As bodas de Caná

Download Report

Transcript As bodas de Caná

As bodas de Caná
(João 2,1-11)
Bodas de Caná
• Leitura já “viciada” por devoção mariana
• Figura de Maria é mesmo tão relevante?
– Cadê o nome dela?
– Ênfase na intercessão?
– Ênfase na ordem aos servos?
• É necessário
– superar a devoção mariana e
– ler o texto sob nova perspectiva.
1 No terceiro dia, houve um casamento em Caná
da Galileia e a mãe de Jesus estava lá
• “terceiro dia”:
– Ex 19,11.15.16 = no terceiro dia, Deus deu a Lei
(Torá) ao povo
– Evangelhos = no terceiro dia, Jesus ressuscitou
– então... “terceiro dia” = tempo “teológico” : o
momento certo da ação de Deus
1 No terceiro dia, houve um casamento em Caná
da Galileia e a mãe de Jesus estava lá
• Caná:
– em hebraico, verbo kanah significa “adquirir,
comprar”
– em um casamento, o noivo “adquire” uma
esposa
• Casamento / núpcias:
– no Antigo Testamento, símbolo da ALIANÇA
entre Deus e Israel
– na Aliança no Sinai, Javé adquiriu seu povo
como esposa (Ex 15,11)
1 No terceiro dia, houve um casamento em Caná
da Galileia e a mãe de Jesus estava lá
• A mãe de Jesus:
– nunca citada pelo nome: Jo 2,12; 6,42; 19,25
– figura que deve ser lida sempre em dois níveis:
• nível material: a mulher que é a mãe de Jesus
• nível simbólico: figura da Igreja
– ela chegou antes dele:
• referência à Antiga Aliança
• mas com abertura para a obra que seu filho
veio realizar
2 Ora, tanto Jesus como seus discípulos foram
convidados para o casamento
• Notar diferença:
– a mãe está, Jesus é convidado
– a mãe pertence à Antiga Aliança
– Jesus, como Messias, é convidado, mas não
pertence à Antiga Aliança
3 Tendo faltado vinho, a mãe de Jesus lhe disse:
“Eles não tem vinho”
• Núpcias = Aliança
• Vinho:
– símbolo dos dons divinos: graça, alegria,
virtude, sabedoria... salvação, vida espiritual,
vida com sentido
• Acabou o vinho, acabou a festa
• Acabou o vinho = a Antiga Aliança já não tem
mais sentido... já não traz mais os dons
divinos...
3 Tendo faltado vinho, a mãe de Jesus lhe
disse: “Eles não tem vinho”
• “Eles não tem vinho”
– intercessão?
• = faça alguma coisa para salvar a festa!
– constatação?
• = não há nada que possa ser feito
• o judaísmo tornou-se uma religião vazia,
não mais dá a vida
• e não há nada que se possa fazer para
consertar...
4 E Jesus disse a ela: “Que queres de mim,
mulher? A minha hora ainda não chegou.”
• “Que queres de mim”:
– Literalmente: Que há entre mim e ti?
• O que nós temos a ver com isso?
• Enfatiza a distância e diferença de interesses
• “Mulher”:
– Apelativo nunca usado por filho para falar com
sua mãe!
– Não falta de respeito, mas tratamento normal
para uma senhora (Jo 19,26; 20,13; 8,10; )
– Referência a Gn 2,23: “Ele a chamou ‘mulher’” ?
4 E Jesus disse a ela: “Que queres de mim,
mulher? A minha hora ainda não chegou.”
• “Minha hora”
– a “hora” de Jesus é a HORA da manifestação
da sua GLÓRIA, que acontecerá na cruz
• “ainda não chegou”
– Recusa? Então a mãe desobedeceu!
– Aceitação? Então Jesus está dizendo: o que
vai acontecer agora não é a GLÓRIA, é só
antecipação, é só SINAL!
5 A sua mãe disse aos servidores: “O que ele
acaso vos disser, fazei!”
• Ordem da mãe aos servidores:
– desobediência à recusa do filho?
• Então... a mãe de Jesus é incoerente:
– obedeçam em tudo, mas ela não obedece!
• Mas... a frase da mãe de Jesus deve ser
ligada à celebração da Aliança no Sinai:
5 A sua mãe disse aos servidores: “O que
ele acaso vos disser, fazei!”
• Ex 19,8 e 24,3.7:
– “Faremos tudo o que o Senhor disser”
• A frase se refere à Aliança - núpcias de
Javé com seu povo
– Expressão da disposição de entrar na Aliança
com Javé e de cumprir todos os preceitos do
pacto
6 Ora, estavam colocadas lá seis talhas de pedra,
segundo o ritual de purificação dos judeus, cabendo
em cada uma delas duas ou três medidas
• Descrição minuciosa:
– o número das talhas (seis),
– o material de que eram feitas (pedra)
– a capacidade e o peso de cada uma (duas ou
três medidas. Uma medida = cerca de 40
litros. Portanto, não podiam ser movidas)
6 Ora, estavam colocadas lá seis talhas de pedra,
segundo o ritual de purificação dos judeus, cabendo
em cada uma delas duas ou três medidas
• Referências ao judaísmo:
– a finalidade: rito da purificação
– o material - pedra - o mesmo das tábuas da Lei
(Ex 31,18;32,15;34,1.4; Dt 4,13; 5,22; 9,9.10.11;
1Rs 8,9)
• Mas... as talhas estão vazias
– o judaísmo, com seus rituais, está vazio, perdeu
o sentido
7 Jesus lhes disse: “Enchei as talhas com água” e
eles as encheram até a boca.
• Jesus manda encher para mostrar que o
que era ficção agora será realidade, mas
independentemente da lei antiga.
• A Lei não pode purificar; a realidade
proposta por Jesus, sim.
• “Até a boca”:
– a nova realidade que Jesus oferece é
completa e plena
8 Disse-lhes, então: “Agora, tirai e levai chefe dos
servidores”. E eles levaram.
9 Mas, quando o chefe dos servidores provou da água
transformada em vinho ― ele não sabia de onde era,
mas os servidores que tinham tirado a água sabiam ―
o chefe dos serventes chamou o noivo
• Contraste: o chefe não sabe, os
servidores sabem
– chefe: lideranças judaicas, que só
reconhecem a Lei
– servidores: os que obedecem a palavra de
Jesus
10 e lhe disse: “Todo homem põe primeiro o bom
vinho e, quando estão todos embriagados, o ruim.
Tu guardaste o vinho bom até agora”
• Afirmação indica duas coisas:
– a superioridade do vinho novo
– a surpresa de que o novo seja melhor que o
antigo
• O noivo é Javé (cf. casamento = Aliança)
• O vinho bom guardado até agora é a Nova
Aliança (= Evangelho)
10 e lhe disse: “Todo homem põe primeiro o bom
vinho e, quando estão todos embriagados, o ruim.
Tu guardaste o vinho bom até agora”
• Afirmação... é crítica ou elogio?
– de qualquer forma, sublinha que vinho novo é
superior ao antigo
– mas também surpresa (indignação?) de que novo
vinho (aliança nova) seja superior ao antigo
11 Jesus fez este início dos sinais em Caná da
Galileia, manifestou a sua glória e os seus
discípulos creram nele
• “manifestou a sua glória”
– A glória do Filho é realizar a glória do Pai
– Finalidade da Aliança com Israel: salvar a
humanidade (esta é a glória do Pai).
– como no Sinai, celebração da Aliança termina
com manifestação da glória (Ex 24,16-17)
• “seus discípulos creram”
– o sinal cumpriu seu objetivo: fazer crer
– discípulos são os que enxergam além do
milagre, e alcançam o significado do sinal
Em resumo:
•
•
•
•
Núpcias = Aliança entre Javé e seu povo
Vinho = os dons divinos: alegria, vida etc.
A mãe de Jesus = a Igreja
serventes = os que são chamados a fazer
Aliança com Jesus (fazer tudo o que ele
disser)
• talhas vazias e depois com água = o
judaísmo está vazio, não pode dar vida
Jesus e a samaritana
(João 4)
Jesus e a samaritana (Jo 4,1-42)
• Rápidas observações exegéticas para uma
melhor compreensão do texto.
• Dois pontos importantes:
– os “maridos” da samaritana
– o gênero literário “encontro junto ao poço”
1.- Os “maridos” da samaritana
• Que significa “marido”?
– em grego: ’anér
= homem, varão, marido
– em hebraico: ba‘al
= marido, senhor, divindade
• Mas, é necessário ler 2Rs 17,29-31:
2Reis 17,29-31
29Mas
cada nação fabricava o seu próprio
deus e os instalava nos santuários dos
lugares altos feitos pelos samaritanos. Assim
fazia cada nação na cidade em que habitava.
30Os babilônios fizeram Socot-Benot, os
cutenitas, fizeram Nergel, os ematitas,
fizeram Asima’, 31os avitas, fizeram Nebaaz
e Tartaq, e os sefarvaimitas queimavam seus
filhos para Adramalec e Anamelec, os
deuses de Sefarvaim.
32Mas
veneravam também Javé e
constituíram para si sacerdotes nos
lugares altos dentre sua própria gente, e
eles oficiavam nos santuários dos lugares
altos. 33Ainda que venerassem Javé,
serviam também a seus próprios deuses,
segundo o costume das nações das quais
foram trazidos.
2.- Encontro junto ao poço
• Gênero literário comum a vários relatos bíblicos.
• Esquema básico:
- o homem chega ao poço
- a mulher chega ao poço
- dificuldade
- ele tira a água
- ela volta para casa
- ele é convidado para uma refeição
- os dois se casam
- nasce um filho
• Exemplo: Ex 2,15b-22:
Moisés fugiu da presença de Faraó, e foi morar
na terra de Madiã, e sentou-se junto a um poço.
O sacerdote de Madiã tinha sete filhas, as quais
vieram tirar água e encher os bebedouros para
dar de beber às ovelhas de seu pai. Mas vieram
pastores, querendo expulsá-las. Moisés então se
levantou e as socorreu, e deu de beber às
ovelhas. Quando elas voltaram a Reuel, seu pai,
ele perguntou: “Por que voltastes tão cedo hoje?”
Elas responderam: “Um egípcio livrou-nos das
mãos dos pastores, depois tirou água para nós
e deu de beber às ovelhas”. Replicou-lhes
Reuel: “E onde está ele? Por que deixastes
partir este homem? Chamai-o para que coma
alguma coisa”. Moisés aceitou ficar com aquele
homem, que deu sua filha Séfora a Moisés. Ela
deu à luz um filho, e Moisés o chamou de
Gersom, pois dizia: “Sou peregrino em terra
estrangeira”.
• Outros relatos com mesmo esquema:
Gn 24:
o servo de Abraão e Rebeca
Gn 29:
Jacó e Raquel
Jo 4:
Jesus e a samaritana
Conclusão sobre Jo 4
• O episódio narrado em Jo 4 é fortemente
simbólico:
– A mulher não é uma adúltera nem uma
prostituta; ela é a personificação da
Samaria, capital do reino do norte.
– Os cinco maridos não são seres humanos
do sexo masculino, e sim cinco divindades
cultuadas pelos povos que foram
transplantados para a Samaria durante a
dominação assíria.
– Jo 4 usa o gênero do encontro junto ao
poço para descrever a acolhida do
evangelho pelos samaritanos, isto é,
como a Samaria “se casou” com Jesus.
(Lembrar: a comunidade de João tinha
muitos samaritanos)
– Objetivo do relato: estabelecer um
contraste com os judeus de raça pura,
que ao longo de todo o Quarto
Evangelho perseguem e matam Jesus.