latina após 1808.
• A Revolução Francesa não foi feita ou
liderada por um partido ou movimento
organizado, no sentido moderno, nem por
homens que estivessem tentando levar a
cabo um programa estruturado.
• Nem mesmo chegou a ter “líderes” como
as revoluções do século XX. Não
obstante, um surpreendente consenso de
idéias gerais entre um grupo bastante
coerente deu ao movimento uma unidade
efetiva.. O grupo era a burguesia e suas
idéias as do liberalismo clássico.
• Em 1792, a monarquia foi derrubada. Em
março de 1793, a França estava em
guerra contra a maior parte da Europa e
tinha dado início a anexações
estrangeiras (legitimada pela recéminventada doutrina do direito francês às
‘fronteiras naturais’). De 1792 a 1815,
houve guerra quase que ininterrupta na
Europa, em combinação ou
simultaneamente a outras guerras fora do
continente.
• No decorrer dessas décadas, as fronteiras políticas
européias foram redesenhadas várias vezes. A mais
importante delas foi a racionalização geral do mapa
político continental, especialmente na Alemanha e na
Itália. Em termos de geografia política, a Revolução
Francesa pôs fim à Idade Média.
• O típico Estado moderno que já estivera e
desenvolvendo por vários séculos, é uma área
inisterrupta e territorialmente coerente, com fronteiras
claramente definidas, governada por uma só autoridade
soberana e de acordo com um só sistema fundamental
de administração e de leis.
• O Sacro Império Romano acaba em 1806 e as antigas
repúblicas de Genova e Veneza desaparecem em 1897.
Paul Kennedy
• A Revolução Francesa, em 1789 é pautada
pelos princípios do liberalismo. A doutrina liberal
pregava a iniciativa individual como fator
determinante do progresso social.
• Embora a tentativa de defender o indivíduo de
abusos de diversos tipos de poder seja antiga, a
ideia de que todo ser humano teria
determinadas prerrogativas garantidoras da vida
e do livre-arbítrio surge e amadurece com a
Revolução Francesa.
• A Assembléia Nacional Constituinte aprovou a
legislação, pela qual era abolido o regime feudal
e senhorial e suprimido o dízimo. Outras leis
proibiram a venda de cargos públicos e a
isenção tributária das camadas privilegiadas. E,
para dar continuidade ao trabalho, decidiu pela
elaboração de uma Constituição.
• A pedra angular é consolidada com a aprovação
da Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão pela Assembleia Nacional francesa, em
1789.
• Seu primeiro artigo afirma que “Os
homens nascem e são livres e iguais
em direitos”.
• Em seguida, são definidos os
“direitos naturais e imprescritíveis do
homem”: a liberdade, a propriedade,
a segurança e a resistência à
opressão. Como diretiz geral, havia o
lema dos revolucionários: liberdade,
igualdade e fraternidade. Estariam
aparentemente selados o fim dos
privilégios da nobreza e do clero.
• Um tópico em especial chama a atenção:
“O princípio de toda a soberania reside,
essencialmente, na nação. Nenhuma
operação, nenhum indivíduo, pode
exercer autoridade que dela não emane
expressamente”. Ou seja, o garantidor
básico dos direitos humanos e do conceito
de cidadania é o Estado-nação.
• Tal conceito populariza a ideia de uma
nova institucionalidade. O Estado não
deveria ser algo distante, exterior à vida
de cada um, mas parte integrante do
corpo social, sintetizando princípios
iluministas liberais e burgueses.
• Se a economia do mundo do século XIX
foi formada principalmente pela Revolução
Industrial britânica, sua política e ideologia
vêm da Revolução Francesa (vocabulário,
temas, nacionalismo, código legal).
• Ela foi uma revolução social, radical e de
massas, diferente de qquer outra. Não foi
feita por um partido, mas por idéias que se
tornavam surpreendentemente
consensuais entre o grupo sócia
dominante, a burguesia. Sua razão era o
liberalismo.
• Revolução industrial
• Como afirma Hobsbawm, a
Revolução Industrial era a
contrapartida econômica da
dupla revolução que estava
ocorrendo no final do século
XVIII e que marcaria a política
e a economia mundial até o
tempo presente, inaugurando
a História contemporânea.
• Difícil de precisar, o termo “revolução industrial”
reflete seu impacto relativamente tardio sobre a
Europa, pois começou a tornar-se corrente
apenas por volta de 1820.
• Do ponto de vista da periodização, embora
muitos historiadores considerem 1760 a partida
para a revolução industrial, a guinada repentina
aconteceu por volta de 1780, embora sua
repercussão possa ser precisada mais para as
duas últimas décadas do século XVIII. A
Revolução Industrial é contemporânea da
Revolução Francesa, embora um pouco anterior
a ela.
• Uma das questões centrais
quando se analisa a Revolução
Industrial, é compreender as
causas do pioneirismo inglês.
• De fato, embora outros países e
regiões reunissem algumas
condições para a produção
industrial, nenhum reunia de
forma integrada todas as suas
condições.
• Entre elas, podemos citar a existência
anterior de infraestrutura para a
manufatura.
• A Inglaterra já havia feito a sua “revolução
agrícola”: conjunto de transformações,
entre os séculos XV e XVIII, que consistiu
em cercamento dos campos; fornecimento
de mão de obra para as indústrias em
transformação e modernização da
agricultura (rotatividade, utilização de
adubo e maquinaria).
• Por outro lado, a Inglaterra gozava de um
enorme mercado de consumo (o próprio
país e seu enorme império colonial).
• Além disso, a participação no grande
comércio marítimo propiciou um forte
processo de acumulação de capitais, tanto
nos fretes marítimos como no comércio de
escravos e na pirataria.
• A aliança entre a burguesia e alguns setores da
nobreza, após a Revolução Inglesa (16401689), também contribuiu. Resumidamente,
pode-se afirmar que as condições para a
Revolução Industrial na Inglaterra são a
existência de capital, mão de obra, máquinas,
mercados, comércio internacional, frota
mercante e matérias-primas.
• Entre as consequências da Revolução
Industrial, figura a formação de um mercado de
massa. Sob qualquer aspecto, foi esse,
provavelmente, o mais importante
acontecimento na história do mundo, pelo
menos desde a invenção da agricultura e das
cidades.
• A revolução industrial também criou uma
indústria de carvão, o desenvolvimento das
ferrovias e a expansão do capital. As ferrovias
seriam o principal ponto de investimento
capitalista nos outros continentes.
A queda da monarquia - França
• Em 10 de agosto de 1792, a Assembléia foi
dissolvida e a monarquia extinta. Criou-se uma
nova Assembléia Nacional Constituinte (a
Convenção Nacional), entrando numa fase
radical.
• As primeiras medidas tomadas pela Convenção
foram a Proclamação da República e a
promulgação de uma nova Constituição (21 de
setembro de 1792). Eleita sem a divisão dos
eleitores em passivos e ativos, a alta burguesia
monarquista foi derrotada. A Convenção
contava com o predomínio dos representantes
da burguesia.
• A partir de então, a Revolução estendeu-se ao
campo, com maior violência: os camponeses
saquearam as propriedades feudais e invadiram
e queimaram os castelos e cartórios, para
destruir os títulos de propriedade das terras
(fase do Grande Medo).
• Temendo o radicalismo, a noite de 4 de agosto,
a Assembléia Nacional Constituinte aprovou a
abolição dos direitos feudais, gradual e
mediante amortização, além das terras da Igreja
terem sido confiscadas. Daí por diante, a
igualdade jurídica seria regra.
As principais realizações desse período foram:
• Abolição da escravidão nas colônias francesas, talvez o maior feito
social dos jacobinos.
• Reforma Agrária: confisco das terras da nobreza emigrada e da
Igreja, que foram divididas em lotes menores e vendidas a baixo
preço aos camponeses pobres. Os pagamentos foram divididos em
10 anos;
• Lei do Máximo ou Lei do Preço Máximo, estabelecendo um teto
máximo para preços e salários;
• Venda de bens públicos e dos emigrados para recompor as
finanças públicas;
• Entrega de pensões anuais e assistência médica gratuita a
crianças, velhos, enfermos, mães e viúvas;
• Proclamação da Primeira República Francesa (setembro de 1792);
Elaboração de um novo sistema de medidas. Graças a essa idéia,
os cientistas franceses elaboraram o metro, bem como outras idéias
que não tiveram a mesma aceitação: O minuto passou a ter 100
segundos, e a hora passou a ter 100 minutos, mas não se
construíram relógios com esse sistema que funcionassem; o ângulo
de 90 graus foi substituido como ângulo notável por um ângulo de
100 graus.
Napoleão no poder
• Destacando-se no assédio de Toulon,
em 1793, Napoleão Bonaparte
tornou-se general.
• Em 1796, Bonaparte esmagou uma
insurreição monarquista.
• A figura que sobressai ao final do
período é a de Napoleão Bonaparte
(1769-1821). Ele era o general
francês mais popular e famoso da
época.
• Quando estourou a revolução, era apenas um
simples tenente e, como os oficiais oriundos da
nobreza abandonaram ou foram demitidos do
exército revolucionário, fez uma carreira rápida.
• Aos 24 anos já era general de brigada. Após um
breve período de entusiasmo pelos jacobinos,
chegando inclusive a ser amigo dos familiares
de Robespierre, afastou-se deles quando
estavam sendo depostos.
• Lutou na Revolução contra os países
absolutistas que invadiram a França e foi
responsável pelo sufocamento do golpe de
1795.
A Era Napoleônica (1800-1815)
• Napoleão – nomeado Primeiro
Cônsul em 1800 - assinou um
acordo, a Concordata de 1801,
entre a Igreja Católica e o Estado.
O acordo, sob aprovação do
Papa Pio VII, dava direito ao
governo francês de confiscar as
propriedades da Igreja e, em
troca, o governo teria de amparar
o clero.
• Napoleão reconhecia o catolicismo como
religião da maioria dos franceses, mas se
arrogava o direito de escolher bispos, que
mais tarde seriam aprovados pelo papa.
• Direito - estabeleceu-se o Código
Napoleônico, um Código Civil, em 1804,
representando em grande parte os
interesses dos burgueses, como
casamento civil (separado do religioso),
respeito à propriedade privada, direito à
liberdade individual e igualdade de todos
ante a lei. Está em vigor até hoje, embora
com consideráveis alterações legislativas
posteriores.
• Napoleão – coroado Imperador em 1804 também instituiu em 1809 um código penal, que
vigorou até 1994, quando a Assembleia
Nacional aprovou o novo código.
• Educação - reorganizou-se o ensino e a
prioridade foi a formação do cidadão francês.
Reconheceu-se a educação pública como meio
importante de formação das pessoas,
principalmente nos aspectos do comportamento
moral, político e social.
• Administração - Indicavam-se pessoas da
confiança de Napoleão para cargos
administrativos.
• Em 1803, durante o governo de Napoleão, a França
vendeu seus territórios na América para os recémfundados Estados Unidos. Isso permitiu a expansão das
fronteiras dos Estados Unidos para o oeste.
• A maior parte do dinheiro obtido na venda foi
direcionada ao fortalecimento do exército francês para
sua expansão territorial no continente europeu.
• O Império Francês atingiu sua extensão máxima neste
período, em torno de 1812, com quase toda a Europa
Ocidental e grande parte da Oriental ocupadas,
possuindo 150 departamentos, com 50 milhões de
habitantes, quase um terço da população européia da
época.
• Neste período, Napoleão realizou
uma série de batalhas para a
conquista de novos territórios
para a França.
• O exército francês (chamado
agora de Grande Armée, ou
"Grande Exército") aumentou o
número de armas e de
combatentes, e tornou-se o mais
poderoso de toda a Europa.
• Pensando que a expansão e crescimento
econômico-militar da França era uma ameaça à
Inglaterra, os diplomatas ingleses formaram
coligações internacionais para se opor ao novo
governo francês e a seu expansionismo.
• Também acreditavam que o governo francês
poderia influir em países que estavam sob
doutrina absolutista e assim causar uma
rebelião.
• A primeira coligação formada para deter os
franceses era formada pela Inglaterra, Áustria,
Rússia e Prússia.
• Em outubro de 1805, os franceses usaram a
marinha para atacar a Inglaterra, mas não
obtiveram êxito, derrotados pela marinha
inglesa, comandada pelo almirante Nelson,
batalha que ficou conhecida como Batalha de
Trafalgar, firmando-se o poderio naval britânico.
• Ao contrário do malogro com os ingleses, os
franceses venceram seus outros inimigos da
coligação, como a Áustria, em 1805, na Batalha
de Austerlitz, além da Prússia em 1806 e Rússia
em 1807.
• Na busca de outras maneiras para derrotar ou debilitar
os ingleses, o Império Francês decretou o Bloqueio
Continental em 1806, em que Napoleão determinava
que todos os países europeus deveriam fechar os portos
para o comércio com a Inglaterra, debilitando as
exportações do país e causando uma crise industrial.
• O único obstáculo à concretização de seu império na
Europa era a Inglaterra, que, favorecida por sua posição
insular (isolada), por seu poder econômico e por sua
superioridade naval, não conseguiria conquistar. Para
tentar dominá-la, Napoleão usou a estratégia do
Bloqueio Continental (1806), ou seja, decretou o
fechamento dos portos de todos os países europeus ao
comércio inglês.
• O governo de Portugal relutava em concordar
ao Bloqueio Continental devido à sua aliança
com a Inglaterra, da qual era extremamente
dependente.
• O príncipe D. João, que assumira a regência em
1792, devido ao enlouquecimento de sua mãe,
a rainha D. Maria I, estava indeciso quanto à
alternativa menos arriscada para a monarquia
portuguesa.
• Portugal tinha então a Inglaterra como principal
parceira para seus negócios. Pressionados por
Napoleão, os portugueses não tiveram escolha:
como não podiam abdicar os negócios com a
Inglaterra, não participaram do Bloqueio
Continental.
• Insatisfeito com a decisão portuguesa, o
exército francês começou a dirigir-se a
Portugal.
• Napoleão forçara uma aliança, sob a
forma do Tratado de Fontainebleau com a
casa real espanhola (onde veio a forçar a
abdicação do trono de Carlos IV para o
seu irmão, José Bonaparte) para a
Invasão de Portugal, apesar de se saber
que havia já planos anteriormente
delineados para conquistar tanto Portugal,
como Espanha.
• A saída da família real para o Brasil
marcou também o início do processo de
Independência do Brasil.
• Na sequência da Revolução de 1820 em
Portugal, a corte voltou a Portugal,
restabelecendo-se em Lisboa a capital,
voltando o Rio de Janeiro a ser de novo
uma cidade colonial.
A campanha na Rússia
• Em 1812, a aliança franco-russa
é quebrada pelo tzar Alexandre I
da Rússia, que rompe o bloqueio
contra os ingleses.
• Napoleão empreende então a
campanha contra a Rússia, à
frente de mais de 600.000
soldados oriundos dos mais
diferentes recantos da Europa.
• Sem saída, a Rússia usa uma
tática de guerra chamada terra
queimada, que consistia em
destruir cidades inteiras para criar
um campo de batalha favorável
aos defensores.
• Aliada com o inverno rigoroso, a
Rússia consegue vencer o
exército napoleônico que sai com
apenas 120.000 homens (o
restante ou morreu ou se
dispersou pelo continente).
• Enquanto isso, na França, o
general Malet, apoiado por
setores descontentes da
burguesia e da antiga nobreza
francesa, arma uma
conspiração para dar um golpe
de Estado contra o imperador.
• Napoleão retorna
imediatamente a Paris e
domina a situação.
Invasão dos aliados e derrota de Napoleão
• Tem início então a luta da coligação europeia
contra a França na Batalha das Nações
(Confederação do Reno) que acabou com a
derrota de Napoleão. Com a capitulação de
Paris, o imperador é obrigado a abdicar.
Exílio em Elba
• O Tratado de Fontainebleau, de 1814, exila
Napoleão na Ilha de Elba. Separado da esposa
e do filho e sabendo de rumores de que ele iria
ser banido para uma ilha remota no meio do
oceano Atlântico, Napoleão escapa de Elba em
26 de fevereiro de 1815. Ele aportou na França,
dois dias depois
A volta ao poder
• Inicia-se então o "Governo dos Cem Dias". Napoleão
então tenta fazer uma constituição baseada no
liberalismo, contrariando as expectativas dos
republicanos, que queriam a volta da revolução e a
perseguição aos nobres. A Europa coligada retoma sua
luta contra o Exército francês. Napoleão entra na
Bélgica em junho de 1815, mas é derrotado por uma
coligação anglo-prussiana na Batalha de Waterloo e
abdica pela segunda vez, pondo fim ao império
napoleônico.
Exílio em Santa Helena
• Napoleão foi preso e então exilado pelos britânicos na
ilha de Santa Helena, na costa da África, em 15 de
outubro de 1815. Morre em 1821, provavelmente de um
câncer no estômago.
A evolução da sociedade internacional
Adam Watson
• A ordem imperial promovida por Napoleão
foi o ponto mais avançado do balanço do
pêndulo para longe da ortodoxia e da
legitimidade das independências múltiplas
da Europa.
• Assim, a ideia, bastante difundida e
parcialmente acatada durante dois
séculos, de respeito à soberania e ordem
interna dos Estados, e do equilíbrio de
poder entre esses Estados, evitando o
surgimento de uma potencia hegemônica
no sistema, entrou colapso.
• Mas, depois da queda de Napoleão, o pendulo
só balançou parte do caminho de volta na
direção da extremidade do espectro em que se
situam as independências múltiplas, ou seja,
percebeu-se que a ordem colocada por
Napoleão trazia alguma estabilidade no
relacionamento entre os Estados, embora fosse
desestabilizadora na ordem interna dos
Estados.
• Dessa forma, as principais potências europeias
passaram a negociar alguma forma de governo
coletivo, que fosse conservador o suficiente
para evitar as crises políticas e sociais
• Dois tipos muito diferentes de beligerantes
confrontaram-se durante aqueles vinte anos (17921815): os poderes e o sistema. A França como Estado,
com seus interesses e aspirações, enfrentou (ou aliouse) a outros Estados do mesmo tipo, mas por outro lado,
a França como Revolução inspiravam os outros povos
do mundo a derrubarem a tirania e a alcançarem a
liberdade, sofrendo, em consequência, a oposição das
forças conservadoras e reacionárias.
• Sem dúvida, depois dos primeiros anos apocalípticos de
guerra, a diferença entre essas duas linhas do conflito
diminuiu. Ao final do reinado de Napoleão, o elemento
conquista e exploração imperial prevalecia sobre o
elemento libertação, sempre que as tropas francesas
derrotavam, ocupavam ou anexavam algum país.
• O custo da guerra de 1778-83 – a ajuda francesa à
Revolução Americana, contra a Inglaterra - e o fracasso
em reformar as finanças nacionais acentuaram um
descontentamento político. A França, anos antes,
chegou a ter o maior exército continental, com cerca de
650 mil homens. Entre 1689 e 1815, haveria sete
importantes guerras anglo-francesas.
• O imperialismo napoleônico foi pago pelo saque. O
processo começou internamente, através do confisco de
bens e propriedades dos ‘inimigos da revolução’. No
exterior, o exército assumiu uma posição de que a
guerra custearia a própria guerra. Isso se daria pelo
confisco de propriedades feudais e da coroa nos países
derrotados, pelo butim e pelas indenizações. Napoleão
não apenas cobriu as despesas, como obteve lucros.
A evolução da sociedade internacional
Adam Watson
• O desejo do Estado mais forte de ditar a lei para
todo o sistema, pelo menos nas relações
externas entre seus membros tornou-se mais
aceitável em virtude das vantagens que uma
medida de autoridade no sistema trazia também
para os outros.
• As legitimidades estabelecidas pelos acordos de
Vestfália e Utrecht eram antihegemônicas,
sendo que Utrecht o foi de forma explícita.
• O equilíbrio da paz de Utrecht durou sete
décadas. Nenhum Estado era claramente
hegemônico sobre os demais.
• A Revolução Francesa estimulou novas
energias e aspirações na França – então
o Estado mais forte -, que Napoleão
conseguiu articular e explorar. Napoleão
produziu mudanças radicais tanto nas
relações entre as comunidades do
sistema europeu quanto no governo
interno e na estrutura social daquelas
comunidades.
•
Embora a ordem napoleônica tivesse
durado apenas um breve período, as
mudanças que ela induziu foram
duradouras.
• De acordo com Giovanni Arrighi, a Revolução Francesa e as
guerras napoleônicas violaram os princípios, normas e regras
do sistema de Vestfália (principalmente soberania); fomentou
revoltas vindas de baixo, desrespeitou a liberdade de
comércio e a propriedade.
• Dessa forma, a expansão da Revolução Francesa
desestabilizava o sistema, oferecia risco para as elites, e era
necessária uma restauração. Entretanto, os vencedores não
puderam, ou quiseram, restaurar o padrão do século XVIII.
• Embora o sistema de Napoleão tenha sido demasiado breve
para adquirir aceitação geral, após a sua derrubada, as suas
vantagens ainda eram suficientemente impressionantes para
fazer que os europeus liberados desejassem ver quais de
seus méritos podiam ser negociados por meio da cooperação
entre as grandes potencias e implementados por meio de
uma ação concertada, em vez de impostos pela força
unilateral.
• Dessa forma, conforme Adam Watson, o império
de Napoleão mudou as estruturas sociais da
Europa Ocidental e de muitas das da Europa
Central, e alterou permanentemente as ideias
dos homens sobre o que era desejável ou
atingível.
• Da Declaração de Aquisgrana (1818, sobre
ministros residentes) até o ano das revoluções
(1848), as cinco grandes potências chegaram
perto de funcionar como uma diretoria. Tinham
uma solidariedade de fins: temiam os riscos que
ameaçavam seu mundo.
• A reconstrução da Europa partiu dos entendimentos
entre Rússia e Inglaterra, e convinha aos dois Estados
restabelecer a Áustria e a Prússia como grandes
potências independentes, nominalmente iguais a eles
próprios.
• Eles haviam entendido as vantagens da ordem e da
tranqüilidade que o império de Napoleão havia trazido
às grandes áreas da Europa que ele havia controlado.
• A contradoutrina da legitimidade dinástica e o desejo
prático de administrar o sistema pareceram aos
estadistas, em Viena, justificar igualmente as
intervenções ideológicas para reprimir tentativas
revolucionárias de tomar o poder em qualquer Estado.
• Durante o século XIX, a nação começou a
ser aceita como unidade política básica, e
outras formas de identidade e lealdade
tiveram de acomodar-se.
• A própria definição da democracia
procurava legitimar a nação. A guerra não
seria mais feita por mercenários
contratados pelas unidades dinásticas,
mas pelo recrutamento do cidadão.
A sociedade anárquica
Hedley Bull
Prefácio Williams da Silva Gonçalves (UFF)
• Até o século XIX os contatos entre os
europeus e os demais sistemas haviam se
realizado com os interlocutores em
condições de igualdade.
• A partir da Revolução Industrial, no
entanto, tudo mudou.
• Em vista da superioridade técnica
adquirida, os europeus passaram a impor
seus valores e estabelecer as condições
sob as quais os outros Estados seriam
reconhecidos e admitidos no sistema de
Estados que comandavam.
• Esse processo aconteceu como
na China e como no Japão, onde
a conformação objetiva da
estrutura da sociedade
internacional acontece, como
defende Hedley Bull, no mesmo
contexto que regÍstra a
intensificação do processo de
dominação colonial e que registra
o triunfo da soberania nas
independências das colônias
americanas.
• De um lado, do lado dos povos da Ásia,
da África e da Oceania, sentimento
europeu de superioridade, prepotência,
discriminação racial e cultural; de outro
lado, do lado dos povos das Américas que
conquistavam a independência, a
formulação de uma retórica e de uma
doutrina anticolonialista, o sentimento de
solidariedade de um para com os outros e
uma grande desconfiança em relação às
práticas correntes no âmbito das relações
internacionais
• No período imediatamente anterior à expansão
européia, o mundo estava dividido em alguns
importantes sistemas internacionais: o sistema
Árabe-Islâmico, que se estendia da Espanha à
Pérsia; o sistema internacional Indiano, sob a
influência da cultura hindu; o sistema
internacional Tártaro-Mongol, que ocupava os
amplos espaços das estepes eurasianas,
também de matriz cultural islâmica; e, por fim, o
sistema internacional Chinês, durante longo
tempo sob a dominação mongol.
• Conquanto eventualmente as partes integrantes
desses sistemas entrassem em contato com
partes dos outros sistemas, por conta de
relações comerciais ou para dar satisfação à
curiosidade intelectual, tais sistemas
funcionavam de modo inteiramente
independente uns dos outros, atuando em
conformidade com seus próprios códigos
culturais, que compreendiam religiôes,
governos, leis, escritas, moedas, regras
comerciais.
• Segundo Bull, havia, contudo, algo que era
comum a todos esses sistemas: o fato de serem
regulados pela relação suserano/vassalo.
Europa, 1700
Europa,
1750
Europa, 1792
5. 1815-1848 Restauração
e Revolução
Relações Internacionais
Universidade Federal do ABC
Gilberto Maringoni Fevereiro de 2013
O Congresso de Viena - 1815
• A grande marca da Restauração foi o
Congresso de Viena
• Ele se constituiu em uma conferência entre
embaixadores das grandes potências europeias
que teve lugar na capital austríaca, entre 1 de
Outubro de 1814 e 9 de Junho de 1815, cuja
intenção era a de redesenhar o mapa político do
continente europeu após a derrota da França
napoleônica na primavera anterior, bem como
restaurar os respectivos tronos às famílias reais
derrotadas pelas tropas de Napoleão Bonaparte
e firmar uma aliança entre os signatários.
• Os termos de paz foram estabelecidos com a
assinatura do Tratado de Paris (30 de Maio de
1814), no qual se estabeleciam as indenizações
a pagar pela França aos países vencedores.
• Mesmo diante do regresso ex-imperador
Napoleão I do exílio, tendo reassumido o poder
em França em Março de 1815, as discussões
prosseguiram, concentradas em determinar a
forma de toda a Europa depois das guerras
napoleônicas.
• O Ato Final do Congresso foi assinado a 9 de
Junho de 1815, nove dias antes da derrota final
de Napoleão na batalha de Waterloo.
• Participaram Áustria, Prússia, Reino Unido,
Rússia e França.
• Inicialmente, os representantes das quatro
potências vitoriosas esperavam excluir os
franceses de participar nas negociações mais
sérias, mas o Ministro Talleyrand conseguiu
incluir-se nesses conselhos desde as primeiras
semanas de negociações.
• Momento de reação conservadora na Europa,
articulado na presença de representantes dos
diversos países vencedores de Napoleão, o
objetivo declarado deste fórum era o de
solucionar os problemas suscitados no
continente desde a Revolução Francesa (1789)
e as conquistas napoleônicas.
Em linhas gerais pretendia-se:
• Refazer o mapa político da Europa, recriando ou
suprimindo Estados;
• Restaurar o Antigo Regime, a ordem feudal e
absolutista em todas as regiões afetadas pelos
ideais liberalistas franceses desde 1789;
• Restabelecer um equilíbrio europeu, procurando
impedir que um único país fosse
suficientemente forte (como a França o fora)
para derrotar militarmente todos os demais
países europeus unidos;
• Restaurar as antigas monarquias depostas a
partir de 1789. Sob o Princípio da Legitimidade,
retornaram ao poder os Bragança em Portugal,
os Bourbon na França (Luís XVIII) e na Espanha
(Fernando VII), os Orange na Holanda, e os
Sabóia no Piemonte.
• Redistribuir os territórios conquistados pela
França desde 1789 e punir com a perda de
terras os aliados de Napoleão Bonaparte. Pelo
Princípio das Compensações os maiores
beneficiados foram as potências responsáveis
pela vitória militar sobre a França: Inglaterra,
Rússia, Prússia e Áustria. Para não
desmembrar o território continental francês,
essa potências obtiveram compensações
territoriais em outras regiões.
• O Congresso de Viena representou uma
tentativa das forças conservadoras
européias para deter o avanço do
Liberalismo e do Nacionalismo de
diversos povos (polacos, belgas,
finlandeses, gregos e outros) que se
encontravam dominados politicamente
pelos impérios então existentes.
• Também serviu como um instrumento de
contenção dos movimentos
revolucionários liderados pela burguesia.
• O Tratado de Paris obrigou a França
a pagar 700 milhões de francos em
indenizações às nações
anteriormente por ela ocupadas.
• Seu território passou a ser controlado
por exércitos aliados e sua marinha
de guerra foi desativada . Suas
fronteiras permaneceram as mesmas
de 1789 . Luís XVIII, irmão de Luís
XVI foi reconhecido como novo Rei
A Santa Aliança
• A Santa Aliança foi uma das
conseqüências imediatas do
Congresso de Viena. Ela
surgiu por inspiração do Czar
da Rússia Alexandre I, que
teria sofrido influência da
Baronesa de Krudener e de
Nicolas Bergasse (antigo
constituinte francês).
• Ele propôs aos outros príncipes cristãos
reunidos em Viena governarem seus países de
acordo com os "preceitos da Justiça, Caridade
Cristã e Paz" e a formação de um bloco de
potências, cujas relações seriam reguladas
pelas "elevadas verdades presentes na doutrina
de Nosso Salvador".
• Todavia, com a interferência do chanceler
austríaco Metternich, a Santa Aliança foi apenas
um instrumento da restauração monarquica. Foi
escolhido o nome de Santa Aliança para
designar esse bloco militar que durou até as
revoluções européias de 1848.
• O Direito de Intervenção foi defendido
pelo ministro austríaco, Metternich,
segundo o qual as nações européias
interviriam onde quer que as
monarquias estivessem ameaçadas
ou onde fossem derrubadas.
• A aliança visou a a manutenção dos
tratados de 1815, tendo em vista
reprimir as aspirações liberais e
nacionalistas dos povos oprimidos.
• Com uma forte aparência religiosa, onde
transparecia a vontade de aplicar os
princípios cristãos (amor, paz e justiça) à
política, o acordo, além de contemplar a
não agressão mútua, visava a
continuidade de uma filosofia de
absolutismo a prosseguir na gestão dos
Estados, de forma a contrariar as
sublevações que se estavam a fazer sentir
da parte de setores populacionais que
pretendiam uma política mais liberal e
nacional. Em síntese, a Santa Aliança
reduziu-se a um poderoso fator de
manutenção de monarquias absolutistas
na Europa.
• Através da Santa Aliança,
Áustria, Prússia e Rússia
passaram a intervir em vários
países europeus, combatendo
os anseios de libertação
nacional. Intervenções foram
feitas em Nápoles e na
Espanha pelos países
integrantes desse órgão.
• Como durante o domínio napoleônico ma
Europa iniciara-se o processo de
emancipação política das colônias
ibéricas, a Santa Aliança tentou
restabelecer o velho Pacto Colonial
nesses países.
• Só não teve sucesso devido à oposição
da Inglaterra, que queria conservar a
liberdade de comércio com a América, e
dos Estados Unidos, que desejavam
manter longe o absolutismo europeu,
conforme previa a Doutrina Monroe.
• Baseado nos princípios dessa doutrina, os
EUA impediram a Santa Aliança de
recolonizar os países americanos que se
haviam tornado independentes.
• A Revolução de 1830 na França contribuiu para
abalar as bases da Santa Aliança e a de 1848
para torná-la definitivamente sem efeito. Na
guerra de independência da Grécia, a Rússia
apoiou os gregos, a Aústria e a Prússia não a
apoiou e a Santa Aliança chegou ao fim.
Conhecida como a "Primeira liga militar do
mundo em tempo de paz".
A Era das Revoluções - Eric Hobsbawm
O mundo pós napoleônico
• Após 1815, a área do mundo
conhecido era maior do que em
qualquer época anterior e suas
comunicações eram incrivelmente
mais rápidas.
• O sistema internacional que se
desenvolve no meio século seguinte
à queda de Napoleão teve várias
características definidoras e
permanentes.
• A primeira foi a constante – e depois de 1840
espetacular – crescimento de uma economia
global integrada, que incorporou um número
crescente de nações e regiões num comércio e
numa rede financeira transoceânica e
transcontinental, tendo como centro a Europa
ocidental e em particular a Grã-Bretanha.
• A hegemonia britânica foi acompanhada de
melhorias em grande escala nos transportes e
comunicações, pela transferência de tecnologia
industrial de uma região a outra, por um e por
um imenso surto de produção manufaturada,
abertura de novas fronteiras agrícolas e fontes
de matérias primas.
• A propagação das idéias de livre-mercado
marca uma nova ordem internacional,
muito diferente do século XVIII.
• Os custos da grande guerra 1793-1815
levou os conservadores e liberais a
preferirem ao máximo possível a paz e a
estabilidade, sustentados pelo Concerto
da Europa e pelos tratados de livrecomércio. Há um crescimento sem
precedentes da economia global.
• O principal resultado da
Revolução na França foi o de pôr
fim à sociedade aristocrática.
• Não à "aristocracia", no sentido
da hierarquia de status social
distinguido por títulos ou outras
marcas visíveis de exclusividade,
e que muitas vezes se moldava
no protótipo dessas hierarquias, a
nobreza "de sangue".
A era das revoluções
Eric Hobsbawm
• Poucas vezes a incapacidade dos
governos em conter o curso da História foi
demonstrada de forma mais decisiva do
que na geração pós-1815.
• Evitar uma segunda Revolução Francesa,
ou ainda a catástrofe pior de uma
revolução européia generalizada tendo
como modelo a francesa foi o objetivo
supremo de todas as potencias que
tinham gasto mais de 20 anos para
derrotar a França.
• Após mais de 20 anos de
guerras e revoluções quase
ininterruptas, os velhos
regimes vitoriosos enfrentaram
os problemas do
estabelecimento e da
preservação da paz, que
foram particularmente difíceis
e perigosos.
• Foram inusitadamente bem sucedidos.
• De fato, não houve nenhuma guerra total
na Europa, nem qualquer conflito armado
entre duas grandes potências, da derrota
de Napoleão à Guerra da Criméia, em
1854-6. Na verdade, exceto pela Guerra
da Criméia, não houve nenhuma guerra
que envolvesse mais do que duas
grandes potências entre 1815 e 1914.
Parêntesis
(A Guerra da Crimeia foi um conflito que se
estendeu de 1853 a 1856, na península da
Crimeia (no mar Negro, ao sul da atual Ucrânia),
no sul da Rússia e nos Bálcãs. Envolveu, de um
lado o Império Russo e, de outro, uma coligação
integrada pelo Reino Unido, a França, o Reino
da Sardenha - formando a Aliança AngloFranco-Sarda - e o Império Otomano (atual
Turquia). Esta coalizão, que contou ainda com o
apoio do Império Austríaco, foi formada como
reacção às pretensões expansionistas russas).
• O mapa da Europa foi redelineado sem se levar
em conta as aspirações dos povos ou os direitos
dos inúmeros príncipes destituídos pelos
franceses, mas com considerável atenção para
o equilíbrio das cinco grandes potências que
emergiam das guerras: a Rússia, a GrãBretanha, a França, a Áustria e a Prússia.
• Destas, somente as três primeiras contavam. A
Grã-Bretanha não tinha ambições territoriais no
continente, embora preferisse manter o controle
ou a sua mão protetora sobre assuntos de
importância comercial e marítima.
• A sociedade da França pósrevolucionária era burguesa em sua
estrutura e em seus valores. Era a
sociedade do parvenu, i.e., do
homem que se fez por si mesmo, o
self-made-man, embora isto não
fosse completamente óbvio antes que
o próprio país fosse governado pelos
parvenus, i.e., antes que se tornasse
republicano ou bonapartista.
• Pode não parecer excessivamente
revolucionário a nós que metade da
nobreza francesa, em 1840, pertencesse
a famílias da velha nobreza, mas, para os
burgueses franceses contemporâneos, o
fato de que a metade tinha sido gente do
povo em 1789 era muito mais
surpreendente, especialmente quando
eles olhavam para as exclusivistas
hierarquias sociais do resto da Europa
continental.
• Os estadistas de 1815 foram
bastante inteligentes para saber que
nenhum acordo, não obstante quão
cuidadosamente elaborado, resistiria
com o correr do tempo à pressão das
rivalidades estatais e das
circunstâncias mutáveis.
• Conseqüentemente, trataram de
elaborar um mecanismo para a
manutenção da paz - i.e. resolvendo
todos os problemas maiores à
medida que eles surgissem - por
meio de congressos regulares.
• Claro, entendia-se que as cruciais
decisões nesses congressos fossem
tomadas pelas "grandes potências" (o
próprio termo é uma invenção deste
período.)
• O "concerto da Europa" - outro termo que
surgiu então - não correspondia por
exemplo a uma ONU, mas sim aos
membros permanentes do seu Conselho
de Segurança. Entretanto, os congressos
regulares só foram mantidos por alguns
anos - de 1818, quando a França foi
oficialmente readmitida no concerto, até
1822.
A supremacia
britânica
• Os ingleses estavam satisfeitos. Por volta de
1815, eles tinham obtido uma vitória mais
completa do que qualquer outra potência em
toda a história mundial, tendo emergido dos 20
anos de guerra com a França como a única
economia industrializada, a única potência naval
- em 1840 a marinha britânica tinha quase
tantos navios quanto todas as outras marinhas
reunidas - e virtualmente a única potência
colonial do mundo.
• Nada parecia atrapalhar o único grande
interesse expansionista da política externa
britânica, a expansão do comércio e do
investimento britânicos.
• Poucas vezes a incapacidade dos
governos em conter o curso da história foi
demonstrada de forma mais decisiva do
que na geração pós-1815.
• Evitar uma segunda Revolução Francesa,
ou ainda a catástrofe pior de uma
revolução europeia generalizada tendo
como modelo a francesa, foi o objetivo
supremo de todas as potências que
tinham gasto mais de 20 anos para
derrotar a primeira.
• A grande transformação
Karl Polanyi
• Após 1815, a mudança é súbita e completa. A
repercussão da Revolução Francesa reforçou a
maré montante da Revolução Industrial,
estabelecendo os negócios pacíficos como um
interesse universal.
• Metternich (1773-1859, diplomata austríaco)
proclamava que o que os povos da Europa
desejavam não era a liberdade, mas a paz.
Gentz chamava os patriotas de novos bárbaros.
A Igreja e o trono iniciaram a desnacionalização
da Europa. Seus argumentos encontravam
apoio tanto na ferocidade das recentes formas
populares de revolta, como no realce tremendo
do valor da paz sob a economia nascente.
• Os que apoiavam o novo
"interesse pela paz" eram,
como de hábito, aqueles que
mais se beneficiavam com ela,
isto é, aquele cartel de
dinastias e feudalistas cujas
posições patrimoniais eram
ameaçadas pela onda
revolucionária de patriotismo
que avassalava o continente.
• Desta forma, por um período
aproximado de um terço de
século, a Santa Aliança forneceu
a força coerciva e o ímpeto
ideológico necessário a uma
política de paz atuante; seus
exércitos percorriam a Europa em
todas as direções, esmagando
minorias e reprimindo maiorias.
• De 1846 até cerca de 1871 - “um dos
quartos de século mais confusos e
atravancados à história européia” a paz foi
estabelecida com menos segurança,
enquanto a força declinante da reação
enfrentava a crescente força da
industrialização.
• No quarto de século que se segue à Guerra
Franco-Prussiana (1870-71), encontramos
redivivo o interesse pela paz representado
por aquela nova e poderosa entidade, o
Concerto da Europa.
A grande transformação
Karl Polanyi
A civilização do século XIX se firmava em quatro
instituições.
• A primeira era o sistema de equilíbrio de poder
que, durante um século, impediu a ocorrência
de qualquer guerra prolongada e devastadora
entre as Grandes Potencias.
• A segunda era o padrão internacional do ouro
que simbolizava uma organização única na
economia mundial.
• A terceira era o mercado auto-regulável, que
produziu um bem –estar materia sem
• precedentes.
• A quarta era o estado liberal.
O advento do neocolonialismo
• O domínio colonial europeu chegou
ao fim ao mesmo tempo em que a
Inglaterra firmava-se como potência
global hegemônica.
• Tal supremacia se deu não apenas
pela exportação de produtos
manufaturados - que iam de tecidos a
bens de produção, artigos de luxo e
de consumo duráveis -, mas também
por outras variáveis.
• O país dominava o comércio internacional,
seus bancos funcionavam como agências
financiadoras universais e a libra esterlina
era conversível em todo o mundo.
• O padrão-ouro – o lastro metálico da
moeda britânica – regulava o sistema
monetário em escala planetária,
subordinando economias aos desígnios
dos financistas da City londrina.
A evolução da sociedade internacional
Adam Watson
• De 1818 até o ano das
revoluções (1848), as cinco
grandes potências chegaram
perto de funcionar como uma
diretoria. Tinham uma
solidariedade de fins: temiam
os riscos que ameaçavam seu
mundo.
• A reconstrução da Europa partiu dos
entendimentos entre Rússia e
Inglaterra, e convinha aos dois
Estados restabelecer a Áustria e a
Prússia como grandes potências
independentes, nominalmente iguais
a eles próprios.
• Eles haviam entendido as vantagens
da ordem e da tranqüilidade que o
império de Napoleão havia trazido às
grandes áreas da Europa que ele
havia controlado.
• A contradoutrina da legitimidade
dinástica e o desejo prático de
administrar o sistema pareceram
aos estadistas, em Viena,
justificar igualmente as
intervenções ideológicas para
reprimir tentativas revolucionárias
de tomar o poder em qualquer
Estado
Europa, 1800
Europa, 1848
Europa,
, 1800
Houve três ondas revolucionárias principais no mundo
ocidental entre 1815 e 1848:
• 1820-1824 : Espanha (1820); Nápoles (1820); Grécia
(1821)
• 1829-1834: Oeste da Europa, derrubada dos Bourbon
na França.
• A onda revolucionária de 1830 foi, portanto, um
acontecimento muito mais sério do que a de 1820. Ela
marca a derrota definitiva dos aristocratas pelo poder
burguês na Europa Ocidental. A classe governante dos
próximos 50 anos seria a "grande burguesia" de banqueiros, grandes industriais e, às vezes, altos
funcionários civis
• Por trás destas grandes mudanças políticas
estavam grandes mudanças no
desenvolvimento social e econômico. Qualquer
que seja o aspecto da vida social que
avaliarmos, 1830 determina um ponto crítico; de
todas as datas entre 1789 e 1848, o ano de
1830 é o mais obviamente notável. Ele aparece
com igual proeminência na história da
industrialização e da urbanização no continente
europeu e nos Estados Unidos, na história das
migrações humanas, tanto sociais quanto
geográficas, e ainda na história das artes e da
ideologia.
• O mais formidável legado da própria
Revolução Francesa foi o conjunto de
modelos e padrões de sublevação
política que ela estabeleceu para uso
geral dos rebeldes de todas as partes
do mundo.
• Não queremos dizer com isto que as
revoluções de 1815-48 foram a
simples obra de alguns agitadores
descontentes, como os espiões e
policiais do período - uma espécie
muito utilizada - deviam informar a
seus superiores.
• Elas ocorreram porque os
sistemas políticos novamente
impostos à Europa eram
profundamente e cada vez mais
inadequados, num período de
rápida mudança social, para as
condições políticas do continente,
e porque os descontentamentos
econômicos e sociais foram tão
agudos a ponto de criar uma
série de erupções virtualmente
inevitáveis.
• Os modelos políticos criados pela
Revolução de 1789 serviram para
dar ao descontentamento um
objetivo específico, para
transformar a intranquilidade em
revolução, e acima de tudo para
unir toda a Europa em um único
movimento - ou, talvez fosse
melhor dizer, corrente - de
subversão.
• O reconhecimento de suas
independências por parte destas novas
potências passou por negociações que
envolveram, invariavelmente, a assinatura
de Tratados de Livre Comércio,
primeiramente com a Inglaterra e mais tarde
com os demais países europeus, e com os
Estados Unidos.
• Como consequência, a América Latina se
transformou no primeiro laboratório de
experimentação da estratégia de
“relacionamento não colonial com os territórios
do novo mundo”, defendida por Adam Smith”.
As independências da América Latina
José Luís Fiori
• “Depois dos Estados Unidos, os
países latino-americanos foram os
primeiros estados que se formaram
fora da Europa.
• Nasceram em bloco e quase
simultaneamente, por razões ligadas
à decadência dos impérios ibéricos e
à expansão das novas potências que
assumem a liderança do sistema
mundial a partir dos séculos XVII e
XVIII.
Imperialismo britânico
Do ponto de vista da América Latina isso
significou na prática a aceitação de uma
hegemonia política, econômica e financeira
externa por parte dos seus novos estados
independentes. Hegemonia que os ingleses
exerceram durante o século XIX e que depois
cederam à sua ex-colônia norte-americana.
• Esse segundo período, que vai das
independências e da formação de novos
Estados nacionais na região até a perda da
hegemonia britânica, no início do século XX,
pode ser classificada como etapa imperial
As independências e a crise do sistema
• O processo de independências na região
tem origem na crise do Antigo Sistema
Colonial. É seu próprio desenvolvimento
que cria as bases de sua superação.
• A América Latina rompeu com as
metrópoles ibéricas entre 1810 e 1828,
período que vai da independência
Argentina à declaração de soberania do
Uruguai. Nesses 18 anos, mudou
totalmente a configuração geopolítica
desta parte do mundo.
Ciclo de rompimentos
• Os rompimentos com as metrópoles fazem parte
do ciclo histórico das guerras napoleônicas
(1807-1815), no continente europeu.
• Com a invasão de Portugal e da Espanha pelas
forças do general Junot, enfraqueceram-se as
cadeias do domínio colonial, já abaladas pelo
declínio econômico dos dois países. Combinado
com condicionantes regionais, a separação das
colônias se faz em um curto período de tempo.
• Tratava-se de uma crise sistêmica, como
classificada pelo historiador Fernando Novais
em Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema
Colonial (1777-1801).
Dois fatores principais
levaram o sistema à crise
• Primeiro - A estrutura do sistema baseava-se
na produção escravista e na concentração
fundiária.
A colônia tinha por objetivo fornecer artigos que
a metrópole necessitava e oferecer mercado
para manufaturados da metrópole. Por exemplo,
o Brasil exportava cana de açúcar para Portugal
e adquire manufaturados deste, garantindo
fornecimento a preços baixos e adquirindo bens
que geravam alta lucratividade para a
metrópole.
• Em dado momento, a dinâmica passa a
ser disfuncional. Em determinadas
situações, Portugal vai depender do
capital estrangeiro, especialmente
flamenco, para financiar a produção do
açúcar e vai depender das praças de
Antuérpia para escoar sua produção.
• Assim a Holanda acaba por entrar na
concorrência do açúcar e por terminar
com o monopólio português. O exclusivo
metropolitano é na prática questionado.
• Segundo - A extrema concentração de terras e
de renda, a realização das riquezas geradas na
colônia apenas na metrópole e a inelasticidade
do trabalho escravo travam o desenvolvimento
do sistema, que já apresenta baixos índices de
produtividade.
• Ele cresce, como notou Celso Furtado em
Formação econômica do Brasil, extensivamente,
isto é, por agregação de novas unidades e com
a mesma composição de fatores. Mais ainda,
ela não reinveste em escala crescente, apenas
repõe e agrega, dilapidando a natureza.
• Decorre disso, portanto, uma limitação ao
crescimento da economia de mercado.
• Como não havia meios de se reduzir os custos
através do uso de novas tecnologias, a camada
senhorial buscava reduzir ao mínimo o custo da
mão de obra escrava. Assim, busca-se que o
escravo tenha uma lavoura de subsistência
dentro da própria unidade produtora para
exportação. Esta produção se desenvolve à
margem do mercado.
• Assim, a demanda de manufaturas era
reduzidíssimo. O desenvolvimento de um
mercado interno fica travado
Industrialismo e independência
• Quando as economias metropolitanas se
desenvolvem, no bojo da Revolução Industrial,
potencializando a atividade produtiva,
aumentando da produção e da oferta, passam a
exigir nas colônias a ampliação das faixas de
consumo, não apenas das camadas superiores
da sociedade. Isso só seria possível com a
generalização das relações mercantis.
• Tais tensões geradas no interior do próprio
sistema e por conta de seu próprio
desenvolvimento criam as bases de sua crise
irreversível.
• O exclusivo metropolitano impedia o
escoamento da oferta de produtos
britânicos para as colônias ibéricas.
• Assim, o industrialismo britânico passa a
ter interesses diretos na remoção das
metrópoles intermediárias. “É neste
contexto que se gera (...) a campanha
inglesa contra o tráfico negreiro, que era a
forma indireta de atacar o antigo sistema
colonial no seu cerne; o que entra em
crise é, pois, o próprio sistema colonial
como um todo”, aponta Novais.
Formação dos Estados
• A primeira metade do século XIX está
marcada pela independência e pela
formação dos Estados Nacionais.
• Na América espanhola, seus pólos de
irradiação foram Buenos Aires, Caracas e
Cidade do México. Nas duas primeiras
regiões, um rápido desenvolvimento no
final do século XVIII, aliada à deterioração
do domínio espanhol fortaleceu os
movimentos independentistas.
Celso Furtado em
A economia latino americana
• “A estruturação dos Estados nacionais ocorreu
de forma acidentada em quase toda a América
Latina.
• As elites liberais que lideraram ou apoiaram os
movimentos de independência em Buenos Aires
ou em Caracas não estavam em condições de
organizar sistemas de poder capazes de
substituir as antigas metrópoles. Ao mesmo
tempo, havia permanentes tensões de
autonomização regional. Na ausência de
vínculos políticos mais significativos, o localismo
político tendia a prevalecer”.
Fragmentação - Furtado
• “Rompidos os vínculos com a metrópole, por
toda parte o poder tendeu-se a deslocar-se para
a classe dos senhores de terra.
• A estruturação dos novos Estados foi
condicionada por dois fatores: a inexistência de
interdependência real entre os senhores da
terra, que se ligariam uns aos outros ou se
submeteriam a um dentre eles em função da
luta pelo poder; a ação da oligarquia urbana,
que manteria contatos com o exterior e
exploraria toda a possibilidade de expansão do
intercambio externo ao qual iriam se vinculando
segmentos do setor rural”.
A Revolução de 1830
• Afetou toda a Europa e oeste da Rússia. Na
Europa a derrubada dos Bourbons na França
estimulou várias revoluções. A Bélgica obteve
sua independência da Holanda. Esta é a marca
da derrota definitva do poder absolutista na
Europa Ocidental.
• É o ascenso da grande burguesia financeira e
industrial ao poder. A revolução de 1830
determina o surgimento da clase operária como
força politica na GB e na França e dos
movimentos nacionalistas em boa parte do
continente.
• Entre 1815 e 1848, nenhum observador
consciente podia negar que a situação dos
trabalhadores pobres era assustadora. E já em
1840 esses observadores eram muitos e
advertiam que tal situação piorava cada vez
mais.
• Sem dúvida, a verdadeira pobreza era pior no
campo, e especialmente entre os trabalhadores
assalariados que não possuíam propriedades,
os trabalhadores rurais domésticos, e, é claro,
entre os camponeses pobres ou entre os que
viviam da terra infértil.
A partir de 1830, as revoltas se
multiplicam pela Europa.
Na França, a restauração da
monarquia e da dinastia dos
Bourbon não havia sido suficiente
para Carlos X, que tentou
reintroduzir o absolutismo e
alguns dos privilégios de que
gozava a nobreza no Antigo
Regime.
• A publicação das ordenações
conservadoras, em julho daquele
ano, que dissolvia a Assembléia de
maioria liberal (burguesa), modificava
o sistema eleitoral e estabelecia
medidas de censura prévia à
imprensa, motivou a insurgência da
burguesia e de grande parte da
população, que depôs o rei e
entregou o trono a Luís Felipe, nobre
da família Orleans, de tendências
liberais.
• A revolta liberal na França repercutiu por
toda a Europa e o seu exemplo motivou a
rebelião da burguesia da Bélgica.
• A Itália também se convulsionou em 183132, quando a sociedade secreta dos
carbonários obteve sucesso ao proclamar
a república nos Estados Pontificiais (ou
Estados Papais, vasta porção territorial
sob comando da Igreja entre 756 e 1870),
movimento revertido pela intervenção da
Áustria.
Havia modelos políticos semelhantes,
embora fossem todos originários da
experiência francesa entre 1789 e 1797.
•
Eles correspondiam às três principais tendências
da oposição depois de 1815, na França:
1. O liberal moderado (ou, em termos sociais, o da
classe média superior e da aristocracia liberal),
2. O democrata radical (ou, em termos sociais, o da
classe média inferior, parte dos novos industriais,
intelectuais e pequena nobreza descontente) e
3. O socialista (ou, em termos sociais, dos "trabalhadores
pobres" ou das novas classes operárias industriais).
• As revoluções de 1830
mudaram a situação
inteiramente. Elas foram os
primeiros produtos de um
período geral de aguda e
disseminada intranquilidade
econômica e social e de
rápidas transformações.
Dois principais resultados
seguiram-se a isto.
• O primeiro foi que a política de massa e a
revolução de massa, com base no modelo de
1789, mais uma vez tornaram-se possíveis, e a
dependência exclusiva das irmandades
secretas, portanto, menos necessária.
• Os Bourbon foram derrubados em Paris por
uma típica combinação de crise do que se
considerava a política da monarquia Restaurada
e de intranquilidade popular devida à depressão
econômica. Cidade sempre agitada pela
atividade de massa, Paris em julho de 1830
mostrava as barricadas surgindo em maior
número e em mais lugares do que em qualquer
época anterior ou posterior.
• O segundo resultado foi que, com o
progresso do capitalismo, "o povo" e os
"trabalhadores pobres" - i.e. os homens
que construíram as barricadas - podiam
ser cada vez mais identificados com o
novo proletariado industrial como "a
classe operária".
• Portanto, um movimento revolucionário
proletário-socialista passou a existir.
• Mudanças - 1789 a 1848
• A primeira destas mudanças foi
demográfica. A população
mundial - e em especial a
população do mundo dentro da
órbita da revolução dupla - tinha
iniciado uma "explosão" sem
precedentes, que tem
multiplicado seu número no curso
dos últimos 150 anos.
• Visto que poucos países, antes do século XIX,
tinham qualquer coisa que se parecesse com
um censo, sendo os existentes de pouca
confiança, não sabemos com precisão com que
rapidez a população aumentou neste período;
mas foi certamente um aumento sem
precedentes e maior (exceto talvez em países
pouco populosos que cobriam espaços vazios e
até então mal utilizados, como a Rússia) nas
áreas economicamente mais avançadas.
• O extraordinário aumento da população
naturalmente estimulou muito a economia.
• A segunda maior mudança foi nas
comunicações. Segundo consenso geral, as
ferrovias estavam apenas na infância em 1848,
embora já fossem de considerável importância
prática na Grã-Bretanha, nos Estados Unidos,
na Bélgica, na França e na Alemanha.
• O que foi mais relevante, depois de 1830 - o
ponto-chave que o historiador de nosso período
não pode perder, qualquer que seja seu campo
de interesse particular -, é que o ritmo de
mudança social e econômica acelerou-se visível
e rapidamente.
• A Europa viveu um estado de crise
latente entre 1815 e 1848, com
agravamento de problemas
econômicos e sociais, além das
disputas entre liberais (burgueses) e
conservadores (absolutistas).
• A situação mostrou-se insustentável
mesmo na França, que avançou
depois da Revolução de 1830 para
uma forma de governo constitucional.
• Neste ano, subiu ao poder Luís
Filipe I (1773 – 1850), último rei
da França (1830 a 1848). Ficou
conhecido como o "Rei Burguês"
ou "Rei Cidadão".
• Luís Filipe pronunciou-se a favor
dos ideais revolução de 1789 e,
em 1790, uniu-se aos radicais
nas fileiras jacobinas.
• O seu reinado foi uma monarquia
constitucional, mas ele era, sobretudo,
favorável à burguesia numa época em que
a França começava a sua Revolução
Industrial.
• A Monarquia de Julho, como seu reinado
muitas vezes é designado, representa a
implantação na França de um novo
regime de aberta inspiração liberal que
acabou com as formas mais anacrônicas
da monarquia absoluta.
• Com o agravamento das tensões, seu
governo desgastou-se rapidamente.
• Em 1848, a oposição, formada por
republicanos e socialistas e
engrossada por segmentos populares
tomou as ruas em fevereiro para
reclamar reformas políticas,
conseguindo destituir o monarca.
• O governo provisório, formado no
vácuo de poder que se formou
proclamou a república, aboliu a
censura, pôs fim ao voto censitário
(apenas 3% da população votava, pois
o direito era limitado pela renda) e
formulou políticas de compensação
social, como a regulamentação da
jornada de trabalho, a legalização dos
sindicatos operários, além de convocar
uma Assembléia Constituinte.
• A tensão não se desfez e explodiram novas
reivindicações apenas quatro meses depois,
quando, sob a liderança dos socialistas, a
classe operária protestou vigorosamente contra
a insuficiência das medidas adotadas e,
particularmente, contra o fechamento das
oficinas nacionais de distribuição de alimentos.
• Após três dias de lutas nas ruas, o movimento
foi sufocado pelas forças de segurança,
deixando um saldo de dois mil mortos e feridos.
As eleições
• Em dezembro de 1848, os franceses
foram às urnas para eleger seu primeiro
presidente da República. O vencedor foi
Luís Napoleão ou Napoleão III, sobrinho
do Imperador, que conseguiu seduzir o
eleitorado com a mística da liderança de
seu nome e com a promessa de que
conseguiria reprimir as rebeliões operárias
futuras.
• Com o agravamento das tensões, em
dezembro de 1851, Luís Bonaparte dá um
golpe de Estado e abole a República,
restaurando a monarquia. Proclama-se
Napoleão III, rei dos franceses.
• Acabava melancolicamente o grande ciclo
revolucionário francês iniciado em 1789,
com ramificações por toda a Europa e
parte do mundo.
• A Revolução de 1830 na França
contribuiu para abalar as bases da
Santa Aliança e a de 1848 para
torná-la definitivamente sem efeito.
• Na guerra de independência da
Grécia, a Rússia apoiou os gregos, a
Aústria e a Prússia não a apoiou e a
Santa Aliança chegou ao fim.
Conhecida como a "Primeira liga
militar do mundo em tempo de paz".
• A revolução de 1830 introduziu
constituições moderadamente
liberais - antidemocráticas mas
também claramente
antiaristocráticas - nos principais
Estados da Europa Ocidental.
• Sem dúvida, havia acordos,
impostos pelo temor de uma
revolução de massa, que iria
além das moderadas aspirações
da classe média.
• Estes acordos deixaram as classes
proprietárias de terras superrepresentadas no governo, como na GrãBretanha, e grandes parcelas das novas
classes médias - e especialmente das
industriais mais dinâmicas - sem
representação, como na França.
• Ainda assim, foram acordos que
decisivamente inclinaram a balança
política para o lado das classes médias.
• O movimento operário proporcionou uma
resposta ao grito do homem pobre.
• Ela não deve ser confundida com a mera
reação coletiva contra o sofrimento
intolerável, que ocorreu em outros
momentos da história, nem sequer com a.
prática da greve e outras formas de militância que se tornaram características da
classe trabalhadora.
• Estes acontecimentos também têm sua
própria história que começa muito antes
da revolução industrial.
• O verdadeiramente novo no movimento
operário do princípio do século XIX era a
consciência de classe e a ambição de
classe.
• Os "pobres" não mais se defrontavam
com os "ricos".
1848
• A Revolução de 1848 –
protagonizada pela primeira vez
majoritariamente pelos trabalhadores
– aparece como primeira revolução
moderna européia, que combinou
maior promessa, maior extensão,
maior extensão, maior sucesso inicial
imediato e o mais rápido e
retumbante fracasso.
• Entre 1830 e 1850 o proletariado francês
cresceu substancialmente. Em Lyon esta
classe protagonizou mesmo alguns
levantamentos, que foram, todavia,
duramente reprimidos pelas autoridades.
• Depois destes levantamentos populares
surgiram um pouco por toda a França
sociedades secretas constituídas por
operários, ligadas ao movimento
republicano e ao movimento do socialismo
utópico.
• Dá-se o nome de Revoluções de
1848 à série de revoluções na
Europa central e ocidental que
eclodiram em função de regimes
governamentais autocráticos, crises
econômicas, falta de representação
política das classes médias e
nacionalismo despertado nas
minorias da Europa central e oriental,
que abalaram as monarquias
européias, onde tinham fracassado
as tentativas de reformas políticas e
econômicas.
• Também chamadas de Primavera dos
Povos , tais revoluções, de caráter
liberal democrático e nacionalista,
foram iniciadas por membros da
burguesia e da nobreza que exigiam
governos constitucionais, e por
trabalhadores e camponeses que se
rebelaram contra os excessos e a
difusão das práticas capitalistas.
• Em 1848, influenciada pelo liberalismo,
pelo nacionalismo, pelo socialismo e em
meio a uma conjuntura de crise
econômica (na agricultura e na
superprodução capitalista), eclodiu uma
revolta e o Rei Luís Filipe de Órleans
abdicou do trono.
• Era a “primavera dos povos”. No dia 23 de
abril, ocorreu a primeira eleição na Europa
com sufrágio universal masculino, que
elegeu Luís Napoleão.
• Os anos de 1845 e 1846 foram de péssimas
colheitas, desencadeando uma crise agrícola
em todo o continente. A crise agrícola iniciou-se
em Flandres e na Irlanda, com as péssimas
colheitas de batatas.
• Na Europa ocidental, a má colheita de trigo
desencadeou em 1846 uma série de revoltas
camponesas. Essa crise desencadeou uma alta
vertiginosa do custo de vida, atirou à miséria
grandes setores da população rural e reduziu
drasticamente a sua capacidade de consumo de
produtos manufaturados.
• A crise se agravou atingindo a
indústria e as finanças.
• A crise, naturalmente, não teve
caráter uniforme e atingiu de
forma diferente cada região. Foi
predominantemente industrial na
Inglaterra e na França, mas
sobretudo agricola na Irlanda e
na Itália.
• Centenas de milhares de
insatisfeitos com o desemprego,
mas sem um programa político
claro, descobriram que queriam
derrubar o governo do rei Luís
Filipe, de seus ministros e de
todo o sistema econômico que os
enriquecia às custas dos
trabalhadores.
• No dia seguinte, o centro de Paris estava
cheio de barricadas que assustaram os
burgueses moderados da oposição. Na
fuzilaria morreram cerca de 500 pessoas.
• Os cadáveres foram colocados em carros
iluminados por tochas e desfilaram pelo
centro de Paris, alimentando a
insurreição, dando início a uma luta aberta
que se estendeu por toda Paris.
• Soldados da Guarda Nacional, enviados
para reprimir os manifestantes, uniram-se
a elas.
• O governo ensaiou oferecer reformas para
controlar a rebelião que aumentava de
proporções, mas já era tarde. Na manhã do dia
24, quando inspecionava as tropas, o rei foi
vaiado por elas. Os insurrectos controlavam os
arsenais.
• À tarde, já corriam proclamações republicanas.
Incapaz de reagir, a Luís Filipe só restava
abdicar o trono. O parlamento dissolveu-se. A
Monarquia de Julho tinha sido destronada e
nascia a Segunda República (1848-1852).
• Os grandes burgueses moderados da
oposição estavam exasperados.
• O que mais temiam estava nas ruas: a
revolução social dos pobres.
• As ruas de Paris eram tomadas por um
contingente de 40 á 50 mil manifestantes,
sendo muitos mortos e 15 mil presos.
Barricadas de Paris
durante a revolução de 1848.
Fotos de Hippolyte Bayard e
Thibault..
Barricadas
na rua Saint-Maur,
Paris, 1848
O massacre dos bulevares
Vitor Hugo (1802-85)
• De repente uma janela, dando diretamente para
o inferno, foi aberta com violência. Estivesse
Dante observando através das trevas, e teria
reconhecido o oitavo círculo de seu poema no
fatídico bulevar Montmartre. Um espetáculo
horrendo - Paris nas garras de Bonaparte!
• Os homens armados, amontoados no bulevar,
foram tomados por um súbito frenesi. Não eram
mais homens, mas sim demônios. Para eles não
havia mais uma bandeira, nem lei, humanidade
ou país.
• A matança do bulevar Montmartre foi um
crime sem finalidade, ao qual nenhum
motivo poderia ser atribuído. E no entanto
uma razão, e uma razão muito terrível,
existia. Vamos dizer qual era.
• Existem duas poderosas forças no Estado
- a lei e o povo. Um homem assassina a
lei. Ele vê aproximar-se a hora de pagar, e
não há mais nada a fazer senão
assassinar o povo.
• Louis Bonaparte (1808-73)
alcançou essa glória, e ao
mesmo tempo chegou ao
ápice de sua infâmia.
• Vamos contar como ele fez
isso, e lembrar o que a história
não viu - o assassinato de um
povo por um homem!
• Subitamente, a um dado sinal disparado de um
mosquete - não importa onde ou por quem abriu-se um fogo mortal de metralha contra a
multidão. A metralha é em si mesma uma
multidão; é morte a granel. Não se sabe de
onde vem ou para onde vai; mata, e continua.
• E, no entanto, possui uma espécie de alma. Age
premeditadamente e executa um plano. O
movimento foi inesperado. Foi como um
punhado de raios e trovões arremessados sobre
o povo. Nada poderia ser mais fácil. Possuía
toda a simplicidade da solução de um quebracabeças. A metralha aniquilou o populacho.
• Em um instante havia uma série de
assassinatos estendendo-se por cerca de
quatrocentos metros ao longo do bulevar. Onze
canhões destruíram o Hotel Sallandrouze. Um
tiro atingiu diretamente vinte e oito casas. Os
Banhos de Jouvence foram perfurados. Um
quarteirão inteiro de Paris transformou-se em
um cenário aterrorizante. O ar estava cheio de
gritos de angústia.
• Morte, morte repentina, estava por todos os
lados. Ninguém esperava nada. Havia gente
caindo por todos os lados.
• Ninguém escapava. Os mosquetes e pistolas
eram usados em todas as direções. O Ano Novo
estava se aproximando, e havia lojas cheias de
presentes.
• Uma criança de 13 anos, voando diante do fogo
dos soldados, refugiou-se numa loja da Árcade
Sauveur, e escondeu-se debaixo de uma pilha
de brinquedos. Foi agarrada e massacrada,
enquanto os assassinos abriam as feridas com
seus sabres. Contou-me uma mulher:
"Podíamos ouvir os gritos da pequena criatura
por toda a arcada".
• O 75º Regimento da Linha tomou a barricada da
Porte Saint-Denis. Não houve resistência,
somente carnificina posteriormente.
• Uma mulher que vinha correndo com todas as
suas forças, o cabelo desgrenhado e os braços
esticados para frente, voava pela rue
Poissonière, gritando: "Eles estão nos matando!
Estão nos matando!"
• (...)
• Cheguei ao bulevar. A cena era indescritível. Eu
vi este crime. Eu vi esta tragédia, esta
carnificina. Eu vi esta cega correnteza de morte,
e os corpos de pessoas assassinadas caindo ao
meu lado, e é por esta razão que posso assinar
este livro como testemunha ocular.
• O Governo provisório convocou eleições,
as quais deram vitória aos candidatos da
burguesia e dos latifundiários. Em 25 de
Fevereiro foi implantada a Segunda
República, em resultado de uma
expressiva manifestação; todavia, esta
não veio a corresponder às aspirações
dos operários que reclamavam uma
reforma social.
• O sufrágio universal masculino foi estabelecido
e por proposta dos socialistas, foi reduzida a
jornada de trabalho de 12 para 10 horas diárias.
• Por pressão dos operários e socialistas, foram
criadas as Oficinas Nacionais (ateliers
nationaux) - fábricas com capital estatal e
dirigidas por operários, destinadas a aliviar a
crise econômica e o desemprego, que logo se
tornaram improdutivas e custosas, aumentando
o déficit público - e a Comissão de Luxemburgo,
cujo objetivo era a preparação de projetos de
legislação social e a arbitragem de conflitos de
trabalho.
Reação
• A inexperiência política do governo não
satisfazia nem as reivindicações dos mais
radicais nem as inquietações dos mais
conservadores. Mas era principalmente a crise
econômica que agravava a inquietude de todos
os operários.
• A falta de mercados para vender seus produtos,
o aumento dos impostos, o marasmo
econômico, aliado às agitações políticas e à
fraqueza e hesitação do governo, provocavam
pesadelos no mundo dos negócios.
• Diante do "perigo vermelho", a burguesia
se preparou. Em 23 e 24 de abril de 1848,
ocorreram eleições para a formação de
uma Assembleia Constituinte. O Governo
Provisório cessou as suas funções e deu
lugar a uma comissão executiva de cinco
membros
• Os socialistas e os republicanos
concorriam, mas faltava-lhes organização
em nível nacional e sua influência estava
quase que restrita a Paris.
• Já o Partido da Ordem, que representava
todos os homens preocupados com a
defesa da propriedade, tinha influência
nacional, pois se apoiava nos notáveis das
cidades e aldeias rurais da França, um
imenso país de camponeses.
• O Partido da Ordem elegeu 700 deputados,
alguns favoráveis à monarquia e outros
republicanos moderados. Os republicanos
radicais e os socialistas não conseguiram
eleger nem 100 deputados
• Dominada pelo Partido da
Ordem, a Constituinte passou a
combater as ideias socialistas.
Desempregados e sem meios de
sustento, os operários
revoltaram-se espontaneamente
levantando barricadas e
dispostos a enfrentar o novo
poder estabelecido e controlado
pela burguesia.
• Esta revolução teve significativas
repercussões no resto da Europa. A crise
econômica européia ajudou a Revolução
de 1848 a expandir-se pela Europa,
atingindo também um dos esteios do
Absolutismo, a Áustria, onde o Chanceler
Metternich foi obrigado a renunciar. Até
mesmo o Brasil pôde sentir os efeitos da
onda revolucionária das barricadas
francesas, que inspiraria os rebeldes
pernambucanos na Revolução Praieira.
• O ideal predominante nos demais
países europeus onde houve
revolução não foi o liberalismo,
mas sim o nacionalismo.
• Os revolucionários desses países
queriam libertar seus povos da
dominação estrangeira imposta
pelas decisões do Congresso de
Viena.
• A burguesia apercebera-se dos perigos
das revoluções, tomando consciência de
que seus anseios políticos poderiam ser
alcançados pela via do sufrágio universal,
evitando conflitos e sublevações.
• Assim, a revolução de 1848 foi o
movimento que posicionou definitivamente
burguesia e proletariado em campos
opostos, o que marcaria profundamente
os embates políticos vindouros.
• Ainda em 1848, os governos da Prússia e outros
Estados germânicos atendem algumas
reivindicações sociais por reformas e as forças
liberais ganham espaço para convocar uma
Assembléia Nacional.
• Em 1849, é aprovada a criação de uma
Federação de Estados alemães, que teria um
único parlamento nacional e cuja coroa caberia
a Frederico Guilherme, da dinastia dos
Hohenzollern. Com pressões absolutistas da
Áustria, há um recuo e a Assembléia é
dissolvida. A primeira tentativa de unificação da
Alemanha fracassa.
• A Áustria ainda dominada pelo que
restava do Império Habsburgo controlava
com mão de ferro um território formado
por múltiplas nacionalidades.
• Em 1848, vários movimentos
revolucionários eclodiram por todo o
Império, a começar por Viena. Outras
partes também se levantam, como a
Boêmia (Tchecos), a Hungria e parte da
Itália.
• Embora tenham fracassado, as
revoluções alemãs e italianas de
1848 prepararam o terreno para a
unificação desses países, que foi
realizada entre 1861 e 1871.
• A Áustria, por sua vez, teve que
acatar, desde 1867, o
compromisso de reconhecimento
da soberania húngara.
O 18 Brumário de Luís Bonaparte
Karl Marx (1851-52)
• Hegel observa em uma de suas obras que todos
os fatos e personagens de grande importância
na história do mundo ocorrem, por assim dizer,
duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a
primeira vez como tragédia, a segunda como
farsa.
• Caussidière por Danton, Luís Blanc por
Robespierre, a Montanha de 1845-1851 pela
Montanha de 1793-1795, o sobrinho pelo tio. E
a mesma caricatura ocorre nas circunstâncias
que acompanham a segunda edição do Dezoito
Brumário!
• Os homens fazem sua
própria história, mas não a
fazem como querem; não a
fazem sob circunstâncias de
sua escolha e sim sob
aquelas com que se
defrontam diretamente,
legadas e transmitidas pelo
passado.
• A tradição de todas as gerações mortas
oprime como um pesadelo o cérebro dos
vivos.
• E justamente quando parecem empenhados em
revolucionar-se a si e às coisas, em criar algo
que jamais existiu, precisamente nesses
períodos de crise revolucionária, os homens
conjuram ansiosamente em seu auxilio os
espíritos do passado, tomando-lhes emprestado
os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a
fim de apresentar e nessa linguagem
emprestada.
• No umbral da Revolução de Fevereiro, a
república social apareceu como uma frase,
como uma profecia.
• Nas jornadas de junho de 1848 foi afogada no
sangue do proletariado de Paris, mas ronda os
subseqüentes atos da peça como um fantasma.
• A república democrática anuncia o seu advento.
A 13 de junho de 1849 é dispersada juntamente
com sua pequena burguesia, que se pôs em
fuga, mas que na corrida se vangloria com
redobrada arrogância.
• A república parlamentar, juntamente com a
burguesia, apossa-se de todo o cenário; goza a
vida em toda a sua plenitude, mas o 2 de
dezembro de 1851 a enterra sob o
acompanhamento do grito de agonia dos
monarquistas coligados:"Viva a República!"
• A tradição de todas as gerações mortas
oprime como um pesadelo o cérebro
dos vivos.
• E justamente quando parecem empenhados em
revolucionar-se a si e às coisas, em criar algo
que jamais existiu, precisamente nesses
períodos de crise revolucionária, os homens
conjuram ansiosamente em seu auxilio os
espíritos do passado, tomando-lhes emprestado
os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a
fim de apresentar e nessa linguagem
emprestada.
• A burguesia francesa rebelou-se
contra o domínio do proletariado
trabalhador; levou ao poder o
lúmpen proletariado tendo à
frente o chefe da Sociedade de
10 de Dezembro.
• A burguesia conservava a França
resfolegando de pavor ante os
futuros terrores da anarquia
vermelha;
• Bonaparte descontou para ela esse futuro
quando, a 4 de dezembro, fez com que o
exército da ordem, inspirado pela aguardente,
fuzilasse em suas janelas os eminentes
burgueses do Bulevar Montmartre e do Bulevar
des Italiens.
• A burguesia fez a apoteose da espada; a
espada a domina. Destruiu a imprensa
revolucionária; sua própria imprensa foi
destruída. Colocou as reuniões populares sob a
vigilância da polícia; seus salões estão sob a
Guarda Nacional democrática; sua própria
Guarda Nacional foi dissolvida. Impôs o estado
de sítio; o estado de sítio foi-lhe imposto.
• Assim como os Bourbons
representavam a grande
propriedade territorial e os
Orléans a dinastia do dinheiro,
os Bonapartes são a dinastia
dos camponeses, ou seja, da
massa do povo francês.
• Os pequenos camponeses
constituem uma imensa massa,
cujos membros vivem em
condições semelhantes mas sem
estabelecerem relações
multiformes entre si. Seu modo
de produção os isola uns dos
outros, em vez de criar entre eles
um intercâmbio mútuo.
• Esse isolamento é agravado pelo mau
sistema de comunicações existente na
França e pela pobreza dos camponeses.
• Seu campo de produção, a pequena
propriedade, não permite qualquer divisão
do trabalho para o cultivo, nenhuma
aplicação de métodos científicos e,
portanto, nenhuma diversidade de
desenvolvimento, nenhuma variedade de
talento, nenhuma riqueza de relações
sociais.
• Não podem representar-se, têm
que ser representados. Seu
representante tem, ao mesmo
tempo, que aparecer como seu
senhor, como autoridade sobre
eles, como um poder
governamental ilimitado que os
protege das demais classes e
que do alto lhes manda o sol ou a
chuva.
• Bonaparte representa não o
esclarecimento, mas a
superstição do camponês;
não o seu bom-senso, mas
o seu preconceito; não o
seu futuro, mas o seu
passado
• É preciso que fique bem claro.
• A dinastia de Bonaparte representa não o
camponês revolucionário, mas o conservador;
não o camponês que luta para escapar às
condições de sua existência social, a pequena
propriedade, mas antes o camponês que quer
consolidar sua propriedade; não a população
rural que, ligada à das cidades, quer derrubar a
velha ordem de coisas por meio de seus
próprios esforços, mas, pelo contrário, aqueles
que, presos por essa velha ordem em um
isolamento embrutecedor, querem ver-se a si
próprios e suas propriedades salvos e
beneficiados pelo fantasma do Império.
• Evidentemente a burguesia não tinha
agora outro jeito senão eleger Bonaparte.
• (...)
• A indústria e o comércio, e, portanto, os
negócios da classe média, deverão
prosperar em estilo de estufa sob o
governo forte. São feitas inúmeras
concessões ferroviárias. Mas o lúmpen
proletariado bonapartista tem que
enriquecer.
• Impelido pelas exigências contraditórias de sua
situação e estando ao mesmo tempo, como um
prestidigitador, ante a necessidade de manter
os olhares do público fixados sobre ele, como
substituto de Napoleão, por meio de surpresas
constantes, isto é, ante a necessidade de
executar diariamente um golpe de Estado em
miniatura,
• Bonaparte lança a confusão em toda a
economia burguesa, viola tudo que parecia
inviolável à Revolução de 1848, torna alguns
tolerantes em face da revolução, outros
desejosos de revolução, e produz uma
verdadeira anarquia em nome da ordem, ao
mesmo tempo que despoja de seu halo toda a
máquina do Estado, profana-a e torna-a ao
mesmo tempo desprezível e ridícula.
18 Brumário
Prefácio de Engels à edição de 1885
• A França é o país em que as lutas
históricas de classes sempre foram
levadas mais do que em nenhum
outro lugar ao seu termo decisivo e
onde, portanto, as formas políticas
mutáveis dentro das quais se
movem estas lutas de classes e nas
quais se assumem os seus
resultados, adquirem os contornos
mais acusados.
• Centro do feudalismo na Idade
Média e país modelo da
monarquia unitária de estados
[ou ordens sociais –
standische] desde o
Renascimento a França
demoliu o feudalismo na
grande revolução e fundou a
dominação pura da burguesia
sob uma forma clássica como
nenhum outro país da Europa.
• Também a luta do proletariado cada vez
mais vigoroso contra a burguesia
dominante reveste aqui uma forma aguda,
desconhecida noutras partes.
• Esta foi a razão por que Marx não só
estudava com especial predilecção a
história passada francesa, mas também
seguia em todos os seus pormenores a
história em curso, reunindo os materiais
para os empregar posteriormente, e
portanto nunca se via surpreendido pelos
acontecimentos.
•6. Os nacionalismos
europeus e
a Era dos Impérios
Gilberto Maringoni – UFABC - 2014
História das relações internacionais
Antonio Carlos Lessa
• As décadas de 1850 e 1860 foram o período de
expressão bem sucedida das nacionalidades.
• O século que se iniciou sob os escombros da Revolução
Francesa viu despontar o nacionalismo e o liberalismo
como idéias de forças que foram impulsionadas em
movimentos revolucionários, contidas em
contrarrevoluções e consolidadas na unificação.
• Novas tensões surgiram dessa longa evolução, novos
fatos mudaram a feição da política internacional e das
relações intraeuropeias. O principal deles foi o
surgimento de um poderoso Estado na Europa Central,
com a unificação da Alemanha
• A Era dos Impérios
• Eric Hobsbawm
• O período entre 1875 e 1914 pode ser chamado
de Era dos Impérios não por ter criado um novo
tipo de imperialismo, mas também por um
motivo muito mais antiquado. Foi provavelmente
o período da história mundial moderna em que
chegou ao máximo o número de governantes
que se autodenominavam imperadores ou que
eram considerados pelos diplomatas ocidentais
como merecedores desse título.
• Na Europa, os governantes da
Alemanha, Áustria, Rússia, Turquia e
(em sua qualidade de dirigentes da
índia) Grã-Bretanha reivindicavam
esse título de imperador. Dois deles
(Alemanha e Grã-Betanha/Índia)
eram inovadores dos anos 1870. Eles
mais que compensaram o
desaparecimento do Segundo
Império de Napoleão Bonaparte III,
da França.
• Foi um período de ausência de conflitos entre
as potências européias, o que não significa
ausência de tensões. Nesse período, o mundo
do Congresso de Viena foi reestruturado
completamente. A principal marca do período foi
a universalização da hegemonia européia por
todo o planeta.
• No continente, os principais eventos são o
surgimento da Alemanha, a nova potência, e a
Itália como países unificados, em 1870. Fora da
Europa, o fator a contar foi a ascensão dos
Estados Unidos no centro da cena mundial.
• A base teórica do nacionalismo
econômico
• Georg Friedrich List (1789-1846)
• Foi um dos mais importantes economistas da
primeira metade do século XIX. Investindo
contra as postulações do livre mercado e
elegendo as idéias de Adam Smith como seu
alvo principal,
• List construiu uma pequena, mas contundente
obra, composta especialmente por seu Sistema
nacional de economia política e por centenas de
artigos publicados esparsamente.
• O centro de suas formulações era a idéia
de nação como lócus central da atividade
econômica. Defensor da industrialização e
entusiasta das estradas de ferro na
disseminação do progresso, List batia-se
pelo protecionismo estatal para a indústria
infante, expressão que cunhou
:
• “A característica básica deste meu
sistema reside na NACIONALIDADE (sic).
Toda minha estrutura está baseada na
natureza da nacionalidade, a qual é o
interesse intermediário entre o indivíduo e
a humanidade inteira”.
• Ao se voltar para o passado, o economista dizia:
• “Se pesquisarmos a história de Veneza, sem
preconceitos, verificamos que, em seu caso,
como no de grandes reinos em períodos
posteriores, tanto a liberdade de comércio
internacional, como as restrições impostas a tal
comércio, foram benéficas ou prejudiciais para o
poder e para a prosperidade do país, em
épocas diferentes (...)
• Assim, a História demonstra que as restrições à
liberdade de comércio não são tanto invenções
de mentes meramente especulativas, mas antes
conseqüências naturais da diversidade de
interesses e dos anseios das nações por
independência ou ascendência de poder”.
• List percebeu o que mais tarde viria a ser
conhecido como relações desiguais de troca
entre nações, ao avaliar a disparidade de
valores entre a produção industrial e a agrícola.
Os trechos seguintes indicam o caminho de
suas idéias:
• “Uma nação que só possui agricultura é um
indivíduo que em sua produção material
trabalha com um braço só. (...) Uma nação que
troca produtos agrícolas por produtos
manufaturados estrangeiros é um indivíduo com
um braço só, sustentado por um braço
estrangeiro”.
• Um Estado puramente agrícola é uma
instituição infinitamente menos perfeita
que um Estado agromanufatureiro. Um
Estado meramente agrícola será, do ponto
de vista econômico e político, sempre
dependente dos países estrangeiros, que
recebem seus produtos agrícolas em troca
de bens manufaturados.
• Tal nação não conseguirá determinar
quanto deve produzir, devendo sempre
esperar e verificar quanto os outros
desejarão comprar.
• “Uma nação manufatureira tem centenas de
oportunidades a mais de aplicar a força da
maquinaria do que uma nação agrícola. Um
aleijado, dirigindo um motor a vapor, pode
produzir centenas de vezes mais do que um
homem mais forte pode com sua força manual”.
• Para sanar tais discrepâncias, List propõe uma
política francamente intervencionista:
• “O Estado não somente tem o direito, mas
também o dever de impor certas normas e
restrições ao comércio (o qual é, em si mesmo,
inofensivo), na salvaguarda dos interesses
superiores na nação”.
• “O poder político não apenas
assegura à nação o aumento de
sua prosperidade por meio do
comércio exterior e das colônias
estrangeiras, mas também lhe
garante desfrutar de prosperidade
interna, e a própria existência, o
que é muito mais importante do
que a riqueza material”.
• O que se pode extrair da formulação de um
conceito liberal de nação em List é que,
independente da necessidade de grandes
extensões e populações para o
desenvolvimento da economia nacional, a
ligação entre Estado e nação se fortalece por
somar-se à economia.
• Mas, se as dimensões físicas do território são
relevantes, a nação depende de um contínuo
estado de expansão que realizar-se-ia pela
união ou conquista de populações que, por si
só, seriam incapazes de atingir uma extensão
territorial que favorecesse o desenvolvimento de
sua economia.
• Hobsbawm
• Não se pode negar então que, a concepção
liberal de nação “realizável” era uma expressão
da idéia de progresso humano defendida pelo
século XIX, integrando a nação moderna ao
ideário do liberalismo.
• O princípio de nacionalidade submetido às
categorias criadas pelo liberalismo para definir a
nação não permitia sua aplicação a todos os
projetos políticos nacionais, eliminando qualquer
caracterização desse princípio como universal.
A nação ainda continuava sendo definida em
sua íntima relação com o território através de
um processo político expansionista dos Estados.
• Hobsbawm
• “Assim, na perspectiva da ideologia
liberal, a nação (isto é, a grande nação
viável) representava o estágio de
evolução alcançado na metade do século
XIX. Como vimos, a outra face da moeda
‘nação como progresso’ foi portanto, e
logicamente, a assimilação de
comunidades e povos menores aos
maiores”.
• “No entanto, desde que o número de Estadosnações era pequeno no início do século XIX, a
questão óbvia para as mentes inquiridoras era
quais das numerosas populações européias
classificáveis como uma ‘nacionalidade’, com
alguma base, poderiam tornar-se um Estado (ou
alguma forma menor com reconhecimento
administrativo e político distinto) e quais dos
numerosos Estados existentes estariam
imbuídos do caráter de ‘nação’. A construção de
listas com critérios de existência de nação
potenciais ou reais servia a esse objetivo”.
• A unificação da Alemanha 1871
• A construção do império alemão se
constituiu numa das principais inflexões
da historia das relações internacionais do
último quartel do século XIX. O país
dominaria as relações intereuropeias.
• Fruto da engenharia política do chanceler
prussiano Otto Von Bismarck, o império
alemão ocupou o centro da cena política
européia.
• Em 1870, sua população já era maior que a da
França, com o diferencial de que tinha um nível
educacional mais elevado e uma boa estrutura
universitária e científica.A Alemanha unificada
surgira repentinamente como a maior potência
da Europa continental, com um grande e bem
treinado exército, forças navais em expansão e,
especialmente, dotada de excelente estrutura
de transportes e comunicação, além de um
parque industrial moderno e em expansão.
• Com isso, o equilíbrio do sistema construído no
Congresso de Viena, em 1815, estava
comprometido.
• A partir de 1871, a Alemanha comandada por
Bismarck tinha duas ambições principais.
• Internamente o centro de sua ação passou a ser
o crescimento econômico e o reforço à coesão
do novo país, eliminando as resistências das
minorias absorvidas. No processo de unificação
das províncias francesas da Alsáscia e da
Lorena, mas também de minorias polonesas e
dinamarquesas incorporadas na guerra contra a
Áustria.
• No plano externo, a ação era para garantir a
integridade do Império.
• Guerra franco-prussiana
• A Guerra franco-prussiana o (19 de julho de
1870 - 10 de maio de 1871) foi um conflito
ocorrido entre França e o Reino da Prússia no
final do século XIX. Foi essencial no processo
de unificação alemão.
• Durante o conflito, a Prússia recebeu apoio da
Confederação da Alemanha do Norte, da qual
fazia parte, e dos estados do Baden,
Württemberg e Baviera. A vitória incontestável
dos alemães marcou o último capítulo da
unificação alemã sob o comando de Guilherme I
da Prússia.
• Também marcou a queda de Napoleão III e do
sistema monárquico na França, com o fim do
Segundo Império e sua substituição pela
Terceira República Francesa. Também como
resultado da guerra ocorreu a anexação da
maior parte do território da Alsácia-Lorena pela
Prússia, território que ficou em união com o
Império Alemão até o fim da Primeira Guerra
Mundial.
• As causas da Guerra estão profundamente
enraizadas nos eventos que cercam o equilíbrio
de poder entre grandes potências após as
Guerras Napoleônicas. França e Prússia eram
inimigos durante essas guerras, com a França
do lado derrotado e Napoleão I exilado para
Elba.
• Após a ascensão de Napoleão III e com o final
da Guerra da Criméia, cria-se uma condição
favorável para a unificação Alemã que, em
pouco tempo, os trouxe para a guerra após a
Guerra dos Ducados (1864), contra a
Dinamarca e a Guerra Austro-Prussiana (1866).
• O chanceler prussiano Otto Von Bismarck e
seus generais estavam interessados em uma
guerra contra a França, pois esse país punha
empecilhos à integração dos Estados do sul da
Alemanha na formação de um novo país
dominado pelo Reino da Prússia - o Império
Alemão.
• Por outro lado, os conselheiros de Napoleão III
asseguraram-lhe que o exército francês era
capaz de derrotar os prussianos, o que
restauraria a declinante popularidade do
imperador, perdida em consequência das
inúmeras derrotas diplomáticas sofridas.
• A derrota da França deu-se por ser o exército
prussiano maior e estar mais bem organizado
para a guerra.
• A França apresentou sua rendição, em Metz, no
dia 27 de outubro de 1870. A capitulação oficial
de Paris ocorreu em 28 de janeiro de 1871.
• A população de Paris, entretanto, recusou-se a
depor as armas e, em março de 1871, revoltouse, estabelecendo um breve governo
revolucionário, a Comuna de Paris.
• A Comuna de Paris, que se manteve por 40
dias, foi o primeiro governo operário da história,
fundado em 1871 na capital francesa por
ocasião da resistência popular ante à invasão
alemã , durante a guerra franco-prussiana, foi
considerada a primeira República Proletária da
história. Mas a repressão do governo burguês
foi implacável: 13 mil revolucionários foram
fuzilados e quase 50 mil deportados.
• O maior triunfo de Bismarck ocorreu em
18 de janeiro de 1871, quando Guilherme
I da Prússia foi proclamado imperador da
Alemanha em Versalhes, o antigo palácio
dos reis da França.
• A onerosa obrigação francesa só foi
cumprida em setembro de 1873. Naquele
mesmo mês, as tropas alemãs
abandonaram a França, depois de quase
três anos de ocupação.
• Um reino unido da Itália surgiu nos anos 185870, uma Alemanha unida em 1862-71,
incidentalmente levando ao colapso o Segundo
Império de Napoleão na França e a Comuna de
Paris (1870-71), além de que a Áustria tinha
sido excluída da Alemanha e profundamente
reestruturada.
• Em resumo, com a exceção da Inglaterra, todas
as “potências” européias foram
substancialmente – em muitos casos até
territorialmente – modificadas entre 1856 e
1871, e um novo grande estado, como cedo
viria a ser reconhecido, tinha sido fundado: a
Itália.
Antonio Gramsci
A questão meridional
• A unificação italiana, sonhada já de maneira
embrionária por Maquiavel (1469-1527) – sua
obra O Príncipe é de 1513 -, ocorre tardiamente
com a criação do Reino da Itália, em 1861, sob
a liderança da Casa de Savóia, a monarquia
piemontesa, no bojo de largo e secular
movimento histórico conhecido como o
Ressurgimento.
• O Piemonte, no norte da península, região na
qual o capitalismo mais se desenvolve,
desempenha o papel central na unificação, feita
às expensas do sul, agrário, onde a burguesia
prima pela ausência.
• Gramsci
• “O Sul da Itália pode ser definido como
uma grande desagregação social. Os
camponeses, que constituem a grande
maioria da sua população, não têm
nenhuma coesão entre si. (É evidente que
ocorrem exceções: as Pulhas, a
Sardenha, a Sicília, onde existem
características especiais no grande
quadro da estrutura meridional.)”
Na Itália, enfim unificada, embora
de maneira precária, dada a
fragmentação nacional anterior,
se consolida e cristaliza “a
questão meridional”: perpetua-se
o atraso do sul para subsidiar a
acumulação capitalista no norte.
Continuam e, de certo modo, se
agudizam tensões contra a
unidade italiana.
• Os Estados Unidos
• Na segunda metade do século XIX, os Estados
Unidos aceleram sua expansão econômica,
após a Guerra Civil (1861-75).
• A guerra foi o instrumento decisivo na
construção do Estado nacional nos EUA. As
estimativas apontam para um número de 970
mil mortes, sendo que um terço era composto
por civis. A população total somava 31 milhões
de habitantes (22,1 milhões na Confederação –
norte – e 9,1 milhões na União, sul).
• Em 1861, ano do início da guerra, o país
consistia em 19 estados livres, onde a
escravidão era proibida, e 15 estados onde a
escravidão era permitida.
• Após a independência dos Estados Unidos, e
até a década de 1850, as diferenças entre o
Norte (cada vez mais industrializado) e o Sul
agropecuário aumentavam gradativamente. Na
década de 1850, os Estados Unidos já haviam
se expandido até seus atuais limites territoriais
na América do Norte (posteriormente, adquiriria
o Alasca da Rússia, Havaí e outros territórios
ultramarítimos). O país entrara em uma fase de
rápida industrialização. Porém, o rápido
crescimento econômico do país esteve
concentrado primariamente nos Estados do
Norte.
• Este desenvolvimento causou o
rápido crescimento populacional
das cidades da região, gerando
grandes avanços na área de
transportes e comunicações.
Apesar do Sul também ter
passado por este processo, o
progresso ocorreu muito mais
lentamente do que no Norte.
• Pouco antes das eleições presidenciais de
1860, líderes sulistas começaram a pedir
pela secessão do Sul da União, caso
Lincoln vencesse as eleições. Muitos
sulistas aprovavam a secessão, através
da ideia de que os Estados possuem
direitos e poderes que o governo federal
não poderia proibir através de métodos
legais.
• Os sulistas alegaram que os Estados
Unidos por si mesmo eram uma liga de
estados independentes, e que qualquer
destes estados possuía o direito de tornarse independente.
• A tendência mais impressionante era o
movimento em direção à total liberdade de
comércio. Abertamente apenas a Inglaterra
havia abandonado o protecionismo de forma
total, mas mesmo a Rússia (1863) e a Espanha
(1868) ligaram-se de certa forma ao movimento.
Apenas os Estados Unidos, cuja indústria
apoiava-se grandemente num mercado interno
protegido e era pobre em exportações,
permaneceu um bastião do protecionismo, mas
mesmo assim mostrou alguma modificação no
começo da década de 1870.
• A economia do sul estava baseada no
latifúndio e na mão de obra escrava.
Desde 1820, a escravidão ficou confinada
ao sul.
• O país se inserira na expansão britânica
desde o início do século XIX como
principal fornecedores de matérias primas,
como algodão e recebia – especialmente
no norte – investimentos ingleses para a
modernização da estrutura produtiva.
• Por volta de 1860, a produção industrial dos
EUA já era maior que a da Alemanha e da
Rússia. Nessa época, o país já possuía 50
mil quilômetros de ferrovias, três vezes maior
que a malha ferroviária inglesa. Isso
consolida a ocupação do território e a
expansão interna.
• Vale destacar que o EUA estava em
crescente expansão territorial. Grande parte
do sudoeste do continente (Califórnia,
Arizona, Utah e partes do Colorado e Novo
México) foi tomado do México em 1848-53,
depois de uma guerra desastrosa. A Rússia
vendeu o Alasca em 1867.
• A maior parte do mundo, e especialmente a
Europa, estava atenta aos Estados Unidos
porque nesse período (1848-75) vários
milhões de europeus haviam emigrado para
lá e porque sua grande extensão territorial e
seu extraordinário progresso fizeram-no
rapidamente o milagre técnico do planeta.
• O maior trunfo deste programa se deu em
1862 com o Homestead Act que oferecia a
qualquer filho de família americana, maior de
21 anos, 160 acres gratuitos depois de cinco
anos de residência contínua ou compra por
US$ 1,25 por acre depois de seis meses, que
por obvio fracassou. Nas últimas décadas do
século pouco se ouvia falar do bucólico
sonho de liberdade da terra.
• A transformação dos EUA, portanto, aconteceu
no período de 1848-75, devido a dois temas
mais profundos e duradouros da história
americana localizados na cultura popular: a
Guerra Civil e o Oeste. Sendo que ambos estão
intimamente interligados, já que foi a busca pelo
Oeste que gerou a faísca para a guerra.
• A referida expansão para o Oeste não era coisa
nova, mas foi acelerado de forma drástica
devida o surgimento das estradas de ferro. As
primeiras linhas transcontinentais foram
construídas simultaneamente para o Leste, a
partir do Pacifico, e para o Oeste a partir do
Mississippi, encontrando-se em certo ponto do
Utah.
• As sociedades escravistas, incluindo as
do sul, estavam com os dias contados, já
que elas estavam isoladas fisicamente,
devido a abolição do tráfico negreiro, que
era muito eficiente na década de 1850, e
também isoladas moralmente, devido ao
consenso geral do liberalismo burguês,
que as olhava como contrarias à marcha
da história, moralmente indesejáveis e
economicamente ineficientes.
• Mas o que levou o sul a uma situação de
crise na década de 1850 foi um problema
especifico: a dificuldade de coexistência
com o capitalismo dinâmico no Norte e um
dilúvio de migração para o Oeste.
• Em termos puramente econômicos, o
norte não estava muito preocupado
com o sul, uma região agrária
praticamente não envolvida na
industrialização. Os principais
empecilhos eram políticos, já que a
industria dos Norte estava
certamente mais preocupada com
uma nação, do ponto de vista do
comércio, metade livre e metade
protecionista, do que metade escrava
e metade livre.
• Em resumo, o Norte estava numa
posição de unificar o continente
que o Sul não tinha, por isso se
fez necessária a Guerra Civil que
por quatro anos devastou o país.
• O triunfo do Norte também era o
triunfo do capitalismo americano
e dos Estados Unidos modernos
e de fato o Sul permaneceu
agrário, pobre, atrasado e
ressentido.
O Japão
• De todos os países não -europeus, apenas um
conseguiu encontrar e derrotar o Ocidente no
terreno inimigo, esse país foi o Japão, para a
surpresa dos contemporâneos
• Aos olhos do Ocidente, em meados do séc. XIX,
o Japão não parecia diferente de qualquer outro
país oriental, ou pelo menos afigurava-se
igualmente destinado ao atraso econômico e à
inferioridade militar para tornar-se vítima do
capitalismo.
• O Japão, embora com sua tradição
cultural, era surpreendentemente análogo
ao Ocidente na estrutura social.
• O país possuía algo muito próximo de
uma ordem feudal da Europa medieval,
uma nobreza agrária hereditária,
camponeses semi-servis e um corpo de
mercadores-empresários e financistas
cercados por um corpo incomumente ativo
de artífices, todos assentados em uma
crescente urbanização.
• Os japoneses estavam mais dispostos a
imitar os ocidentais do que muitos outros
grupos não-europeus e eram também os
mais capazes de fazê-lo. Como por
exemplo a China que tinha capacidade,
mas não queria imitar o Ocidente e os
homens cultos do México que queriam
imitar o capitalismo liberal tal como os
EUA, caso em que a vontade era maior do
que a capacidade.
• Mas o Japão possuía ambas, era mais
uma “nação” potencial do que um império
ecumênico, possuíam a capacidade
técnica e outras, além do pessoal
necessário para uma economia do século
XIX.
• A elite japonesa possuía um aparato de
Estado e uma estrutura social capazes de
controlar o movimento de uma sociedade
inteira.
• Em 1853, os Estados Unidos da América
invadiram a baía de Uraga e forçaram o Japão a
abrir-se ao comércio internacional. A partir de
então iniciou-se um período de turbulência que
perdurou até à chamada Restauração Meiji.
• A restauração Meiji (ou revolução de cima), foi
uma sucessão de eventos que conduziu a uma
profunda mudança nas estruturas política,
econômica e social do Japão, que teve lugar em
1868, terminou com o sistema feudal de
duzentos e cinquenta e seis anos dos
xogunatos Tokugawa.
• A unidade política do país permitiu a
centralização da administração pública, e
a intervenção do Estado na economia.
Isso, por sua vez, possibilitou reformas
econômicas que consistiram na
eliminação de entraves e resquícios do
modo de produção feudal, na liberação da
mão-de-obra, e na assimilação da
tecnologia ocidental, preparando o Japão
para o capitalismo.
• Os antigos feudos foram
extintos e os privilégios
pessoais foram eliminados
através de uma reforma
agrária e da reformulação
da legislação do imposto
territorial rural.
• A Rússia
• Ao final do século XIX, o Império Russo
apresentava um extraordinário atraso em
relação às demais potências européias:
• 1. Atraso econômico, a economia ainda era
basicamente agrária, praticada em latifúndios
explorados de forma antiquada, através do
trabalho de milhões de camponeses miseráveis.
A industrialização russa foi tardia, dependente
de capitais estrangeiros e se restringia a
algumas grandes cidades, deste modo a
burguesia russa era extremamente fraca.
• 2. Atraso político o Império Russo era
oficialmente uma autocracia com todos os
poderes centralizados nas mãos do czar. Não
havia partidos políticos legalizados, embora as
agremiações clandestinas fossem bastante
atuantes.
• 3. Em 1861 aboliu-se a servidão e se deu ao
camponês a propriedade da terra em que
construíra sua casa. A reforma acentuou a crise
social, uma vez que a organização social
baseada no mir foi rompida, sendo transformado
numa célula administrativa, pois a comunidade
era coletivamente responsável pelo pagamento
da dívida ao Estado: este assumira o
pagamento das indenizações aos senhores da
nobreza.
• Impérios coloniais
• Num sentido menos superficial, o período que
nos ocupa é obviamente a era de um novo tipo
de Império, o colonial.
• A supremacia econômica e militar dos países
capitalistas há muito não era seriamente
ameaçada, mas não houvera nenhuma tentativa
sistemática de traduzi-la em conquista formal,
anexação e administração entre o final do
século XVIII e o último quartel do século XIX
(período este que predomina a colonização
imperialista da Europa sobre países asiáticos,
africanos e latino americano).
• O mundo definitivamente se
encontrara divido, seja
administrativamente econômica,
política ou social. Essa repartição
do mundo foi à expressão mais
espetacular da crescente divisão
do planeta em fortes e fracos, em
avançados e atrasados.
• Os imperadores e os impérios
eram antigos, mas o
imperialismo era novíssimo. A
palavra foi introduzida na
política Grã-Betanha nos anos
1870, e ainda era considerado
neologismo no fim da década.
• II Revolução Industrial
• No plano econômico e científico, o
período foi marcado pela Segunda
Revolução Industrial e por uma
aguda crise econômico-financeira
entre 1873 e 1896. Mesmo com a
depressão e a queda da atividade
econômica, a produtividade
aumentou em quase todo o mundo
industrializado.
• A Segunda Revolução Industrial
diferenciava-se da primeira
especialmente porque as
transformações nos processos
produtivos não eram resultado de
experimentos ocasionais de
homens práticos, ou seja, do
empirismo tecnológico, mas
decorria de investimentos
planejados de grandes empresas.
• Foram desenvolvidos novos métodos para
a produção de aço e produtos químicos
em grande escala, graças à utilização
sistemática de novas fontes de energia
em substituição ao carvão, como a
eletricidade e o petróleo.
• O desenvolvimento de técnicas como a
refrigeração, a pasteurização e a
esterilização permitiram a conservação e
o transporte de alimentos em grandes
quantidades, facilitando o comércio entre
regiões afastadas.
• O aumento da expectativa de vida do homem
comum foi um dos resultados mais
impressionantes desse estado de
desenvolvimento. Ela passou de 35 anos na
média global em 1800 para 40 anos em 1850 e
para 48 em 1900.
• As relações econômicas internacionais
atingiram um novo patamar de complexidade,
com o crescimento exponencial dos fluxos de
investimentos externos diretos em ferrovias,
portos, serviços de comunicação e serviços
públicos (iluminação, pavimentação etc.), por
parte das maiores economias industriais (GrãBretanha, Alemanha, França e EUA).
• A expansão industrial britânica – com a
acumulação de capitais proporcionada
pela industrialização, transformaram
Londres na capital financeira do mundo.
• O século XIX foi marcado pela
necessidade de transformações de tal
forma, que o índice de progresso de uma
nação podia ser mesurado por sua
capacidade de produção material, bem
como do desenvolvimento de seus meios
de comunicações.
• A tecnologia moderna começou a ser
“visível”, apresentando-se ao povo,
através das locomotivas, dos telégrafos e
dos navios a vapor.
• Além disso, outros avanços tecnológicos
permitiram a invenção das turbinas, dos
motores de combustão interna, do
telefone, do gramofone, da lâmpada
elétrica, do automóvel, do cinematografo ,
da aeronáutica e da radiotelegrafia.
• Vantagem comparativa
• O custo de se fazer vinhos na ilha era
maior que no país ibérico.
• A situação se invertia no caso dos tecidos.
Assim, era vantajoso para ambos usarem
o excedente de suas produções de vinhos
e tecidos para comercializarem entre si.
• Portugal apresentava uma vantagem
comparativa em relação á Inglaterra na
produção de vinhos e esta apresentava a
mesma característica no caso dos tecidos.
Ambos teriam ganhos comerciais entre si.
• A industrialização registra o resto mundo em
semi-colônias, ou seja, presos na gaiola da
especialização. A função dessas colônias ou
semi-colônias é não fazer concorrência com as
grandes potencias mundiais.
• As grandes potencias eram Estados que
adquiriam colônias, as pequenas nações não
tinham, por assim dizer, nenhum direito, pois,
padeciam da perda de terras em guerras e
apropriações indevidas. As principais regiões
onde havia competição pela retenção de terras
ficavam na África e na Oceania.
• A depressão econômica,
por sua vez, acarretou
queda nos salários e o
acirramento dos conflitos
sociais na Europa. Um novo
fenômeno de massas
ocorre a partir de 1870, a
emigração.
• Migração ultramarina
• A metade do século XIX marca também o
começo da maior migração de povos na
História. Seus detalhes não são exatos e não
capturam todos os movimentos de homens e
mulheres dentro e fora dos países.
• Contudo, estimativas apontam que entre 1846 e
1875 um número superior a 9 milhões de
pessoas deixaram a Europa indo, em sua
grande maioria, para o EUA. Trata-se de um
número 4 vezes maior que a população de
Londres em 1851. No meio século precedente,
tal movimentação não superou o valor de 1,5
milhão de pessoas.
• Por que as pessoas emigravam? Sobretudo
por razões econômicas. As perseguições
políticas formavam depois de 1848 apenas
uma pequena fração. A fuga de seitas
religiosas era menos significativa que no
século precedente. As pessoas emigravam
para escapar às más condições em casa ou
para procurar melhores no exterior?
• Os pobres apresentam tendência de emigrar
mais que os ricos... Na primeira grande onda
de imigração de nosso período (1845-54) foi
essencialmente uma fuga de fome, sendo
composta majoritariamente por Irlandeses e
alemães.
• Entre o final dessa década e o início
dos anos 1890 o mundo assiste à
retomada do protecionismo e à
reversão do livre cambismo no plano
internacional.
• Os EUA estabelecem tarifas
protecionistas em 1861 e as
aprofunda em 1890. A Rússia o fez a
partir de 1877, seguida da Itália e da
Áustria, assim como a Alemanha, em
1879, e a França entre 1872 e 1889.
• Eric Hobsbawm
• A Revolução centenária
• Em 1880, no centenário da Revolução
Francesa, o mundo já era praticamente todo
conhecido e mapeado. Tornava-se pouco a
pouco global.
• A sociedade burguesa européia ditava os
costumes e era a responsável pelas
transformações intelectuais. A cultura da elite,
representada pela biblioteca e pelo museu, foi
estendido a toda a população, como uma
exigência do liberalismo, mas estava articulada
com os interesses das classes dominantes.
• Crise
• A depressão econômica que marcou o
período, juntamente com a rapidez e a
intensidade da industrialização e a
repercussão das idéias nacionalistas
amplificaram as pressões sobre a ação
internacional dos Estados do núcleo do
sistema, incentivando políticas
imperialistas e o desenvolvimento de
novas formas de dominação sobre regiões
menos desenvolvidas.
• A ferrovia e a navegação a vapor haviam
reduzido as viagens intercontinentais ou
transcontinentais a uma questão de semanas,
em vez de meses. Com o telégrafo elétrico, a
transmissão de informação ao redor do mundo
era agora uma questão de horas.
• Ao mesmo tempo, o mundo era muito mais
densamente povoado. As cifras demográficas
são tão especulativas, sobretudo no que tange
ao final do século XVIII, que a precisão
numérica é inútil e perigosa; mas não deve ser
muito equivocado supor que os
aproximadamente 1,5 bilhões de seres
humanos vivos nos anos 1880 representavam o
dobro da população mundial dos anos 1780.
• A tecnologia era uma das principais causas dessa
defasagem, acentuando-a não só econômica como
politicamente. Um século após a Revolução
Francesa, tornava-se cada vez mais evidente que
os países mais pobres e atrasados podiam ser
facilmente vencidos e (salvo se fossem muito
grandes) conquistados, devido à inferioridade
técnica de seus armamentos.
• Em termos de política internacional (isto é, na
avaliação dos governos e ministérios das relações
exteriores da Europa), o número de entidades
tratadas como Estado soberanos no mundo inteiro
era bastante modesto para nossos padrões.
• Fora das Américas, que continham o
maior conjunto de repúblicas do globo,
praticamente todos esses Estados eram
monarquias – na Europa as únicas
exceções eram a Suíça e (a partir de
1870) a França – embora os países
desenvolvidos fossem, em sua maioria,
monarquias constitucionais ou que, ao
menos, acenavam com iniciativas oficiais
favoráveis a algum tipo de representação
eleitoral.
• O investimento estrangeiro na América
Latina atingiu níveis assombrosos nos
anos 1880, quando a extensão da rede
ferroviária argentina foi quintuplicada, e
tanto a Argentina como o Brasil atraíram
até 200 mil imigrantes por ano.
• Será que um período com um aumento
tão espetacular da produção podia ser
descrito como uma “Grande Depressão”?
• Como podemos sintetizar a economia
mundial da Era do Império?
• Em primeiro lugar, como vimos, foi uma
economia cuja base geográfica era muito
mais ampla do que antes. Sua parcela
industrializada e em processo de
industrialização aumentara. O mercado
internacional dos produtos primários
cresceu enormemente.
• Por conseguinte, como já foi
observado, a economia mundial
agora era notavelmente mais
pluralista que antes. A economia
britânica deixou de ser a única
totalmente industrializada e, na
verdade, a única industrial. A era dos
Impérios, como veremos, foi
essencialmente caracterizada pela
rivalidade entre Estados.
• A Era do Império já não era
monocêntrica. Esse pluralismo
crescente da economia mundial
ficou, até certo ponto, oculto por
sua persistente e, na verdade,
crescente dependência dos
serviços financeiros, comerciais e
da frota mercante da GrãBretanha.
• A maior parte do mundo não estava numa
posição de determinar seu próprio destino. Este
mundo de vítimas consistia em quatro setores
mais importantes:
• 1) os impérios não-europeus sobreviventes ou
grandes reinos independentes do mundo
islâmico e da Ásia (o Império Otomano, Pérsia,
China, Japão e outros menores);
• 2) as antigas colônias da Espanha e Portugal
nas Américas (estados nominalmente
independentes);
• 3) a África ao sul do Saara;
• 4) as vítimas já formalmente colonizadas ou
ocupadas, sobretudo na Ásia.
• Os impérios coloniais das potências européias
consistiam em umas poucas regiões onde uma
maioria ou uma minoria de colonos brancos
coexistia com uma população indígena de
razoável importância. Colônias do “colono
branco” viriam criar o mais intratável problema
de colonialismo.
• O problema das populações nativas era o de
como resistir ao avanço dos colonos brancos. A
escassez de brancos fez com que fosse
essencial usar nativos em grande número para
esta administração, pelo menos ao nível local.
• Ou seja, os colonizadores precisaram
criar um corpo de nativos assimilados
para tomar o lugar do homem branco
e também de depender das
instituições tradicionais dos países.
Por outro lado, os povos indígenas
confrontavam o desafio da
ocidentalização como algo muito
mais complexo do que mera
resistência.
• A Índia, a maior colônia, ilustra as
complexidades e paradoxos desta
situação. Os ingleses esforçaram-se para
inserir um processo de ocidentalização,
sobretudo por causa das necessidades de
mesma administração e mesma
economia. Ambas destruíram a estrutura
social e econômica existentes, mesmo
quando não era a intenção.
• Portanto, após longos debates, T.B.
Macaulay (1800-59) – e sua famosa
Minuta (1835) – estabeleceu um sistema
de educação puramente inglês para os
poucos indianos nos quais o British Raj
tinha interesse oficial, ou seja, os
administradores subalternos. Os ingleses
recusaram-se ou fracassaram na tentativa
de ocidentalização porque os indianos
eram um povo dominado e por causa dos
riscos políticos da excessiva interferência
em práticas populares.
Economia
Um balanço
• A economia capitalista mudou de quatro formas
significativas ao longo do século XIX. Em
primeiro lugar, entramos agora numa nova era
tecnológica, não mais determinada pelas
invenções e métodos da primeira Revolução
Industrial.
• Agora chegava-se a um período de novas
fontes de poder (eletricidade e petróleo, turbinas
e motor a explosão), de nova maquinaria
baseada em novos materiais (ferro, ligas, metais
não-ferrosos), de indústrias baseadas em novas
ciências tais como a indústria em expansão da
química orgânica.
• Em segundo lugar, entramos também agora
cada vez mais na economia de mercado de
consumo doméstico, iniciada nos Estados
Unidos, desenvolvida (na Europa ainda
modestamente) pela crescente renda das
massas, mas sobretudo pelo substancial
aumento demográfico dos países
desenvolvidos.
• Em terceiro lugar, uma reviravolta paradoxal
teve lugar. A era do triunfo liberal tinha sido
aquela era de fato do monopólio industrial
inglês, dentro do qual (com algumas notáveis
exceções) os lucros eram assegurados sem
muita dificuldade pela competição de pequenas
e médias empresas.
• A era pós-liberal caracterizava-se por uma
competição internacional entre economias
industriais nacionais rivais – a inglesa, a
alemã, a norte-americana; uma
competição acirrada pelas dificuldades
que as firmas dentro de cada uma destas
economias enfrentavam (no período de
depressões) para fazer lucros adequados.
A competição levava, portanto, à
concentração econômica, controle de
mercado e manipulação.
• O mundo entrou no período do
imperialismo. Além da rivalidade (que
levou as potências a dividir o globo entre
reservas formais ou informais para seus
próprios negócios) entre mercados e
exportações de capital, tal processo
também era devido à crescente nãodisponibilidade de matérias-primas na
maioria dos próprios países
desenvolvidos, por razões geológicas ou
climáticas.
• A Conferência de Berlim e a partilha da
África - Paul Kennedy
• No inverno entre 1884 e 1885, o chanceler
Bismarck convidou os principais líderes de
14 países a participarem de uma
conferência na capital do II Reich- a
Conferência de Berlim. Esta reunia chefes
de Estado de grandes potências
européias e Estados menores, e tinha
como objetivo chegar a um acordo sobre a
ocupação da África- acordos de comércio,
navegação e limites no Congo e na África
Ocidental- evitando choques imperialistas,
o que conduziria a um conflito europeu de
grande porte.
• O Japão não participou da
conferência por ser considerado
atrasado, apesar da sua
modernização, diferente dos Estados
Unidos que estavam na conferência
interessados nos assuntos sobre
comércio e navegação. A Rússia se
encontrava na conferência- mesmo
que seus interesses na África não
fossem muitos, estava por apoio à
França contra a Inglaterra.
• Na conferência acordou-se que as potências
deveriam assegurar que nos territórios
ocupados por elas deva existir uma autoridade
capaz de fazer respeitar os direitos, como a
liberdade de comércio e de trânsito.
• “As Potências (...) obrigação de assegurar, nos
territórios ocupados por elas (...) de fazer
respeitar os direitos adquiridos, a liberdade do
comércio e do trânsito nas condições em que for
estipulada”. (artigo 35).
• A Conferência de Berlim era a
manifestação mais concreta do fato de as
regiões menos desenvolvidas do mundo
estarem sendo rapidamente retalhadas.
• Um país com centenas de milhões de
camponeses pouco representaria. Por
outro lado, até mesmo um Estado
moderno seria ofuscado também se não
tivesse uma base produtiva industrial
suficientemente grande.
• “As potências bem sucedidas
serão as que tiverem maior base
industrial”, advertiu o imperialista
britânico Leo Amery. “Os povos
que tiverem o poder industrial e o
poder da inovação e da ciência
serão capazes de derrotar todos
os outros”, completava.
• O neocolonialismo europeu na África serviu ao
propósito de amenizar as tensões dentro da
Europa, ao exportar desentendimentos entre
fronteiras para outras regiões, evitando conflitos
bélicos e mantendo o equilíbrio de poder no
continente, conquistado desde 1815, com as
políticas do Congresso de Viena. Impedia, ainda,
pretensões das recentes nações naquele território.
• Novas aquisições expandiam suas áreas de
influência e, desta forma, representavam uma
vantagem estratégica. Do ponto de vista religioso,
ou mesmo a partir do debate de raças e da crença
de superioridade ariana, a colonização era uma
resposta para o sentimento de incumbência de
civilizar outras regiões, a qual justificava o processo
de colonização e exploração imperialista.
• Da formação de fronteiras artificiais, medidas e
determinadas pelos interesses dos detentores
do poder, resultou a proximidade de excolônias e metrópoles, a qual favoreceu
determinadas nações nas relações comerciais
bélicas e treinamento militar durante as guerras.
• Foi também fator gerador de instabilidade
política, resultado do ajuntamento de reinados e
sociedades distintas sob um só poder, eleitas e
administradas pelos europeus. Para conquistar
e controlar seus novos territórios, as nações
colonizadoras se valeram de políticas que
preteriam grupos sobre outros, através da
eleição de cargos públicos e de alto escalão, ou
restringindo o acesso à educação.
• Suas medidas estimularam as diferenças
sociais e incitaram sentimentos negativos
entre etnias e raças, as quais não
raramente conviviam em harmonia antes
da interferência europeia.
• A técnica conhecida como “dividir para
conquistar” foi mais um elemento que
favoreceu a instabilidade política na
região, a qual por sua vez foi responsável
por inúmeros golpes de Estado e produziu
diversos governos ditatoriais desde então.
• África minha
• Eduardo Galeano
• No final do século XIX, as potências
coloniais européias se reuniram, em
Berlim, para repartir a África.
Foi longa e dura a luta pelo botim colonial,
as selvas, os rios, as montanhas, os
solos, os subsolos, até que as novas
fronteiras fossem desenhadas e no dia de
hoje de 1885 foi assinada, "em nome de
Deus Todo-Poderoso", a Ata Geral.
• Os amos europeus tiveram o bom gosto de não
mencionar o ouro, os diamantes, o marfim, o
petróleo, a borracha, o estanho, o cacau, o café,
e óleo de palmeira, proibiram que a escravidão
fosse chamada pelo seu nome,
chamara de "sociedades filantrópicas" as
empresas que proporcionavam carne humana
ao mercado mundial.avisaram que atuavam
movidos pelo desejo de "favorecer o
desenvolvimento do comércio e da Civilização",
e, caso houvesse alguma dúvida, explicava, que
atuavam preocupados "em aumentar o bemestar moral e material das populações
indígenas".
• Assim a Europa
inventou o novo mapa
da África.
Nenhum africano
compareceu, nem
como enfeite, a essa
reunião de cúpula.