Os Lousíadas
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Transcript Os Lousíadas
Luís Vaz de Camões
1525 – 1580?
“Ó mar salgado, quanto de teu sal
São lágrimas de Portugal!(...)”
(Fernando Pessoa)
BIOGRAFIA ESCASSA E
CONTRADITÓRIA
•
•
•
•
Nascimento = Lisboa - Portugal.
Estudos Regulares = Coimbra - Portugal
[grande conhecimento erudito]
Origem familiar = Família fidalga que
teria empobrecido.
Pai = Simão Vaz de Camões - Mãe =
Ana de Sá Macedo.
ACONTECIMENTOS MARCANTES DE
SUA VIDA:
•
•
•
Participação em batalhas e viagens pelas
terras portuguesas na África e na Ásia.
Em 1549, em uma batalha [Ceuta - norte da
África] , incorporado ao exército português,
perde o olho direito.
Depois das batalhas segue sua vida
conflituada na corte, que transitava entre os
corredores da nobreza e a boêmia de Lisboa.
ACONTECIMENTOS MARCANTES DE
SUA VIDA:
•
•
Em 1552 envolve-se em uma briga com
Gonçalo Borges, encarregado das cavalariças
do rei, e o fere no pescoço, com a espada,
sendo preso por isso.
Fica na prisão por um ano e só sai porque
Gonçalo o perdoa.
ACONTECIMENTOS MARCANTES DE
SUA VIDA:
•
•
Em 1553 embarca para o oriente, onde fica
por aproximadamente 15 anos, passando por
diversos países, nos quais recolhe dados
para a produção de sua obra prima:
OS LUSÍADAS.
ACONTECIMENTOS MARCANTES DE
SUA VIDA:
• No Oriente vive sem muitos cuidados, sendo
preso por dívidas não pagas e vivendo de
esmolas e ajudas de amigos, como o cronista
Diogo do Couto e o historiador Pêro de
Magalhães Gandavo.
ACONTECIMENTOS MARCANTES DE
SUA VIDA:
•
Numa viagem pelas costas da China, para
combater os ataques piratas contra as terras
portuguesas, o navio em que Camões estava
naufraga, perto da foz do rio Mekong. Neste
naufrágio morre Dinamene, uma ex-escrava
chinesa que teria sido talvez o único amor
real do poeta.
ACONTECIMENTOS MARCANTES DE
SUA VIDA:
• Dinamene, entretanto, não era o verdadeiro
nome da moça e sim o de uma Ninfa oceânica
e Camões passa a referir-se à amada usando
este nome depois que ela morre afogada no
mar (Dinamene = divindade do mar)
ACONTECIMENTOS MARCANTES DE
SUA VIDA:
•
Com a ajuda de Diogo do Couto, Camões
retorna a Portugal em 1569, trazendo os
originais de “Os Lusíadas” - que ele,
segundo diz a mitologia que cerca sua vida,
ao salvar-se do naufrágio, teria levado nas
mãos, a salvo das águas, enquanto nadava
em busca de terra firme - e lamentando não
ter em suas mãos os originais de
“Parnaso”, obra lírica que lhe teria sido
roubada.
ACONTECIMENTOS MARCANTES DE
SUA VIDA:
•
Após a publicação de sua obra épica, em
1572, Camões passa a receber uma ajuda
anual de 155 mil réis dada pelo Estado.
Apesar deste dinheiro, morre na miséria em
10 de junho de 1580, sendo enterrado graças
à caridade da Companhia dos Cortesãos.
“Cantando espalharei por toda a parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.”
Os Lusíadas
Os Lusíadas = lusos = portugueses
•
MODELOS CLÁSSICOS: “A ilíada” e “A
odisséia” de Homero - “Eneida” de
Virgílio
•
GÊNERO LITERÁRIO: ÉPICO
DIFERENÇAS DO GÊNERO ÉPICO
CLÁSSICO:
•
Do HERÓI
Em vez da figura do herói com forças
sobrehumanas, a figura de VASCO DA GAMA
(herói de “Os Lusíadas”) é diluída para dar
espaço aos Portugueses em geral, vistos
como “herói coletivo”.
DIFERENÇAS DO GÊNERO ÉPICO CLÁSSICO:
• Na tradição épica, ocorre o “maravilhoso
pagão”, isto é, a interferência de deuses da
mitologia nas ações humanas. Em “Os
Lusíadas”, também há a presença de deuses
da mitologia clássica, porém o paganismo
convive com idéias do cristianismo (“o
maravilhoso cristão”), já que essa era a opção
religiosa do autor e dos portugueses em geral
que também sofriam a pressão da Inquisição,
que controlava as publicações.
ESTRUTURA POÉTICA:
•
VERSOS: Seguindo a medida nova,
implantada no Classicismo, Camões compõe
sua obra máxima em decassílabos (versos de
10 sílabas poéticas).
ESTRUTURA POÉTICA:
•
ESTROFES: A estrofe adotada para a composição
de “Os Lusíadas” é chamada de OITAVA RIMA
(CAMONIANA), sendo composta de OITO versos
DECASSÍLABOS, com RIMA (ABABABCC), onde os
6 primeiros versos formam rimas cruzadas ou
alternadas e os 2 últimos formam rimas
emparelhadas ou paralelas. Os versos também são
chamados de HERÓICOS, porque têm como sílabas
mais forte a 6ª e a 10ª sílaba. São versos próprios
para os cantos épicos, heróicos. Às vezes aparecem
decassílabos SÁFICOS, com sílabas mais fortes na
4ª, 8ª e 10ª sílaba.
CANTOS:
•
A obra está dividida em 10 cantos, que podem
ser comparados aos capítulos de um romance
contemporâneo. Na totalidade da obra, temos
1102 estrofes de oito versos, o que dá um
total de 8816 versos decassílabos perfeitos.
ESTRUTURA NARRATIVA:
•
Inspirado no modelo épico clássico, Camões
estrutura sua obra principal da mesma
maneira que os antigos, dividindo-a em 5
partes:
ESTRUTURA NARRATIVA:
•
PROPOSIÇÃO: três primeiras estrofes do
canto I, em que é apresentado o poema
(assunto).
•
INVOCAÇÃO: estrofes 4 e 5 do canto I, em
que o poeta pede auxílio às ninfas(musas) do
Tejo (Tágides) para compor sua obra
ESTRUTURA NARRATIVA:
•
DEDICATÓRIA: da estrofe 6 até a 18 do
canto I, em que o poeta dedica sua obra a D.
Sebastião, rei de Portugal.
•
NARRAÇÃO: da estrofe 19 do canto I até a
estrofe 144 do canto X (10), em que é narrada
a aventura em si (a história da viagem de
Vasco da Gama à Índia).
ESTRUTURA NARRATIVA:
•
EPÍLOGO: as estrofes finais do canto X
(10) [145 a 156], em que se termina o
poema, com uma mostra bastante
dolorosa da desilusão do autor com uma
pátria que não merece mais ser cantada
e elevada.
ESTRUTURA NARRATIVA:
•
As três primeiras partes (PROPOSIÇÃO INVOCAÇÃO - DEDICATÓRIA) formam uma
espécie de Introdução ao poema; e a parte
final (EPÍLOGO) serve como um fechamento
da obra, no qual o poeta retoma seu diálogo
com Dom Sebastião, o alerta sobre os perigos
que corre Portugal e mostra ao rei sua
responsabilidade como condutor desta nação
gigantesca e gloriosa.
O NARRADOR:
• Na segunda estrofe da obra, apresenta-se um
narrador em primeira pessoa, o “EU” que vai
conduzir a narrativa . Este narrador pode ser
entendido como sendo o próprio CAMÕES,
uma vez que se trata de um narrador que, entre
outras coisas, interpreta os acontecimentos,
emite julgamentos e adverte seus
contemporâneos.
O NARRADOR:
• Ao lado do “EU” (poemático), em primeira
pessoa, temos o narrador onisciente
(observador), em terceira pessoa, que sabe
tudo a respeito de todos e descreve fatos,
idéias, sentimentos, que ocorrem na terra e no
mar, no céu e no inferno, no passado e no
presente.
O NARRADOR:
•
Esta focalização atua na parte maior do
poema épico, que chamamos de
NARRAÇÃO. Em OS LUSÍADAS, começa a
partir da estrofe 19 do Canto I. Também é
preciso estar atento ao fato de que há partes
na obra que são narradas por um dos
personagens, como Vasco da Gama (Cantos
3, 4 e 5), Paulo da Gama (no Canto 8), etc.
TEMPO E ESPAÇO NARRATIVO:
•
A viagem de Vasco da Gama para o Oriente
tem início no ano de 1497 e termina, com a
chegada em Calecut, na Índia, em 1498. Este
é o tempo histórico que vai ser relatado na
obra. Porém, dentro destes dois anos em que
se dá a viagem de Vasco da Gama, temos por
meio das memórias e lembranças que são
apresentadas pelos personagens, vários
séculos da história portuguesa.
ESPAÇO:
•
Temos o mar como cenário básico: os
oceanos Atlântico e Índico que vão
sendo conquistados pelos navegadores
portugueses. E ao longo desta viagem
rumo ao Oriente, vão sendo
apresentadas várias regiões por onde
passam os navios e onde se passam
histórias anteriores que são
relembradas.
A NARRAÇÃO
•
•
•
•
•
•
•
Resumidamente, podemos dizer que a Narração é
contada na seguinte seqüência:
Cantos I e II - viagem de Moçambique a Melinde.
Cantos III e IV - a História de Portugal, anterior às
navegações.
Canto V - viagem de Belém (Portugal) a Melinde.
Canto VI - viagem de Melinde a Calecut (Índia).
Cantos VII e VIII - a estadia na Índia.
Cantos IX e X - regresso e parada na Ilha dos
Amores.
A viagem de Vasco da Gama = ÍNDIA
O ENREDO DE “ OS LUSÍADAS ”
Resumo dos Cantos
Primeiros versos do Canto I
As armas e os barões assinalados,
Que da ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca de antes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;
Primeiros versos do Canto I
E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis, que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando;
E aqueles, que por obras valerosas
Se vão da lei da morte libertando;
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.
CANTO I
• Neste canto aparecem as três partes que
compõe o que seria a Introdução da obra
(PROPOSIÇÃO - INVOCAÇÃO e
DEDICATÓRIA);
• Na Proposição (três primeiras estrofes do
Canto) o poeta delimita o assunto que vai
ser cantado (narrado) – os temas
apresentados são três:
CANTO I
• A) “as armas e os barões assinalados...”
(os homens que enfrentaram os mares
desconhecidos, venceram todos os
perigos e criaram um novo reino em terras
distantes)
• B) “as memórias daqueles Reis...” (os
monarcas portugueses que possibilitaram
as navegações e, assim, ampliaram os
domínios de seu reino e cumpriram a
missão de cristianizar povos infiéis);
CANTO I
• C) “aqueles que por obras valerosas se
vão da lei da morte libertando...” (os
heróis que nasceram nestas navegações,
aqueles homens que superaram os
limites, praticaram atos heróicos, e
passaram a viver na memória dos
portugueses como modelos a serem
seguidos).
Canto I
• Na Invocação (quarta e quinta estrofes do
Canto) o poeta pede ajuda às ninfas
(Tágides – ninfas, deusas que habitam as
águas do Tejo – o principal rio de
Portugal) para a composição do poema.
Canto I
E vós, Tágides minhas, pois criado
Tendes em mim um novo engenho ardente,
Se sempre em verso humilde celebrado
Foi de mim vosso rio alegremente,
Dai-me agora um som alto e sublimado,
Um estilo grandíloquo e corrente,
Porque de vossas águas, Febo ordene
Que não tenham inveja às de Hipoerene.
Canto I
• Na Dedicatória (estrofes: seis até dezoito do
Canto) o poeta faz uma homenagem ao Rei D.
Sebastião, dedicando a ele os versos que vai
cantar. Neste trecho, o poeta fala com o Rei,
ainda jovem demais para assumir o trono
português (herdou o trono com apenas 3 anos
– mas só foi coroado com 14 anos), e lhe diz
que aceite os versos, como forma de dizer ao
rei que este deve conhecer a história e a força
de seu país antes de governá-lo.
Canto I
• O Rei D. Sebastião foi o último grande rei
português, e quando este rei morre, na batalha
de Alcácer-Quibir, morre com ele o sonho
português de seguir sendo um grande império
mundial. O culto a este passado glorioso de
Portugal, presença constante na literatura
deste país ao longo dos séculos, é chamado de
sebastianismo, do qual serão adeptos autores
como Pe. Antônio Vieira e Fernando Pessoa
(em seu livro Mensagem).
D. Sebastião = O “Desejado”
1554-1578
Canto I
• O episódio do mais importante do Canto I é o
CONCÍLIO DOS DEUSES, momento em que
os deuses discutem o destino da navegação,
ficando Júpiter, Vênus e Marte a favor dos
portugueses e Baco contra os lusitanos.
Canto I
• Terminado o Concílio dos Deuses, seguem os
portugueses a navegação pela costa africana.
Camões não segue uma narrativa*
cronologicamente ordenada: sua narrativa
começa quando os portugueses já estão na
costa oriental da África, entre Madagascar e
Moçambique, já tendo passado o Cabo das
Tormentas.
• *Narrativa “in media res” = “no meio dos acontecimentos” –
típico das epopéias clássicas.
Canto I
•
•
No final do Canto I temos a reflexão de
Camões sobre a fragilidade do homem diante
dos imprevistos (perigos) da vida :
“No mar tanta tormenta e tanto dano,/ Tantas
vezes a morte apercebida!/ Na terra tanta
guerra, tanto engano,/ Tanta necessidade
avorrecida!/ Onde pode acolher-se um fraco
humano,/ Onde terá segura a curta vida,/ Que
não se arme, e se indigne o Céu sereno/
Contra um bicho da terra tão pequeno?”
Canto II
•
Narração da viagem entre Mombaça e
Melinde, pela costa oriental do continente
africano. Superando as investidas de Baco
(que com suas maquinações e disfarces,
insuflava os mouros contra os portugueses),
salvos pela intervenção de Vênus, os
portugueses chegam à Melinde, cidade em
que são bem recebidos (Embora tendo
sempre Vênus intercedendo pelos lusitanos,
Vasco da Gama implora proteção celeste,
dirigindo-se ao Deus cristão).
Canto III
• A abertura do terceiro Canto é um momento
importante da narrativa, pois aqui vai se dar a
mudança de foco narrativo. O poeta (Camões),
que nos dois primeiros Cantos nos apresenta a
parte final da viagem de Vasco da Gama, agora
passa a palavra para o personagem, para o
próprio Vasco da Gama, que vai relatar ao Rei
de Melinde todo o glorioso passado de Portugal
até a viagem que ele mesmo fez contornando o
continente africano e chegando a Melinde.
Canto III – Episódio Inês de Castro
Canto III – Episódio Inês de Castro
• Um dos episódios mais marcantes da História
de Portugal, cantado por diversos poetas ao
longo do tempo, a trágica morte de Inês de
Castro merece igualmente destaque nas
páginas de Os Lusíadas.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• Resumidamente, trata-se de um caso de
amor que envolve D.Pedro de Portugal e
Inês de Castro, figura que entra na Corte
Portuguesa pelas mãos da esposa de
D.Pedro, D.Constança de Castela.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• D.Pedro acaba por apaixonar-se por Inês de
Castro e com ela tem três filhos. Após a
morte da esposa, com medo de que Inês se
tornasse Rainha de Portugal quando
D.Pedro assumisse o trono de seu pai,
D.Afonso IV, alguns nobre da Corte
Portuguesa convencem o Rei a matá-la, o
que este, depois de alguma hesitação,
manda fazer no ano de 1355.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• Camões, através da fala de Vasco da Gama,
destaca do episódio sua carga romântica e
dramática, deixando em segundo plano as
questões políticas que o marcam.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 118:
• Passada esta tão próspera vitória,
Tornando Afonso à Lusitana Terra,
A se lograr da paz com tanta glória
Quanta soube ganhar na dura guerra,
O caso triste e dino da memória,
Que do sepulcro os homens desenterra,
Aconteceu da mísera e mesquinha
Que depois de ser morta foi Rainha.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 118:
• O rei Afonso voltou a Portugal, depois da vitória
contra os mouros, na Batalha do Salado,
esperando obter tanta glória na paz quanto
obtivera na guerra. Então aconteceu o triste e
memorável caso da desventurada que foi
rainha depois de ser morta, assassinada.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 119:
Tu, só tu, puro Amor, com força crua,
Que os corações humanos tanto obriga,
Deste causa à molesta morte sua,
Como se fora pérfida inimiga.
Se dizem, fero Amor, que a sede tua
Nem com lágrimas tristes se mitiga,
É porque queres, áspero e tirano,
Tuas aras banhar em sangue humano.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 119:
• O Amor (Eros = o deus mitológico do amor),
somente ele, foi quem causou a morte de Inês,
como se ela fosse uma inimiga. Dizem que o
Amor feroz, cruel, não se satisfaz com as
lágrimas, com a tristeza, mas exige, como um
deus severo e despótico, banhar seus altares
(“aras”) em sangue humano: requer sacrifícios
humanos.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 119:
• O amor, surge neste episódio personificado
(Eros = o deus do amor) como causa da
morte de Inês. É apresentado como um
sentimento negativo e antitético (que contém
antítese = contraditório), pois seduz mas gera
as maiores tragédias e tem em Inês uma
heroína trágica, vítima desse amor cruel e
despótico (tirânico). É caracterizado
negativamente:
“puro amor com força crua”, “fero...áspero e
tirano”
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 120:
Estavas, linda Inês, posta em sossego,
De teus anos colhendo doce fruto,
Naquele engano da alma, ledo e cego,
Que a Fortuna não deixa durar muito,
Nos saudosos campos do Mondego,
De teus fermosos olhos nunca enxuto,
Aos montes ensinando e às ervinhas
O nome que no peito escrito tinhas.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 120:
• Inês estava em Coimbra, sossegada, usufruindo
(“colhendo doce fruto”) da felicidade ilusória (“engano
da alma, ledo e cego”) e breve (“Que a Fortuna não
deixa durar muito”) da juventude. Nos campos, com
os belos olhos úmidos de lágrimas de amor, repetia o
nome do seu amado aos montes (para cima, para o
alto) e às ervas (para baixo, para o chão).
• Mondego = rio que banha a cidade de Coimbra e que,
segundo os versos, nunca seca devido às lágrimas de
Inês de Castro = referência às cantigas medievais.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 122:
De outras belas senhoras e Princesas
Os desejados tálamos enjeita,
Que tudo enfim, tu, puro amor, despreza,
Quando um gesto suave te sujeita.
Vendo estas namoradas estranhezas,
O velho pai sesudo, que respeita
O murmurar do povo, e a fantasia
Do filho, que casar-se não queria,
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 122:
• O Príncipe, por amar Inês, se recusa a casar com
outras mulheres (tálamo: casamento, leito conjugal)
porque o amor despreza, rejeita tudo que não seja o
rosto do amado (gesto significa rosto, semblante) a
quem está sujeito. Ao ver este estranho amor, este
comportamento estranho de não querer se casar, o
pai sisudo (sério, grave) atende ao murmurar do povo
e…
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 123:
Tirar Inês ao mundo determina,
Por lhe tirar o filho que tem preso,
Crendo co”o sangue só da morte indina
Matar do firme amor o fogo aceso.
Que furor consentiu que a espada fina,
Que pôde sustentar o grande peso
Do furor Mauro, fosse alevantada
Contra uma fraca dama delicada?
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 123:
• (... manda matar (D.Afonso IV) Inês de Castro,
para matar a chama do amor que mantém seu
filho (D. Pedro está “preso” = apaixonado por
Inês) preso. Que loucura fez com que a espada
que venceu os árabes fosse erguida contra
uma dama tão delicada?)
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 124:
• Traziam-na os horríficos algozes
Ante o Rei, já movido a piedade:
Mas o povo, com falsas e ferozes
Razões, à morte crua o persuade.
Ela com tristes e piedosas vozes,
Saídas só da mágoa, e saudade
Do seu Príncipe, e filhos que deixava,
Que mais que a própria morte a magoava,
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 124:
• Quando os horríveis e cruéis carrascos,
membros do Conselho de D.Afonso IV,
trouxeram Inês perante o rei, este já estava
compadecido (com dó) e arrependido. No
entanto, o povo persuadia, incitava o rei a
mandar matá-la. Inês, então, com palavras ou
com a voz triste, sentindo mais pela dor e
saudade do príncipe e dos filhos do que pela
própria morte…
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 125:
• Para o Céu cristalino alevantando,
Com lágrimas, os olhos piedosos
(Os olhos, porque as mãos lhe estava atando
Um dos duros ministros rigorosos);
E depois nos meninos atentando,
Que tão queridos tinha, e tão mimosos,
Cuja orfandade como mãe temia,
Para o avô cruel assim dizia:
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 125:
• ... erguendo os olhos cheios de lágrimas ao céu
(somente os olhos, porque um carrasco
prendia-lhe as mãos) e, depois, olhando para
as crianças - que amava tanto e temia que
ficassem órfãs -, disse para o avô cruel (o rei):
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 126:
-‘Se já nas brutas feras, cuja mente
Natura fez cruel de nascimento,
E nas aves agrestes, que somente
Nas rapinas aéreas tem o intento,
Com pequenas crianças viu a gente
Terem tão piedoso sentimento
Como c’o a mãe de Nino já mostraram,
E c’os irmãos que Roma edificaram;
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 126:
• “Se já vimos que até os animais selvagens, cujos
instintos são cruéis, e as aves de rapina têm piedade
com as crianças, como demonstraram as histórias da
mãe de Nino e a dos fundadores de Roma…”
• Semíramis, rainha da Assíria e mãe de Nino, cuja mãe
a abandonara num monte, onde fora alimentada por
aves de rapina. Rômulo e Remo, fundadores de
Roma, foram abandonados quando infantes
(crianças) e amamentados por uma loba.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 127:
-”Ó tu, que tens de humano o gesto e o peito
(Se de humano é matar uma donzela
Fraca e sem força, só por ter sujeito
O coração a quem soube vencê-la),
A estas criancinhas tem respeito,
Pois o não tens à morte escura dela;
Mova-te a piedade sua e minha,
Pois te não move a culpa que não tinha.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 127:
• Sendo assim, o rei Afonso IV, que tinha o rosto e o
coração humanos (se é que é humano matar uma
mulher só porque esta ama um homem que a
conquistou), poderia ao menos ter respeito e
consideração às crianças, ainda que não se
importasse com a triste morte da mãe. Inês suplica,
então, que o rei se compadeça dela e das crianças, já
que não queria perdoá-la ou absolvê-la de uma culpa,
um crime, que não tinha cometido.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 130:
Queria perdoar-lhe o Rei benino,
Movido das palavras que o magoam;
Mas o pertinaz povo, e seu destino
(Que desta sorte o quis) lhe não perdoam.
Arrancam das espadas de aço fino
Os que por bom tal feito ali apregoam.
Contra uma dama, ó peitos carniceiros,
Feros vos amostrais, e cavaleiros?
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 130:
• O rei bondoso queria, pensou, em perdoar
Inês, comovido por suas palavras. Mas o povo
obstinado, persistente, e o destino de Inês (que
assim o quis) não lhe perdoaram. Os que
proclamavam (os conselheiros) que ela deveria
morrer puxam suas espadas. Mostram-se
cruéis atacando uma dama... e ainda querem
ser chamados de fidalgos (nobres)?
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 132:
Tais contra Inês os brutos matadores
No colo de alabastro, que sustinha
As obras com que Amor matou de amores
Aquele que depois a fez Rainha;
As espadas banhando e as brancas flores,
Que ela dos olhos seus regadas tinha,
Se encarniçavam, férvidos e irosos,
No futuro castigo não cuidosos.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 132:
Tais contra Inês os brutos matadores,
No colo de alabastro, que sustinha
As obras com que Amor matou de amores
Aquele que despois a fez Rainha,
As espadas banhando e as brancas flores,
Que ela dos olhos seus regadas tinha,
Se encarniçavam, fervidos e irosos,
No futuro castigo não cuidosos.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 132:
• Assim, agem os cruéis assassinos de Inês. A ferem no
pescoço (“colo”) que sustenta o belo rosto (“as obras”:
o sorriso, o olhar, os movimentos do rosto) pelo qual
se apaixonou (o deus Amor, Cupido, Eros, fez morrer
de paixão) o príncipe, que depois a fará rainha. Os
algozes (os matadores) banham, lavam suas espadas
de sangue e também as “brancas flores”, molhadas
pelas lágrimas de Inês. Atacavam enraivecidos, sem
pensarem no castigo que o futuro lhes reservava.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 135:
As filhas do Mondego a morte escura
Longo tempo chorando memoraram,
E, por memória eterna, em fonte pura
As lágrimas choradas transformaram;
O nome lhe puseram, que inda dura,
Dos amores de Inês, que ali passaram.
Vede que fresca fonte rega as flores,
Que lágrimas são a água e o nome Amores.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• 135:
• As ninfas do Mondego (rio de Portugal),
durante muito tempo, lembraram chorando a
trágica morte de Inês. E, para sua memória
eterna, as lágrimas transformaram-se numa
fonte chamada “dos amores de Inês”,
acontecidos ali. A fonte que rega as flores é
refrescante porque é feita de lágrimas e de
amores.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• Após a morte de Inês. Seguem-se seis meses
de desavenças entre o Rei D. Afonso IV e seu
filho D. Pedro. Por causa da morte de Inês, D.
Pedro revolta-se contra seu pai e, apoiado por
Castela, estabelece um conflito bélico que vai
gerar uma espécie de guerra civil em Portugal.
Canto III – Episódio Inês de Castro
• No fim, as pazes são feitas, e, quando morre
D. Afonso IV, D. Pedro assume o trono
português, vingando-se dos conselheiros que
levaram seu pai a matar Inês, coroando-a
como Rainha de Portugal. Ou seja, dizem
que mandou desenterrá-la e a corou Rainha,
obrigando os conselheiros a prestarem
homenagens beijando sua mão.
Canto III – Episódio Inês de Castro
“La Reine Morte", de Henry de Montherlant é a obra que serve de
inspiração ao filme que retrata o tema mais apaixonante da história
portuguesa: o romance trágico de D. Pedro com Inês de Castro.No
filme, os protagonistas são franceses e é falado em língua francesa. No
entanto na película há atores portugueses de renome.
Canto IV
•
Segue a narração da História de Portugal (A
ascensão do mestre de Avis a rei de Portugal D. João I – e os sonhos proféticos de D.
Manuel sobre a conquista da Índia) até o
início da viagem de Vasco da Gama, que parte
pelo mar sendo amaldiçoado por um velho que
alerta sobre os perigos da conquista (episódio
do VELHO DO RESTELO) . Diz o velho que
aquele que busca os inimigos distantes, acaba
esquecendo dos inimigos que estão próximos.
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• No final do Canto IV, nos é apresentado um
velho que, da praia do Restelo em Lisboa, grita
aos marinheiros, revelando-se como a única
voz discordante em toda esta primeira parte do
livro, pois ele questiona o valor de tamanha
empresa.
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• Para ele, toda esta viagem e esta sede de
conquista são motivadas por desejos vãos de
glória, pela cobiça. Além disso, ele alerta
para os sacrifícios que serão feitos, para as
mortes que acontecerão. Trata-se do único
momento em que Camões modifica seu olhar
aristocrático da história, destacando os que
se sacrificam (marinheiros, guerreiros...) em
nome da glória, que é dos nobres.
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• Mais adiante, o velho vai alertar para o fato de
que Portugal se desprotege ao mandar tantos
homens para as conquistas das terras
distantes. Em outras palavras, para conquistar
o mundo, Portugal esquece de cuidar de
Portugal. O Reino se desguarnece e fica
vulnerável aos ataques árabes e de Castela
(Espanha), e a essência portuguesa é
esquecida em nome das glórias vãs.
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• No final, o velho ainda amaldiçoa os
navegadores, na figura do primeiro que
lançou um barco ao mar. Ele deseja que os
feitos marítimos jamais sejam lembrados e
que os nomes desses navegadores sejam
esquecidos para sempre, que nunca sejam
tema para nenhum poeta.
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 94:
"Mas um velho d'aspeito venerando,
Que ficava nas praias, entre a gente,
Postos em nós os olhos, meneando
Três vezes a cabeça, descontente,
A voz pesada um pouco alevantando,
Que nós no mar ouvimos claramente,
C'um saber só de experiências feito,
Tais palavras tirou do experto peito:
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 94:
• Mas um velho de aspecto respeitável (venerável),
que estava entre as pessoas, na praia, olhando
para os navegadores e balançando a cabeça
negativamente, levantou um pouco mais alto a voz
grave, que foi ouvida claramente pelo que estavam
no mar, e com uma sabedoria feita de experiências
disse algumas palavras sábias, inteligentes, e
profundas (“experto peito” - “experto” = experiente,
experimentado, culto, inteligente).
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 95:
—"Ó glória de mandar! Ó vã cobiça
Desta vaidade, a quem chamamos Fama!
Ó fraudulento gosto, que se atiça
C'uma aura popular, que honra se chama!
Que castigo tamanho e que justiça
Fazes no peito vão que muito te ama!
Que mortes, que perigos, que tormentas,
Que crueldades neles experimentas!
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 95:
• Este prazer dos homens de dominar e a cobiça fútil e
sem valor da fama são tolices ilusórias, passageiras
(“vaidade”). Esta satisfação falsa, enganadora, é
estimulada pelas pessoas que a chamam de honra.
Isso castiga grandemente os homens de coração
tolo, vazio (“peito vão”) que ambicionam o poder e a
fama; fazendo com que experimentem muitos
suplícios (“mortes”, “perigos”, “tormentas”) e
crueldade.
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 95:
• Note que a expressão “peito vão”, nesta estrofe, se
opõe à “experto peito”, na estrofe anterior.
Essas estrofes remetem ao livro bíblico de
Eclesiastes, em que o rei Salomão afirma e
argumenta que “é tudo vaidade” (Eclesiastes 1:2) e
que “Melhor é ouvir a repreensão do sábio, do que
ouvir alguém a canção do tolo.” (Eclesiastes 7:5).
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 96:
— "Dura inquietação d'alma e da vida,
Fonte de desamparos e adultérios,
Sagaz consumidora conhecida
De fazendas, de reinos e de impérios:
Chamam-te ilustre, chamam-te subida,
Sendo dina de infames vitupérios;
Chamam-te Fama e Glória soberana,
Nomes com quem se o povo néscio engana!
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 96:
• Esta ambição causa angústia e perturbação
(“inquietação d’alma e da vida”), é origem de
abandonos e adultérios e destrói fortunas e Estados.
Chamam-na de nobre e elevada, quando é digna,
merecedora, de desmoralizantes insultos, palavras
infamantes. Fama e glória são palavras para enganar
o povo ignorante e tolo.
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 97:
—"A que novos desastres determinas
De levar estes reinos e esta gente?
Que perigos, que mortes lhe destinas
Debaixo dalgum nome preminente?
Que promessas de reinos, e de minas
D'ouro, que lhe farás tão facilmente?
Que famas lhe prometerás? que histórias?
Que triunfos, que palmas, que vitórias?
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 97:
• E o velho pergunta que novos desastres
serão causados ao reino e ao povo, em nome
de (disfarçados em) alguma palavra
enobrecedora. Que promessas fáceis serão
feitas de reinos, de minas de ouro, famas,
histórias e triunfos para enganá-los?
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 102:
— "Ó maldito o primeiro que no mundo
Nas ondas velas pôs em seco lenho,
Dino da eterna pena do profundo,
Se é justa a justa lei, que sigo e tenho!
Nunca juízo algum alto e profundo,
Nem cítara sonora, ou vivo engenho,
Te dê por isso fama nem memória,
Mas contigo se acabe o nome e glória.
Canto IV – Episódio do Velho do
Restelo
• 102:
• O Velho amaldiçoa o homem que fez o primeiro barco
(“pôs velas nas ondas”), como merecedor do inferno
(“dino da eterna pena do profundo”), se houver justiça
como a que ele acredita. Que nunca sejam feitos um
alto conceito, nem música (“cítara sonora”) ou poesia
(“vivo engenho”) que eternize sua memória por este
feito (“Te dê por isso fama nem memória”), mas que,
com o inventor do primeiro barco, morram sua fama,
sua reputação (“seu nome”) e sua glória.
CANTO V
•
Vasco da Gama conta ao rei de Melinde toda
sua viagem, de Portugal até Melinde,
passando pelas ilhas do Atlântico, pelas
costas africanas (onde ocorre o episódio do
VELOSO) e pelo Cabo das Tormentas,
personificado no GIGANTE ADAMASTOR, o
mais importante episódio deste canto.
Camões interrompe, às vezes, a narração de
Vasco da Gama. Neste canto, por exemplo,
lamenta que os grandes navegantes não
gostem de poesia.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• Entre as estrofes 37 e 60, do Canto V, aparece
um dos episódios mais interessantes da obra: o
do Gigante Adamastor, um dos gigantes que
enfrentou Júpiter (Zeus) em uma batalha mortal
e que acabou transformado no Cabo das
Tormentas (espaço geográfico situado ao sul
do continente africano).
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• Adamastor interpela os lusos, questiona suas
intenções e conta sua própria história, revela
seu amor por Tétis e desfaz-se em lágrimas
ao final.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• No plano histórico, simboliza a superação pelos
portugueses do medo do “Mar Tenebroso”, das
superstições medievais que povoavam o
Atlântico e o Índico de monstros e abismos.
Adamastor é uma visão, um espectro, uma
alucinação que existe só nas crendices dos
portugueses. É contra seus próprios medos
que os navegadores triunfam.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• No plano lírico é um dos pontos altos do poema,
retomando dois temas constantes da lírica
camoniana: o do amor impossível e o do amante
rejeitado.
• Adamastor, um dos gigantes filhos da Terra,
apaixonou-se pela nereida Tétis. Não
correspondido, tenta tomá-la, provocando a cólera
de Júpiter, que o transforma no Cabo das
Tormentas, personificado numa figura
monstruosa, lançada nos confins do Atlântico.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• Uma tempestade ameaça a esquadra de Vasco
da Gama, quando ela se aproxima do Cabo
das Tormentas. Eis que uma figura gigantesca,
horrenda e ameaçadora surge no ar. É
Adamastor, que ameaça os portugueses,
dizendo-lhes que o preço de haverem
descoberto seu segredo seria alto. Profetiza os
naufrágios que ocorreriam em suas águas, e os
horrores por que passariam os que àquela terra
viriam a ter.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• Vasco interpela o Gigante, perguntando-lhe quem
era. Disse ser ele o Tormentório (Cabo das
Tormentas). Muito tempo atrás, apaixonara-se pela
bela ninfa (deusa das águas) Tétis, a quem vira um
dia sair pela praia em companhia das nereidas
(deusas que habitam o mar). Compreendendo que
por ser gigante, feio e disforme, não poderia
conquistá-la por meios normais, resolveu
participar da guerra dos gigantes contra Júpiter,
sem tentar subir ao Olimpo, mas buscando
conquistar os mares de Netuno.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• Sabendo que era impossível conquistar Tétis
por sua feiúra, Adamastor decidiu participar
da guerra e revelou seu amor a Dóris, mãe da
ninfa. Esta, por medo, contou tudo a filha e
Tétis não se mostrou disposta a suportar o
amor do gigante. Então, Dóris enganou
Adamastor prometendo-lhe dar um jeito para
solucionar o problema.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• Dóris fez com que a bela Tétis lhe aparecesse
nua... E ele, desesperado de desejo, começou
a beijar-lhe os lindos olhos, a face e os
cabelos. Mas, aos poucos, percebeu,
horrorizado, que, na verdade, estava beijando
um penedo (rochedo) e ele próprio se
transformara noutro penedo. Aquela Tétis que
ele vira era apenas um 'arranjo' artificial que os
deuses prepararam para puni-lo por sua
audácia.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• Sua carne se transformou em terra dura, seus
ossos viraram rochas, seus membros se
espalharam por longínquas águas; enfim, os
deuses o transformaram no cabo (o Cabo das
Tormentas),que, como ironia final, é banhado
pelas águas de Tétis.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• Então, o gigante termina seu relato caindo num
choro assustador e se afasta dos lusos. A
nuvem negra que os cobria se desfaz e Vasco
pede proteção ao Deus cristão contra as
maldições que Adamastor jogou sobre eles.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 38:
• Tão temerosa vinha e carregada,
Que pôs nos corações um grande medo;
Bramindo, o negro mar de longe brada,
Como se desse em vão nalgum rochedo.
"Ó Potestade (disse) sublimada:
Que ameaço divino ou que segredo
Este clima e este mar nos apresenta,
Que mor cousa parece que tormenta?"
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 38:
• A nuvem escura que surgiu vinha tão carregada que
encheu de medo os navegantes. O mar, ao longe,
fazia grande ruído ao bater contra os rochedos. Vasco
da Gama, atemorizado, lança voz à tempestade
(rogando ao poder sublime de Deus) perguntando o
que era ela, que ela lhe parecia mais que uma
simples tormenta marinha. Repare que o cenário
aterrador fará a imagem do Gigante ainda mais
terrível e assustadora.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 39:
Não acabava, quando uma figura
Se nos mostra no ar, robusta e válida,
De disforme e grandíssima estatura;
O rosto carregado, a barba esquálida,
Os olhos encovados, e a postura
Medonha e má, e a cor terrena e pálida,
Cheios de terra e crespos os cabelos,
A boca negra, os dentes amarelos.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 39:
• Vasco da Gama não havia terminado de falar
quando surgiu uma figura enorme, de rosto
fechado, de olhos encovados, de postura má,
de cabelos crespos e cheios de terra, de boca
negra e de dentes amarelos. Era a assustadora
e horrível imagem do gigante.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 40:
Tão grande era de membros, que bem posso
Certificar-te que este era o segundo
De Rodes estranhíssimo Colosso,
Que um dos sete milagres foi do mundo.
Cum tom de voz nos fala, horrendo e grosso,
Que pareceu sair do mar profundo.
Arrepiam-se as carnes e o cabelo,
A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo!
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 40:
• A figura do gigante era tão enorme que poder-seia jurar ser ela o segundo Colosso de Rodes
(Estátua de Apolo, de 33 metros de altura, que
guardava a entrada do porto da cidade de Rodes,
uma ilha da Ásia Menor e que foi considerada
como uma das sete maravilhas do mundo antigo).
A introdução da fala do Gigante fez arrepiar os
cabelos e a carne dos navegantes.Ou seja, a
princípio, quando viram o gigante sentiram medo.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 41:
“E disse: - "Ó gente ousada, mais que quantas
No mundo cometeram grandes cousas,
Tu, que por guerras cruas, tais e tantas,
E por trabalhos vãos nunca repousas,
Pois os vedados términos quebrantas
E navegar meus longos mares ousas,
Que eu tanto tempo há já que guardo e tenho,
Nunca arados d’estranho ou próprio lenho:
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 41:
• O gigante chama os portugueses de ousados e
afirma que nunca repousam e que tem por meta a
glória particular, pois chegaram aos confins do
mundo. Repare na ênfase que se dá ao fato de
aquelas águas nunca terem sido navegadas por
outros: o gigante diz que aquele mar que há tanto
ele guarda nunca foi conhecido por outros. Ou
seja, por seus mares distantes e nunca cruzados
os lusos ousam navegar.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 42:
-“Pois vens ver os segredos escondidos
Da natureza e do úmido elemento,
A nenhum grande humano concedidos
De nobre ou de imortal merecimento,
Ouve os danos de mim, que apercebidos
Estão a teu sobejo atrevimento,
Por todo largo mar e pela terra
Que inda hás de sojugar com dura guerra.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 42:
• Já que os portugueses descobriram os
segredos do mar, nunca antes revelados, o
gigante lhes ordena que ouçam os sofrimentos
futuros, os castigos que os esperam no mar e
na terra, que eles ainda iriam conquistar com
duras batalhas, conseqüência do atrevimento
de cruzar os mares.
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 43:
- “Sabe que quantas naus esta viagem
Que tu fazes, fizerem de atrevidas,
Inimiga terão esta paragem,
Com ventos e tormentas desmedidas.
E da primeira armada, que passagem
Fizer por estas ondas insofridas,
Eu farei d’improviso tal castigo,
Que seja mor o dano que o perigo!
Canto V – Episódio do Gigante Adamastor
• 43:
• O gigante afirma que os navios que fizerem a viagem
que Vasco da Gama está fazendo terão aquele cabo
como inimigo. A primeira armada a que se refere
Adamastor é a de Pedro Álvares Cabral, que perdeu
ali quatro de suas naus: o dano - o naufrágio – foi
maior que o perigo, pois os navegantes foram
surpreendidos. Cabe salientar que a viagem de
Cabral ocorreu em 1500, fato acontecido depois da
viagem de Vasco da Gama, mas do qual já tinha
conhecimento Camões.
Canto VI
Os portugueses partem de Melinde e
rumam para a Índia, enfrentando uma forte
tempestade provocada por Eolo, a pedido
de Baco e Netuno, deus que passa a se
opor aos portugueses, após o Concílio dos
Deuses Marítimos. Mais uma vez Vênus
intercede em favor dos lusitanos. Nova
interrupção de Camões, que discorre sobre
os caminhos da honra e da fama: critica os
nobres ociosos.
Canto VII
Chegada à Índia e primeiros contatos com os
nativos. Camões aproveita para lamentar-se
sobre seu sofrimento (vida miserável),
apelando para as Musas.
Canto VIII
Explicação de Paulo da Gama: as figuras
das bandeiras que celebram grandes vultos
da história portuguesa. Ainda na Índia,
problemas com os mouros, intrigas
promovidas por Baco, que atrapalham o
comércio entre portugueses e mouros
(Vasco é preso e resgatado a troco de
mercadorias). Considerações de Camões
sobre o poder do dinheiro e dos malefícios
que ele origina.
Canto IX
Partida da Índia, início da volta para
Portugal. Como prêmio, Vênus oferece aos
navegadores a Ilha dos Amores (principal
episódio do canto), onde ninfas amenizam o
cansaço dos portugueses e onde Tétis (a
paixão do Gigante Adamastor) aparece
para Vasco da Gama.
Canto X
•
•
•
Ainda na Ilha dos Amores, Tétis oferece a Vasco da
Gama uma visão do universo (a Máquina do Mundo
– descrição do universo e da Terra), segundo o
pensamento de Ptolomeu. Mais uma vez são
valorizados os feitos lusitanos e dá-se a volta a
Lisboa. No Epílogo (parte final), Camões volta a
falar ao Rei Dom Sebastião e relata sua
inconformidade com os rumos da pátria portuguesa,
imersa na cobiça.
“ No gosto da cobiça e na rudeza
Duma austera, apagada e vil tristeza.” (...)